Saúde: Capelães hospitalares são «médicos» do luto e da reconciliação

«Doença faz ressurgir o amor e, o que é extraordinário, contribui para reencontrar a paz consigo próprio», diz padre José Cruz

Lisboa, 24 jan 2012 (Ecclesia) – O capelão dos hospitais pode ser como um médico que cura as dores psicológicas e espirituais, num espaço de reconciliação e conversão habitado por sentimentos opostos, entre morte e vida, desespero e paz, desamparo e ternura.

O padre José Cruz, sacerdote hospitalar em Lisboa, trabalha num “terreno difícil” marcado pela dor: “Todos os dias, todas as horas, estamos numa condição que é quase sempre de contacto com o sofrimento”, disse ao programa ECCLESIA na Antena 1.

A sua missão nos hospitais Cuf Descobertas e Capuchos consiste em “dar esperança, colo, aconchego e acolhimento”, para que as pessoas possam “chorar mas também alegrar-se”, porque, sublinha, “depois das lágrimas vem a paz”.

O internamento pode ser “muito traumático” mas o hospital “é uma terra de profundo amor ou em que ele pode ressuscitar”: “A doença faz ressurgir o amor e, o que é extraordinário, contribui para reencontrar a paz consigo próprio”.

O sacerdote recorda um doente, ou, como prefere dizer, uma pessoa “na condição de doença”, que foi vítima de acidente vascular cerebral, AVC, por causa de uma vida acelerada de agitação e trabalho.

Perante a família e os amigos que o visitavam, resolveu-se: “Vou mudar de vida. Isto não tem sentido”, decisão que para o capelão resultou de ter percebido que os próximos estavam com ele, mas ele, no passado, não esteve com os seus.

Na doença e na iminência da morte o padre José Cruz testemunha “reconciliações” entre pais, filhos, esposos, irmãos, mas também assiste a “revoltas com Deus ou com a vida”.

Compreende quem diz que deixou de ser capaz de rezar, porque a passagem pelo hospital é um “tempo delicadíssimo onde tudo se põe em causa”.

“Se está zangada com Deus, ralhe com ele”, aconselha por vezes: “A pessoa não pode viver com a revolta dentro de si; por isso tem de a dizer, deitá-la para fora o mais possível. Deus aguenta as nossas revoltas. Nós é que não as aguentamos”, acrescenta.

O capelão considera que é melhor os doentes serem “reativos do que indiferentes” e lembra que também passou por experiência semelhante após a morte de um familiar: “Toda essa história me ajudou a ser uma expressão de esperança e a ajudar a cultivar um terreno de amor e de paz”.

Quando as pessoas estão numa situação mais difícil é preciso “engenho e arte, que o Espírito Santo dá sempre”: “Por vezes, mesmo nas condições mais delicadas, encontramos caminhos muito belos”.

Na capelania fala-se de morte mas o horizonte é a vida, como acontece nos encontros que organiza nos Capuchos, dirigidos aos familiares dos doentes e a toda a comunidade hospitalar.

O primeiro passo, explica, é convidar as pessoas angustiadas pela perda ou pela sua proximidade a trazer à superfície “as boas memórias” e, a seguir, a dizerem aos outros o que sentiram com essa recordação.

“Muitos fizeram os seus lutos e a cura da ferida de estar na condição de doente” nas capelanias, sublinha o padre José Cruz, que recebeu a ordenação sacerdotal há 19 “felizes” anos.

O programa ECCLESIA na Antena 1 que vai para o ar esta quarta-feira, a partir das 22h45, reproduz excertos desta entrevista ao capelão, que também apresenta a sua perspetiva sobre o ecumenismo nos hospitais, no âmbito da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos.

PRE/RJM

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