Presidente da Associação de Médicos Católicos Portugueses questiona opções políticas sobre legalização da eutanásia e aborto como «direito»
Lisboa, 21 jul 2024 (Ecclesia) – A presidente da Associação de Médicos Católicos Portugueses (AMCP) disse que em Portugal se morre “mal”, questionando a ausência de “cuidados paliativos” e de acompanhamento aos mais velhos.
“Morre-se. Morre-se mal. Morre-se sozinho. E não é difícil perceber que os idosos têm imensa dificuldade, que vivem sozinhos, sem família ou sem apoio suficiente, e estas pessoas não têm médicos de família”, refere Margarida Neto, psiquiatra, convidada da entrevista semanal conjunta Ecclesia/Renascença, emitida e publicada aos domingos.
A responsável alerta ainda para quem “morre na rua”, particularmente os doentes que estão em situação de sem-abrigo.
“São uma situação que nos deveria inquietar como sociedade e eu não vejo isso”, lamenta a presidente da AMCP.
Margarida Neto acrescenta que os doentes mentais a viver nas ruas “não têm lugar nos hospitais psiquiátricos”, agravando a sua situação.
A entrevistada aborda a situação dos cuidados paliativos em Portugal, realçando a “enorme diferença entre ricos e pobres”.
“Isto é uma coisa absolutamente indigna, indigna da própria medicina e de quem a gere”, aponta.
A psiquiatra sustenta que “o respeito pela vida humana, desde a conceção até à morte, é absolutamente essencial para um médico”.
“Em relação à lei da eutanásia, obviamente que nos opomos. Mas não nos opomos porque somos católicos, opomo-nos porque somos médicos”, declara.
A presidente da AMCP recorda que há dois pedidos de fiscalização sucessiva da lei, considerando que os deputados “têm, certamente, muito mais coisas para se preocuparem do que pensar em como fazer a morte de um doente, provocar a morte de um doente, ou assistir ao suicídio premeditado e assistido de um doente”.
Questionada sobre as recentes decisões que visam o reconhecimento do aborto como direito, a médica indica que está em causa “a morte de um outro ser que tem direito a viver, direito à vida”.
“É uma coisa absolutamente inadmissível, impensável”, alerta, assumindo também preocupações com limitações à objeção de consciência dos profissionais de saúde.
Sobre a situação em Portugal, Margarida Neto pede que o discurso se centre no “Sistema Nacional de Saúde”, com o Estado a “colaborar com todos”.
“Tem de fazer uma parceria verdadeira, uma rede verdadeira entre público, privado e o setor social, que é enorme e que faz um trabalho absolutamente extraordinário. O que seria deste país sem o setor social?”, questiona.
A entrevistada antecipa um “verão difícil”, perante a recusa dos médicos realizarem trabalho suplementar para além dos limites legais.
A AMCP, fundada em 1915, quer estar em “diálogo com a sociedade”, apresentando os “valores católicos” na medicina.
“Se nos transformamos em apenas cientistas que usam muita tecnologia, a inteligência artificial e por aí, perdemos aquilo que é, diria, a base da medicina, que é a relação médico-doente”, adverte Margarida Neto.
Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)