António Salvado Morgado, Diocese da Guarda
Todos os leitores o recordarão. No passado dia 26 de Outubro o Papa Francisco encerrou os trabalhos da XVI Assembleia do Sínodo sobre a “sinodalidade” reforçando a ideia de uma Igreja «sem muros» e aberta a «todos, todos, todos». Os participantes corresponderam, então, com uma salva de palmas.
Não tendo intenção de publicar uma exortação apostólica, como vinha sendo tradição sinodal, o Papa, querendo fazer «reconhecer o valor do caminho sinodal realizado», remete para o Documento Final aprovado que coloca, de imediato, à disposição de todos. «É suficiente aquilo que aprovámos. No Documento há já indicações muito concretas – diz Francisco – que podem servir de guia para a missão das igrejas, nos diversos continentes, nos diversos contextos: por isso, coloco-o imediatamente à disposição de todos.»
Passadas duas semanas, ainda não encontrei a tradução portuguesa do Documento Final da XVI Assembleia do Sínodo, colocado, nas palavras do Papa «imediatamente à disposição de todos». Embora tenha podido aceder, em fontes diversas, a apresentações e comentários, verdade é que só encontrei o texto em italiano e não consegui qualquer informação sobre possível edição em Língua Portuguesa. Considerando que o documento tem valor de Magistério, seria de esperar uma divulgação rápida para que estivesse «imediatamente à disposição de todos».
A XVI Assembleia do Sínodo foi encerrada. Mas, se a sinodalidade é uma dimensão intrínseca da Igreja, o Sínodo tem de continuar na vida das igrejas locais. É isso o que o Papa deseja. Confiança e responsabilidade é o que Francisco deposita nas igrejas de todos os continentes e nos diversos contextos. Confiança e responsabilidade que só pode ser alicerçada no poder do Espírito Santo.
Não sei se foi por casualidade ou intencionalmente que o Papa Francisco, uns meses antes da realização da XVI Assembleia Sinodal, ao terminar o ciclo de catequeses sobre vícios e virtudes, tenha dedicado uma à virtude da humildade. Embora não fazendo parte das sete virtudes cardeais e teologais, o Papa salienta nessa catequese que, sendo esta virtude «a grande antagonista do mais mortal dos vícios, a soberba», «A humildade é a porta de entrada para todas as virtudes.»
Na altura anotei a singela catequese papal sobre a humildade. Já então a associei ao processo sinodal em curso. Lembro-a agora com maior sensibilidade quando se entrou na fase mais decisiva do Sínodo: a de dar seguimento às «indicações muito concretas» que podem servir de «guia para a missão das igrejas, nos diversos continentes e contextos.»
Tendo encerrado a XVI Assembleia Sinodal, fui encontrando, aqui e ali, vários textos, informativos ou de opinião, mas não encontrei nenhum referindo a importância da humildade na vida da Igreja, desde Roma até à mais esquecida comunidade paroquial perdida nalguma montanha da Terra. E o Papa não se tem poupado a tal, desde o início do Pontificado.
É por isso que trago aqui hoje esta catequese do Papa Francisco onde também afirma que «a humildade é a nascente da paz no mundo e Igreja. Onde não há humildade, há guerra, há discórdia, há divisão.»
Afirma o Papa que a humildade é a nascente da paz na Igreja. Creio que dificilmente se poderá praticar a sinodalidade sem a humildade, sobretudo em momentos em que nas comunidades locais importa implementar mudanças para as quais se torna necessário aprofundar a metodologia de participação e comunhão, consulta e discernimento e onde facilmente poderão surgir discórdias e divisões. Quem duvidará que a prática da sinodalidade exige uma verdadeira conversão de humildade? Pessoal e das comunidades; de comunidades e de movimentos eclesiais.
Mesmo que não se tenha avançado muito em temas mais sensíveis como alguns desejariam e esperavam, o Sínodo terá sido uma etapa fulcral de um longo processo de desenvolvimento de uma nova visão da Igreja. “Juntos, na barca”, a sinodalidade está lá.
Com a humildade que é húmus das outras virtudes, saibam vivê-la as Igrejas Locais.
Guarda, 8 de Novembro de 2024
António Salvado Morgado
morgado.salvado@gmail.com