Após a entrada em vigor da lei que permite o aborto, que os seus patrocinadores eufemisticamente chamam IVG, não mais cessou a abordagem do tema nos mass media. Ficámos a saber que se prevê a prática de cerca de 20 000 abortos por ano nos hospitais, que os responsáveis garantem estarem em condições de efectuar, e que irão custar ao erário público mais de 5,8 milhões de euros por ano. Será uma medida justa e em prol da paz social, logo dirão os seus promotores. Será mesmo? Jamais haverá paz sem justiça, e esta não é uma medida justa. Não é justa, desde logo, para os nascituros que deixam de o ser, seres humanos inocentes e indefesos, imolados no altar de inconfessáveis conveniências. Por mais que se ignore a tragédia, por mais que se diga o contrário, trata-se do massacre de milhares e milhares de seres humanos! Não é justa para uma sociedade envelhecida que se vê privada das novas gerações que viriam rejuvenescê-la e sustentar a sua velhice. O índice de natalidade está em 1,36, com tendência a descer, e em 2006 o nascimento de bebés é o mais baixo desde que há estatísticas, segundo fonte do INE. E não é justa para o normal contribuinte, obrigado a pagar impostos para custear uma actividade reprovável que a sua consciência não aceita. Milhões e milhões gastos para matar seres humanos, com prioridade sobre as filas de espera para tratamento de doenças! Com que fundamento, cumpre perguntar, o Estado se arroga o direito de custear com o erário público, a despesa dos abortos voluntários? Com o resultado do referendo, logo dirão os fazedores da lei! Há, nesta parte, um equívoco que cumpre denunciar e desmontar. A pergunta do referendo, a que apenas ¼ dos eleitores votou “sim”, incidia sobre a descriminalização do aborto: estava em causa saber se os autores do aborto praticado até às dez semanas continuariam a ser criminalmente punidos, ou se deixariam de o ser. Face ao resultado do referendo, o Estado entendeu demitir-se de proteger os inocentes e indefesos seres humanos eliminados naquela fase da sua vida, e legalizou a sua morte. Mas, não se ficando por aí, logo avançou para o custeamento dos abortos voluntários, como se garantisse um direito fundamental do cidadão. Nada mais errado! O aborto não é um direito, é antes um “poder de facto”, que deixou de ser punido quando efectuado nas situações previstas na lei. “Promover” o aborto a direito, equipará-lo a um caso de saúde pública, obrigar todos os contribuintes – os que concordam e os que não concordam, os que o praticam e os que não o praticam – a pagar impostos para o custear, é um abuso e uma violência inadmissível em qualquer sociedade, muito mais numa sociedade democrática. O aborto voluntário, como aliás a gravidez, não é uma doença. Excepção feita aos casos de violação, só engravida quem quer, e só aborta quem quer. Enquanto é compreensível a protecção social á natalidade – protegendo-a, a sociedade protege-se a si própria – já não se compreende igual protecção ao aborto, um acto atentatório da própria sociedade. Ninguém defende que o suicídio é um direito que o Estado deva proteger! Porque haverá então o Estado de patrocinar o “suicídio social” que é o aborto? Descriminalizar o aborto, é uma coisa; custeá-lo com o erário público, é outra. Não há que confundir as coisas, nem meter tudo no mesmo saco, como insistentemente vem sendo tentado. Que, ao menos, não se nos negue o direito de protestar e denunciar! Queremos e lutamos por uma sociedade em paz, com a certeza, porém, de que só há paz onde reina a justiça. Comissão Diocesana “Justiça e Paz” de Viseu