Sínodo 2021-2024: Documento de trabalho «é tão sintético que omite os pontos que precisam de mais reflexão», afirma Alfreda Fonseca

«Esperava-se que fossem mais proativos nesta síntese no que diz respeito, por exemplo, à questão da mulher, às questões dos carismas e ministérios», explicou professora

Lisboa, 11 jul 2024 (Ecclesia) – Alfreda Fonseca, que integra vários círculos de reflexão na Igreja Católica, lamenta que existam “algumas questões” que o documento de trabalho para a segunda sessão da assembleia do Sínodo dos Bispos (2021-2024), “não toca ou toca superficialmente”.

“É um documento interessante, que procura ser um documento realmente de síntese, mas, às vezes, é tão sintético que omite os pontos que precisam de mais reflexão e os pontos que, de alguma forma, têm várias leituras teológicas”, disse a professora, em entrevista à Agência ECCLESIA.

Alfreda Fonseca lembrou que na primeira fase desta dinâmica sinodal, convocada pelo Papa Francisco dedicada ao tema da sinodalidade, quando “toda a gente que quis foi consultada” surgiram questões, “sobre as quais havia consenso, outras havia dissenso” e outras eram para aprofundar, por isso, esperava que este documento “adiantasse um bocadinho mais nessas matérias”.

É o Sínodo dos Bispos, mas é a primeira vez em que há uma participação de todas as instâncias da Igreja, nomeadamente dos leigos e das leigas, e esperava-se que fossem mais proativos nesta síntese no que diz respeito, por exemplo, à questão da mulher, às questões dos carismas e ministérios”.

Apresentado esta terça-feira, o ‘Instrumentum Laboris’ (IL), documento de trabalho para a segunda sessão da XVI assembleia geral ordinária do Sínodo dos Bispos, nasceu de uma consulta a dioceses e organismos episcopais de todo o mundo, tem como tema ‘Como ser Igreja sinodal missionária’, e apresenta 112 pontos, divididos em três partes, com uma introdução e uma secção de “fundamentos”.

“Há questões que eu tenho um bocadinho de medo que esta dinâmica possa levar. Em vez do apelo que é constantemente feito nas diferentes partes do documento – nos ‘fundamentos’, na parte primeira sobre as relações, os percursos, os lugares e a Igreja no mundo, é um bocadinho centrada sobre o papel das estruturas da Igreja; o risco é haver uma reestruturação e haver uma clericalização dos leigos e das leigas, em vez de haver uma desclericalização e uma desmasculinização de todas as áreas da Igreja”, desenvolveu Alfreda Fonseca.

O documento de trabalho, por exemplo, insiste na urgência de reconhecer papel das mulheres “em todos os aspetos da vida da Igreja”, mas o debate sobre diaconado feminino, por exemplo, fica de fora da Assembleia Sinodal que se vai realizar em outubro.

“Questões como o diaconado feminino, que por exemplo nas Igrejas Orientais já existe, não aparecem aqui, como questões que foram mais ou menos esquecidas”, assinalou a entrevistada, destacando que é “positiva” a maneira como se refere à participação das mulheres, “a linguagem é menos paternalista, mas realmente não chega”.

O instrumento de trabalho para a próxima Assembleia Sinodal propõe a criação de um “ministério de escuta e acompanhamento” nas comunidades católicas, que, para Alfreda Fonseca, “é um ministério importante”, e incentivou a “escutar com suficiente abertura para perceber a realidade que as pessoas vivem”, sublinhando a importância da “fidelidade ao real, a fidelidade ao mundo”.

A entrevistada, que integra alguns círculos de reflexão na Igreja, destaca “outra coisa importante” que é “uma clara opção pela escuta dos mais pobres, dos excluídos”, e refere que estes excluídos “não são necessariamente os mais pobres materialmente”.

“São todos aqueles que a instituição, enquanto tal, no seu sentido mais fechado, excluiu por diferentíssimas razões. Por isso, é que a escuta é importante, porque vai-se perceber o que é que afasta e o que é que cria comunidade”, salientou, em entrevista ao Programa ECCLESIA, transmitido hoje, na RTP2.

A convidada comenta também a questão da territorialidade, lembrando a “paróquia ao pé de casa não faz sentido para a maioria dos cristãos urbanos”, e identificou, como “primeira coisa que é positiva”, o número de conferências episcopais que “levaram os contributos das suas comunidades” para este documento de trabalho.

HM/CB/OC

A segunda sessão da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos vai decorrer de 2 a 27 de outubro, com o tema ‘Para uma Igreja sinodal: comunhão, participação, missão’; a primeira sessão decorreu em outubro de 2023.

O Vaticano recebeu 108 relatórios de Conferências Episcopais (de um total de 114), nove das Igrejas Católicas Orientais, o contributo da USG-UISG (União Internacional dos Superiores Maiores e a União Internacional das Superioras Gerais), organismos da Cúria Romana e mais de 200 comentários, provenientes de realidades internacionais, faculdades, associações de fiéis, comunidades e pessoas individuais, e as conclusões do encontro internacional “Os Párocos pelo Sínodo”.

A Conferência Episcopal Portuguesa está representada nesta assembleia pelo seu presidente e vice-presidente, respetivamente D. José Ornelas, bispo de Leiria-Fátima, e D. Virgílio Antunes, bispo de Coimbra.

Em fevereiro, o Papa decidiu criar grupos de estudo sobre os temas propostos pela primeira sessão sinodal, em outubro de 2023, que envolvem os dicastérios da Cúria Romana, sob a coordenação da Secretaria-Geral do Sínodo.

Estes grupos vão funcionar até junho de 2025, debatendo um conjunto de questões doutrinárias, pastorais e éticas “controversas”, referidas no Relatório de Síntese da primeira sessão sinodal.

O Sínodo dos Bispos pode ser definido, em termos gerais, como uma assembleia de representantes dos episcopados católicos de todo o mundo, a que se juntam peritos e outros convidados, com a tarefa ajudar o Papa no governo da Igreja.

 

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Agência ECCLESIA

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