Luísa Gonçalves, Diocese do Funchal
Tinha dito que não ia falar sobre o tema que tem estado na ordem do dia porque já muito foi dito e escrito por pessoas mais abalizadas do que eu. Além disso, creio que nestas ocasiões é preciso sensibilidade e bom senso e sobretudo alguma calma, embora também aguarde que a justiça seja feita.
Mas depois esbarrei com esta frase: “Todos os dias devemos ouvir uma pequena canção, ler um bom poema, ver uma pintura de qualidade e, se possível, dizer uma palavra sensata.”
Atribuídas a Johann Wolfgang Von Goethe, as palavras pareceram-me encaixar nos tempos que correm. Sobretudo no que se refere à sensatez.
Há que, de facto, que dizer uma palavra sensata aos outros e a nós próprios todos os dias. Caso contrário, a situação torna-se num vendaval que leva tudo à frente, mesmo quem não está envolvido, mas acaba levando, como agora se diz, ‘por tabela’.
É esta sensatez que temos de ter para lidar com as mais recentes revelações/confirmações sobre os casos de abusos na Igreja. Sendo que, no meu entender, se quisermos ser verdadeiros e rigorosos na análise, esta tem de ser, obrigatoriamente, transversal à sociedade já que, infelizmente, os abusos não acontecem só na Igreja.
Assim sendo, a sensatez, o bom senso se quisermos, não nos deveria permitir a nós, que nos dizemos cristãos, apontar o dedo e muito menos julgar em praça publica quem quer que seja.
Em boa hora a Conferência Episcopal Portuguesa, recorreu a uma Comissão Independente (CI), para apurar factos e intervenientes.
Agora, que os números são conhecidos, é deixar outras instâncias atuarem e continuar a zelar para que não existam mais casos. Se necessário afastando, como já alguns bispos fizeram, os que constam da lista da CI, mas cuja presunção de inocência continua a ser um facto.
Pena foi que ninguém tivesse tido a coragem de dar estes passos mais cedo; pena foi as vítimas se terem calado durante tanto tempo; pena foi alguém saber dos casos e não os denunciar, achando que poderia trazer uma candeia para colocá-la sob uma vasilha ou debaixo de uma cama.
Agora que se fez luz é deixar que ela ilumine quem está envolvido, mas também a nossa consciência, para que possamos ter a tal sensatez de não tomarmos a árvore pela floresta, de não a darmos por aí a apontar o dedo a torto e a direito.
É hora de confiar na justiça dos homens, pedindo a Deus que os ilumine, para que quem praticou os atos seja punido e quem sofreu os abusos possa, finalmente, ter alguma paz, possa ouvir a tal canção, ler um bom poema, ver uma pintura de qualidade e continuar com a sua vida acreditando em Deus e na sua justiça que, diz o povo e bem, tarda, mas não falha.
Luísa Gonçalves
Jornalista