Saúde Mental/Suicídio: É necessário «mais pele real» e menos «pele virtual» nas relações, afirma Vítor Cotovio

Psiquiatra assinala que os pais e os professores «não podem passar procuração às tecnologias digitais naquilo que é o processo educacional»

 

Lisboa, 17 nov 2025 (Ecclesia) – O psiquiatra Vítor Cotovio afirmou que é necessário “mais pele real” nas relações para prevenir depressões e tentativas de suicídio, lembrando que “o que funciona melhor é o que está interligado”.

“Esta ligação, esta interceção, este carácter sistémico de olhar para o problema e ajudar a resolver faz com que as coisas sejam mais bem-feitas”, disse o diretor do Departamento Clínico e Técnico Assistencial do Instituto de São João de Deus, esta segunda-feira, em entrevista à Agência ECCLESIA.

Vítor Cotovio considera que se vai tendo a “sensibilidade de valorizar a importância da saúde mental” nas suas várias vertentes e naquilo que são as suas “consequências mais complicadas”, nomeadamente a “ideação suicida, tentativas de suicídio, ou suicídio”.

“Sabemos que o suicídio ocorre mais nas pessoas que tenham uma doença psiquiátrica de base, não quer dizer que ocorra só, nomeadamente as depressões. A depressão é uma doença de muitos ‘d’s: depressão, desespero, desalento, desesperança, desvalor, desistências”, explicou o psiquiatra e psicoterapeuta.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, todos os anos, cerca de 720 mil pessoas tiram a própria vida; mais de metade dos suicídios globais (56%) ocorre antes dos 50 anos, sendo particularmente afetada a faixa etária dos 15 aos 29 anos.

O tema da prevenção do suicídio foi lembrado pelo Papa Leão XIV, no apelo que faz no vídeo deste mês de novembro, na apresentação da intenção mensal de oração.

Para Vítor Cotovio, é necessário garantir “atempadamente que as pessoas possam ter o apoio necessário”, desde o apoio que cada um poderia “garantir aos outros, se a vida não fosse tão acelerada”, se cada um fosse mais disponível, “e não houvesse tanta pele virtual e mais pele real”.

Vítor Cotovio acrescentou, neste contexto, que ‘pele’ é “presença, escuta, ligação/laços, empatia/esperança”, e alertou para os riscos de “uma comunidade virtual não filtrada”, porque qualquer jovem tem “uma necessidade enorme de pertença”, e os grupos com que ele se cruza nas redes sociais podem desvirtuar “a essência das coisas”, porque “ele escolhe pertencer mesmo que corra riscos”.

Se é verdade que não devemos endeusar as tecnologias digitais, também é verdade que não as devemos diabolizar, mas, atenção, este equilíbrio é fundamental. Os pais, os professores não podem passar procuração às tecnologias digitais naquilo que é o processo educacional.”

O Papa Leão XIV convocou as comunidades católicas a um esforço conjunto na prevenção do suicídio, na sua intenção de oração para este mês de novembro, e pede que as pessoas saibam estar próximas, “com respeito e ternura, ajudando a curar feridas, criar laços e abrir horizontes”.

O diretor do Departamento Clínico e Técnico Assistencial do Instituto de São João de Deus destacou a expressão “muito interessante” do Papa para ‘criar laços e abrir horizontes’, porque é “fundamental”, quando se refere aos jovens, que precisam “de presença e de pertença”.

Na entrevista transmitida no programa ECCLESIA desta segunda-feira, 17 de novembro, Vítor Cotovio explicou que “não é incompatível” ter a ajuda espiritual de um sacerdote e também a de um terapeuta.

LS/CB/PR

O Vídeo do Papa divulga as intenções de oração mensais do Papa, desenvolvido pela Rede Mundial de Oração do Papa (RMOP), uma obra pontifícia da responsabilidade da Companhia de Jesus.

Elisabete Carvalho, da RMOP-Portugal, salientou que este tema da prevenção do suicídio “é um tema mais difícil”, mas o Papa Leão XIV, na senda do Papa Francisco, enumera mensalmente uma intenção de oração relacionada “com os desafios da humanidade, que é o caso, ou com os desafios da Igreja”.

“Um dos grandes desafios da humanidade, o suicídio, que pelo tema em si, também pelo aumento do número de casos em todo o mundo, no nosso país também, nomeadamente junto de adolescentes e jovens, tem aceitação muito particular”, acrescentou à Agência ECCLESIA.

A entrevistada recorda que ao longo dos últimos anos, particularmente no mês de novembro, é escolhido um tema relacionado com a morte, o luto, “crianças com doenças incuráveis”, este ano é o suicídio, porque “tocam a vida de todos”.

“Todos nós infelizmente conhecemos alguém que se suicidou, alguém com tendências suicidas ou familiares dessas pessoas que precisam de ajuda, de conforto, que precisam da nossa proximidade”, assinalou, explicando que é isso que Leão XIV pede aos cristãos em particular, “mas a todas as pessoas de boa vontade”.

Segundo Elisabete Carvalho, a aceitação destes temas “é muito maior” comparativamente a temas “mais abrangentes, mais genéricos”, como rezar por sacerdotes, que são elencados ao longo do ano, “mas que não têm impacto tão forte, porque não toca tanto a vida das pessoas”.

As imagens do Vídeo do Papa deste mês foram filmadas na Diocese de Phoenix, no Arizona (EUA), que colocou o tema da saúde mental entre as suas prioridades pastorais, com um gabinete próprio para o ministério da saúde mental, espaços de escuta, cursos de formação na comunidade, parcerias com organizações locais e estruturas de saúde.

 

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