Santo Cristo nos Açores

Durante este fim de semana, a Imagem de Santo Cristo percorre as ruas da cidade de Ponta Delgada A Ilha de S. Miguel (Açores) já «ferve» com a proximidade das festas do Senhor Santo Cristo. Vindos do exterior e também das outras ilhas que constituem o arquipélago, os peregrinos deslocam-se àquele santuário e, no próximo Domingo (27 de Abril), a imagem do Santo Cristo volta a percorrer as ruas da cidade de Ponta Delgada (Ilha de S. Miguel). Para além das festividades religiosas existem também “as manifestações culturais de raiz açoriana”. Com uma dimensão religiosa e outra profana, D. António Sousa Braga, bispo de Angra, disse à Agência ECCLESIA que as festas populares “têm sempre a dimensão religiosa e profana” mas “não tem sido difícil harmonizar as duas vertentes”. Este ano, a festa será presidida pelo bispo do Funchal, D. António Carrilho. A devoção ao Senhor Santo Cristo está sob a orientação da reitoria do santuário e a parte profana está sob a orientação da irmandade do Senhor Santo Cristo que “é também aquela que organiza a procissão”. Esta assume um caracter de “grande cortejo” onde estão presentes as forças vivas da sociedade. Uma ocasião para celebrarem a sua fé. Com o aproximar do dia «grande», os hotéis estão lotados mas muitos ficam “em casas das suas famílias” – realça D. António Sousa Braga. Esta festa religiosa é uma ocasião “das pessoas se encontrarem”. E adianta: “nesse fim de semana, a vida em S. Miguel pára”. No sábado, haverá uma missa no santuário e uma pequena procissão no Campo de S. Francisco. Durante a noite haverá “uma vigília de oração” porque “há muitas pessoas que prometem estar com o Santo Cristo”. Nessa noite a imagem sai do santuário e vai para a Igreja de S. José (Campo de S. Francisco) devido às dimensões do templo. As promessas são “muito variadas”. Umas, como expressão de acção de graças e, outras, para “pedir ajuda de situações difíceis” – salienta o bispo de Angra. Há um sentido de aliança e “cumplicidade com Jesus”. A evangelização nos Açores foi feita, essencialmente, pelos Franciscanos que desenvolveram “essa devoção à Paixão” – realça o prelado. Actualmente, procura-se desenvolver o “outro lado da medalha – Mistério Pascal – que é a Ressurreição”. Devido à afluência de pessoas será que se pode comparar estas festas com as celebrações do 13 de Maio em Fátima? “Como mobilização da sociedade e envolvência das pessoas para nós, nos Açores, é um 13 de Maio” – apurou o bispo de Angra. A piedade mariana e as festas do Divino Espírito Santo são notórias mas esta é aquela que “junta mais gente”, tal como acontece “na Cova da Iria”. Origem da Festa do Senhor Santo Cristo No Convento da Caloura, em Água de Pau, começa a história do culto do Senhor Santo Cristo dos Milagres, em S. Miguel. Reza a tradição que foi neste lugar que se erigiu o primeiro Convento de Religiosas nesta Ilha, convento cuja fundação se deveu, principalmente, à piedade das filhas de Jorge da Mota, de Vila Franca do Campo. Mas para que tal comunidade fosse estabelecida como devia, foi necessário que alguém fosse a Roma impetrar a respectiva Bula Apostólica. Largaram, por isso, de S. Miguel a caminho da Cidade Eterna, duas religiosas. Aí solicitaram ao Papa o desejado documento. Tão bem se desempenharam dessa missão que o Sumo Pontífice não só lhes passou a ambicionada Bula como ainda lhes ofereceu uma Imagem do Ecce Homo. De regresso a Vale de Cabaços, a singular imagem foi posta num nicho onde se conservou por poucos anos. Porque o lugar era ermo e muito exposto às incursões dos piratas, o pequeno Mosteiro ficou, certo dia, deserto, pois parte das religiosas seguiu para Santo André, de Vila Franca do Campo, e a outra parte se encaminhou para Ponta Delgada, para o Mosteiro da Esperança, acabado de fundar pela viúva do Capitão Donatário, Rui Gonçalves da Câmara. Mas a Imagem do Senhor Santo Cristo não ficou esquecida em Vale de Cabaços, porque a religiosa galega Madre Inês de Santa Iria a quis trazer para Ponta Delgada. A Primeira Procissão No ano de 1700, a Ilha de S. Miguel foi abalada por fortes e repetidos tremores de terra. Duravam estes já vários dias quando a Mesa da Misericórdia e grande parte da nobreza da cidade, vendo que os terramotos não cessavam, resolveram ir à portaria do Mosteiro da Esperança para levarem em procissão a Imagem do Santo Cristo. Ao princípio da tarde desse dia 13 de Abril de 1700, juntaram-se as confrarias e comunidades religiosas. Concorreu igualmente toda a nobreza e inumerável multidão que, com viva fé, confiava se aplacaria a indignação divina com vista da santa Imagem. Caminhava já a procissão em que todos iam descalços; e logo que a veneranda Imagem se deixou ver na portaria, foi tão grande a comoção em todos que a traduziram em lágrimas e suspiros, testemunhos irrefragáveis da contrição dos corações. Levaram o andor do Santo Cristo as pessoas mais qualificadas em nobreza. Andando a procissão, ia a veneranda Imagem entrando em todas as igrejas onde, em bem concertados coros, Lhe cantavam os salmos “Miserere mei Deus”. Saindo da Igreja dos Jesuítas, e caminhando para a das Religiosas de Santo André, não obstante toda a boa segurança e a cautela com que levavam a santa Imagem, com assombro e admiração de todos, caiu esta fora do andor e deu em terra. Foi esta queda misteriosa, porque não caiu a Imagem por algum dos lados do andor, como era natural, senão pela parte superior do docel. O povo ficou aflito com sucesso tão estranho. Uns feriam os peitos com as pedras; outros, pondo a boca em terra, que julgavam santificada com o contacto da santa Imagem, pediam a Deus misericórdia; estes, tomando os instrumentos de penitência, davam sobre si rijos e desapiedados golpes, regando a terra com o sangue das veias; aqueles publicavam em alta voz as suas culpas, como causas da indignação do Senhor; e todos, com clamores e enternecidos suspiros, pediam a Deus que suspendesse as demonstrações da sua justa vingança. Verificaram, então, que a santa Imagem não experimentara com a queda dano considerável, pois somente se observou no braço direito uma contusão. A Imagem foi lavada e limpa no Convento de Santo André e, colocada outra vez no andor com a maior segurança, continuou a procissão, na qual as lágrimas e soluços do povo aflito embargavam as preces, até que, bem de noite, se recolheu no Mosteiro da Esperança. Culto do Senhor Santo Cristo dos Milagres Numa ilha de vulcões em actividade constante e de sismos frequentes, a devoção era o único refúgio do povo, através do culto do Divino Espírito Santo e ao Senhor Santo Cristo dos Milagres. A devoção que Teresa da Anunciada, venerável religiosa do convento de Nossa Senhora da Esperança, tão intensamente sentiu por Cristo, marcou profundamente a alma do povo, de tal modo que o culto ao Senhor, através da procissão com a imagem, se expandiu e fortaleceu ao longo dos séculos. É, hoje em dia, a maior procissão, a mais grandiosa e a de maior devoção que se realiza em terras portuguesas. No coração de cada açoriano, disperso pelo mundo, há um altar de culto eterno ao Senhor Santo Cristo, onde as suas preces mantêm permanentemente acesas místicas velas de imperecível devoção e saudade. Daí a presença de milhares de açorianos que vêm participar, todos os anos, de Portugal, dos Estados Unidos da América, do Canadá e, naturalmente, das outras ilhas, nas grandes festas do Senhor Santo Cristo dos Milagres, numa autêntica e profunda manifestação de fé e devoção. Semanas antes da procissão, o mosteiro da Esperança e a praça 5 de Outubro são preparados e enfeitados festivamente com milhares de lâmpadas multicores, mastros e bandeiras, flores de todas as espécies e cores que conferem ao recinto um deslumbrante ar de festa. As festas duram vários dias. Sucedem-se os serviços religiosos e os concertos. Na tarde de sábado, há pessoas que andam à volta da praça de joelhos sobre as pedras do pavimento ou, então, carregadas de círios de cera, num agradecimento pela graça recebida do Senhor numa hora de aflição e sofrimento. Depois, no domingo, milhares de pessoas incorporam-se na procissão. A abrir, o guião, com a coroa de espinhos dourada, depois duas longas filas de homens com opas, muitos com grossos círios votivos, outros descalços, no cumprimento de promessas, interrompidos por grupos de filarmónicas. Seguem-se associações juvenis transportando guiões de cores garridas, crianças vestidas de anjos, alunos do seminário, o clero Micaelense e alguns sacerdotes convidados, todos eles a precederem a venerando imagem do Senhor Santo Cristo dos Milagres, transportada sob um docel de veludo e ouro, num trono de lindíssimas flores de seda e pano, tecidas no século XVIII. Após a venerando imagem, seguem-se os dignatários da Igreja Católica, representantes das congregações religiosas sediadas em S. Miguel e muitos milhares de senhoras, no cumprimento de promessas. A fechar o extenso cortejo, seguem-se as mais altas autoridades militares e civis, representações e associações sociais e desportivas. A grande procissão recolhe, já quase noite, após cinco horas de circulação pelas principais ruas de Ponta Delgada. O corpo principal do tesouro do Senhor Santo Cristo dos Milagres é constituído pelas seguintes jóias: o Resplendor, a Coroa, o Relicário, o Ceptro e as Cordas. Informações complementares Frutos dos mistérios da Fé, sinais da gratidão dos mortais pelos milagres que os ajudam a caminhar pela vida, o Ex-Libris do Tesouro, o RESPLENDOR é a peça mais rica do espólio. Fotografado e documentado por especialistas internacionais em arte, foi recentemente considerado, num congresso em Valladolid, Espanha, a peça mais valiosa do seu género em toda a Península Ibérica. O RESPLENDOR, em platina cromada de ouro, pesa 4,850 gramas e está incrustado de 6.842 pedras preciosas de todas as qualidades: topázios, rubis, ametistas, safiras, etc. Além do valor artístico, esta jóia está carregada de elementos simbólicos ligados à teologia. O primeiro é a da Santíssima Trindade, representada por um triângulo no centro que contém três caracteres com o seguinte significado: “Sou o que Sou” e também “Pai, Filho e Espírito Santo”. Deste triângulo irradiam os resplendores para as extremidades da peça. O segundo elemento é a Redenção de Cristo, representada pelo cordeiro sobre a cruz e pelo livro dos Sete Selos do Apocalipse. Um terceiro é a Eucaristia, simbolizada por uma ave, o pelicano, pelo cálice e pelo cibório. O último elemento simbólico do RESPLENDOR é a Paixão de Cristo passando pela coroa representada em pormenor: desde a túnica ao galo da Paixão, passando pela coroa de espinhos integralmente feita de esmeraldas. Se o Resplendor é a jóia mais rica do Tesouro, a COROA é a sua peça mais delicada. Em ouro, pesando apenas 800 gramas, possui 1.082 pedras preciosas, todas elas trabalhadas com minúcia, onde os próprios espinhos são pequeníssimas pedras que diminuem de tamanho nas extremidades. O RELICÁRIO é, por outro lado, a peça mais enigmática do Tesouro. É a única que está permanentemente colocada no peito da imagem e serve para guardar o Santo Lenho, que se crê ser uma farpa da verdadeira cruz em que Jesus foi crucificado. O CEPTRO, a quarta peça do Tesouro, é constituída por 2.000 pérolas que formam uma maçaroca de cana, 993 pedras preciosas ao longo do tronco e no conjunto de brilhantes com renda de ouro na base, onde está colocada a Cruz de Cristo. Finalmente, as CORDAS, com 5,20 metros de comprimento, constituem a quinta peça do corpo principal do Tesouro. São duas voltas de pérolas e pedras preciosas enroladas em fio de ouro. Estas jóias possuem um valor incalculável, que ainda não está devidamente avaliado. As Jóias do Senhor Santo Cristo dos Milagres, como também a colecção de capas usadas pela imagem, podem ser admiradas no Convento de Nossa Senhora da Esperança. Fonte: http://www.acores.net/santocristo/ Notícias relacionadas •O 13 de Maio na ilha de S. Miguel

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