Padre Manuel Ribeiro, Diocese de Bragança-Miranda
Num mundo marcadamente digital, em que as relações são cada vez mais porosas, circunstânciais e desprovidas de significado, a probabilidade de viver numa falsa ilusão de segurança e de pertença é uma realidade cada vez mais comum. Esta pretensiosa ilusão representa o deterioramento das relações inter-pessoais e inter-sociais. Na verdade, estar a sós com um outro, fazer silêncio para o escutar, para o ouvir e para o ver, é algo que hoje se tornou tão escasso e, concomitantemente, tão valioso.
E o mais grave é que tantas vezes precisamos da aprovação de um outro para que eu me sinta pessoa, me sinta incluído, me sinta parte de alguém ou de algo. A verdade é que nós nascemos carente de um outro. Esta é a verdade. Deus quando nos criou disse que “não era bom que o homem estivesse só” (cf. Gen 2, 18). O outro é aquele que me completa, que me valoriza e que me gera em mim sentido e significado.
Precisamos de ouvir do outro: “eu pertenço-te”, “eu sou teu, tu és meu” … Somos assim de fábrica. Precisamos desta pátria afetiva, deste núcleo afetivo. No entanto, o princípio primeiro da filosofia é o de se conhecer a si próprio. Este tem – e deve ser (!) – o propósito e a missão da nossa vida.
Compreendemos, pois, que temos de aprender a desaprender para voltar a aprender. Ou seja, reconfigurarmo-nos ao estilo e ao jeito de Jesus é a nossa meta e desafio. Ele é o nosso diapasão, o nosso pêndulo e o nosso fim último. Não nos iludamos: fora dele tudo é show-off. Só n’Ele, por Ele e com Ele teremos acesso à fonte que sacia a nossa sede de infinito. E mais, aprenderemos a priorizar-nos.
Quero contar uma estória que li a este propósito: “Os psicólogos chamam a isso “Síndrome de Cinderela”. A questão é que tu está a procurar aprovação do teu namorado para te dar uma sensação de valor, em vez de a gerar internamente, interiormente. A maioria faz isso? Muita gente faz… mas usar uma relação para criar uma boa auto-imagem é um alicerce instável. Acreditas de que Deus é capaz de preconceito ou de mau juízo? Não! Então, se Ele é incapaz de cometer erros e se te fez à Sua imagem e à Sua semelhança, compreenderás, portanto, que Ele gosta muito de ti, certo? Sim! Até ao ponto do seu único filho ser voluntariamente crucificado de novo por ti. Só por ti, se isso fosse necessário! Se Ele te ama tanto desse maneira, que importa o que o teu namorado pensa? Para a pessoa errada, tu nunca terás valor algum! Mas para a pessoa certa, tu vais ser tudo! E sabes uma coisa, tu és tudo para Deus!”
Mais, certo dia perguntaram-me o que é que de mais louco fizeste por alguém? Eu respondi: esperar! Esperar é próprio de quem ama! Quantas mulheres e mães não esperaram os seus maridos e filhos da guerra ou do mar! Quantas vezes não esperamos que alguém mude ou que se converta! Esperar é próprio de quem ama e de quem acredita na outra pessoa. Já pensaram quantas vezes Deus não espera por nós? Quantas vezes Ele quer que eu mude ou me converta… Deus espera por mim, Deus espera por ti, Deus espera por nós! Que tesouro este!
Termino com um provérbio africano: “Eu espero que quando a morte te encontrar, ela te encontre vivo”. Este provérbio africano, que a princípio pode parecer simples, carrega uma profunda mensagem sobre a vida e a morte. Ele recorda-nos a importância de estarmos vivo, de estarmos consciente de cada momento que acontecesse na nossa vida no sentido de aproveitarmos cada instante como dom, como dom e graça de Deus, ao serviço do outro.
Por outras palavras, temos de sermos vida na vida de alguém, na vida do outro, como tão sagazmente afirmou Bob Marley: “não vivas para que a tua presença seja notada, mas para que a tua falta seja sentida”.