Homilia de D. Manuel Pelino
Manifesto o meu reconhecimento por este acto de veneração a São José, padroeiro da cidade e concelho de Santarém. Saúdo e agradeço a todos os que contribuem e dão vida à realização desta festa: À Câmara Municipal de Santarém, na pessoa do seu presidente, vereadores e funcionários; ao pároco da Sé e aos párocos da cidade e do concelho; às Juntas de freguesia; aos romeiros de São José; às associações culturais e religiosas presentes; aos devotos deste patrono; a todos os pais que o consideram como uma referência; aos participantes nesta celebraçãoA veneração a São José convida-nos a construir uma cidade mais humana e mais justa, com melhor qualidade na relação social, com maior atenção à união e educação familiar, com atitude de serviço mais visível e generoso. A memória de São José é um estímulo a cultivar os valores que ele evidencia na sua vida e que tão urgentes se tornam nos nossos dias.
Vivemos momentos de desencanto e desorientação. Os horizontes que nos rodeiam são de desânimo, de mentira, de irresponsabilidade, de fraude. Constantemente nos comunicam más notícias, escândalos vergonhosos, violência, maldade. Em quem podemos confiar? No meio de tantas trevas há rasgos de luz. Os santos são como estrelas que nos guiam na viagem tormentosa da vida, afirma Bento XVI. As verdadeiras estrelas da nossa vida são as pessoas que souberam viver com rectidão e nos ensinam a a bondade, o serviço aos outros, a responsabilidade pelo bem comum. São luzes de esperança que nos ajudam a acreditar em Deus e a acreditar na bondade que há no coração humano. Numa cultura do vazio, os santos desempenham esta função de referências morais e espirituais.
Viveram com responsabilidade, com confiança, com entrega total à missão que lhes foi confiada. Irradiam, ainda hoje, a verdade, a justiça, a bondade, a dignidade humana. São José, São Francisco de Assis, Santo Inácio e São Francisco Xavier, santos que marcaram a nossa história e continuam hoje a exercer uma influência profunda em todos os que os veneram e seguem. Santos de tempos passados e santos de hoje, santos que estão nos altares e santos também que se cruzam connosco no dia a dia. São referências e desafios a uma vida bela, grande, fecunda. Levam-nos a acreditar que é possível um futuro melhor e que está ao alcance de todos nós colaborar na sua construção.
A Igreja é “comunhão dos santos”. Os santos fazem parte da nossa família e exercem uma paternidade espiritual em relação aos fiéis, cuidam de nós como membros do Corpo de Cristo, preocupam-se com a nossa salvação e oferecem-nos exemplos acessíveis para seguirmos o caminho do Senhor. São o melhor comentário ao evangelho pois o apresentam como estilo de vida que torna a existência humana feliz e fecunda. Os santos são beatos, ou seja, são pessoas felizes. Como proclama o evangelho, são “bem-aventurados”, têm uma vida cheia de ventura. Os santos são um ideal a seguir para tornarmos o mundo mais digno, mais humano, mais feliz.
São José ocupa um lugar especial no cortejo dos santos. Na verdade, Deus confiou a este santo patriarca a guarda dos Seus tesouros mais preciosos: Maria e Jesus. Por isso, foi designado por alguns místicos como a sombra de Deus Pai que o escolheu para cuidar do seu próprio filho Jesus. Representa, assim, para nós a paternidade de Deus.
Habitualmente chamamos a São José o pai adoptivo de Jesus, ou seja, pai afectivo ou pai espiritual. Não é apenas pai juridicamente, enquanto esposo da virgem Maria. É uma referência para a paternidade espiritual.
Nota-se hoje alguma ausência responsabilidade paternal, da paternidade espiritual. Por vezes os pais tornam-se companheiros, camaradas dos filhos e demitem-se da sua missão de referências morais e educadores. Os filhos precisam de uma mão que os ampare e os guie não só nos primeiros passos mas também na orientação da existência; de quem acredite neles apesar das suas insuficiências e falhas; de quem os estimule e puxe para a bondade, para o pleno desenvolvimento das potencialidades; de quem vá à sua procura quando se perdem nos caminhos da vida. De quem os acolha e perdoe quando regressam.
Quem vive a paternidade afectiva e espiritual sofre com as falhas dos filhos mas não deixa de esperar e confiar no desenvolvimento global deles. Pode derramar lágrimas pelos seus desvios mas acredita e espera pelo seu regresso. Como o Pai do pródigo do evangelho vai ao seu encontro, restitui-lhe a dignidade perdida, fá-lo sentir em casa.
Temos muita gente, graças a Deus, que se dedica generosamente à paternidade espiritual e moral: pais que se esforçam por ser amigos e educadores dos filhos; sacerdotes que são pais espirituais, fazem da comunidade cristã a sua família e se entregam zelosamente ao seu serviço; pessoas que na igreja, nas associações, na sociedade colocam o serviço ao bem comum como uma regra de vida. Precisamos de mais. Precisamos de vencer o individualismo e a passividade. Há muitas coisas condenáveis à nossa volta. A sociedade e as pessoas nem sempre vão pelo bom caminho. Lamentar e acusar é fácil mas não adianta. Prestar um contributo positivo, adoptar uma atitude construtiva e responsável é o desafio que são José nos coloca. Manifestemos-lhe a nossa veneração e sigamos o seu exemplo fazendo da nossa vida uma missão ao serviço de Deus e da fraternidade e dignidade humana
D. Manuel Pelino Domingues, Bispo de Santarém