Assinala-se a 11 de outubro o Dia Mundial dos Cuidados Paliativos, este ano com o tema «Cumprindo a Promessa: Acesso Universal aos Cuidados Paliativos»; em Portugal o acesso dos cidadãos a esta área da medicina ronda os 30%

Lisboa, 09 out 2025 (Ecclesia) – Ana Quintas, enfermeira na Unidade de Cuidados Continuados e Paliativos, lamentou hoje que a presença de profissionais desta área não seja acautelada na hora do diagnóstico relegando o seu trabalho para o final de vida.
“É uma área necessariamente importante no percurso das pessoas. Todos nós poderemos ter doenças crónicas, doenças progressivas e devemos ser acompanhados. Os cuidados paliativos não podem aparecer só no final de vida. A medicação ajuda, palia, mas não é tudo, e a falta de informação, o desconhecimento, gera medo”, explica a profissional.
“Tenho aprendido que o final da vida vive-se como se viveu durante toda a nossa vida. Claro que a medicação auxilia, palia, mas por si só não faz tudo. Precisamos de dar atenção aos sintomas emocionais e psicológicos que precisam sim de uma conversa, precisam de desmistificar conceitos, de acolher a raiva, de acolher a zanga, que às vezes são fisiológicas e que precisam estar neste processo de luto. Mas acolher, não reprimir, o que as pessoas precisam sentir para depois poderem também integrar a serenidade e a tranquilidade”, acrescenta.
Assinala-se no dia 11 de outubro o Dia Mundial dos Cuidados Paliativos, este ano com o tema «Cumprindo a Promessa: Acesso Universal aos Cuidados Paliativos»; em Portugal o acesso dos cidadãos a esta área da medicina ronda os 30%.
Ana Quintas, pós graduada em Cuidados Paliativos, diz que se confirmou como enfermeira quando iniciou o sue trabalho nesta área da saúde.
“É um cuidado holístico, uma atenção aos sintomas físicos, aos sintomas psicológicos, emocionais, espirituais e, portanto, pede-nos muito mais do que saber fazer. Aprendi verdadeiramente a ser enfermeira, olhando para as pessoas e para o seu projeto de vida. Independentemente de ter a doença A, B ou C, a pessoa é o que realmente importa e os seus familiares ou pessoas significativas e não é a doença em si. Quando isso acontece o olhar muda”, explica.
A enfermeira, que exerce funções no Hospital da Luz, em Lisboa, dá conta da importância de uma equipa, uma vez que ninguém trabalho sozinho na área de Cuidados Continuados e Paliativos: “É um trabalho holístico, numa equipa composta por um assistente social, um assistente ocupacional, a psicóloga, a fisioterapeuta, um assistente religioso e tantos outros que façam sentido, para que possamos todos tomar decisões muito mais consentidas, mas de encontro a todas as necessidades da pessoa”.
Sobre a unidade onde trabalha atualmente, Ana Quintas refere ser um local que procura dar vida aos pacientes e aos familiares, um espaço que cuida da vida, e onde se cuida do “percurso de saúde, de doença”, e no caminho os pacientes “partilham pendências emocionais e relacionais”.
“E a pergunta é, não traremos todos? Quantos de nós têm relações que não ficaram tão bem resolvidas? Em que momento da vida é que teremos a oportunidade para os resolver?”, questiona.
Ana Quintas assume o privilégio de acompanhar pessoas em fase terminal – estando a terminar uma formação em doula de fim de vida – e afirma o seu trabalho, assente no cuidado – que se estende para lá da terapêutica – que conforta, acolhe e tranquila a pessoa e os familiares.
“Para quem vive o processo de fim de vida e morte, vive uma transcendência. Está em conexão com o divino, num patamar em que nós não estamos. E, portanto, sente e vê provavelmente coisas que nós não vimos, coisas que nós não sentimos. O meu papel é abraçar, é saber sobre o seu conforto. O enfermeiro é testemunho de narrativas e o nosso papel é abraçá-las e não reprimir”, indica.
O cuidado como linguagem não exclusiva da medicina leva Ana Quintas a ser voluntária na associação Coração Amarelo, onde semanalmente visita um casal “de idade avançada, com demência”, procurando contrariar o isolamento, e integra o projeto Amadora Compassiva.
“As comunidades Compassivas têm como propósito colocar o cuidado no centro das comunidades. Sabemos que existe um apoio social e da saúde mas não é suficiente, os acessos são débeis e a responsabilidade é de todos – não só dos governantes, não é só dos assistentes sociais ou dos profissionais de saúde. É de todos. O cuidado, a atenção ao vizinho, ao outro que mora na nossa rua, é muito importante. Testemunhar, aliviar, acompanhar, com conhecimento as transições da vida, o envelhecimento, o fim de vida, o luto, tudo isto passa por nós, por comunidades mais compassivas”, apresenta.
A conversa com Ana Quintas vai ser emitida esta noite no programa ECCLESIA, na Antena 1, com emissão pouco depois da meia-noite, e é disponibilizado no podcast «Alarga a tua tenda».
LS