SABER APRENDER – Com os bebés abortados que sobreviveram

Miguel Oliveira Panão (Professor Universitário), Blog & Autor

«Aborto é um direito humano.» — diz a pessoa não abortada que segura o cartaz durante uma das muitas manifestações que estão a acontecer nos EUA. Espera-se que o Supremo Tribunal americano acabe com meio século de aborto legalizado, o que tem movido multidões a manifestar-se com cartazes contendo frases como a que citei no início e que não creio ser fruto de um pensar coerente. Quem se manifesta a favor do aborto, só o pode fazer porque não foi abortado. A vida, sim, é um direito humano. O apoio económico, psicológico e espiritual, sim, é um direito das mães. O aborto não é o caminho direito para se ser humano, mas torto.

Foto de Hu Chen em Unsplash

Em maio de 2018, Dolores Aveiro disse

«já tinha três filhos. Tentei abortar e não consegui. Ainda bem, porque o Cristiano foi a estrela que iluminou a minha vida.» O Cristiano Ronaldo tem inspirado gerações de jovens a valorizar como o esforço e dedicação podem levar-nos a realizar alguns dos nossos sonhos, mas se o aborto fosse um direito humano, hoje, não haveria Cristiano Ronaldo. E a pergunta é óbvia: quantos Cristianos Ronaldo não se abortaram já? A partir do momento da fecundação e do cruzamento genético proveniente de duas pessoas, começa um processo que termina com o choro de um bebé. Todos passámos por isso.

Quando nos colocamos do ponto de vista do mais fraco, o embrião, sabendo que nele está o gérmen da consciência, o que pensaríamos da ideia de alguém de quem fui concebido poder escolher sobre se vivo ou morro? Ser pró-escolha não implicar dar essa escolha ao bebé? A escolha da morte pelo próprio é suicídio, mas a escolha da morte de alguém por outrem é sentença, e cada um de nós é um péssimo juiz da vida ou morte. Quais são as razões daqueles que se consideram “pró-escolha”?

Num estudo; em 2005 do Instituto Guttmacher, diversos investigadores procuraram conhecer as razões que uma mãe recorre para justificar a escolha de abortar. As duas razões mais apresentadas são: a interferência que isso produz na educação da mulher, no trabalho ou capacidade de cuidar da criança; e a de não poder suportar o custo de um bebé naquele momento. Uma terceira razão seria a de não querer ser mãe solteira ou estar com problemas no relacionamento com o pai. E no que diz respeito às mães mais jovens, muitas partilham não estarem preparadas para a transição da maternidade, enquanto que as mães mais velhas citam, frequentemente, como Dolores, a incapacidade de ser responsável por mais um filho. Por que razão não se actuam sobre as razões e se opta para solução mais fácil: abortar? Mas não foi isso que mais me chocou neste estudo.

Embora a questão da adopção não fizesse parte das perguntas, o assunto veio ao de cima espontaneamente. Menos de 1% das mulheres referiu que não considerou a adopção, mas mais de um terço das entrevistadas disse que consideraram a adopção, mas concluíram que era «uma opção moralmente inconsciente porque dar uma criança a outros é errado.» Mas, aparentemente, matar a criança não é.

A linguagem usada pelas mulheres que optam por terminar com a vida do seu bebé aponta para uma decisão baseada na inoportunidade do momento para serem mães. Não dá jeito. Mas o que se demonstra é a necessidade de crescermos humanamente na arte de nos “fazermos-um” com o outro. Quando nos “fazemos-um” com os outros, fazemos nossos os sofrimentos e alegrias dos outros. Se uma mãe sofre porque não se sente capaz de acolher e ajudar a crescer um bebé, merece todo o nosso apoio. Se uma mãe sente ser inoportuno ter agora um bebé, a sociedade deveria assegurar que talvez seja oportuno para um casal que não pode ter filhos e assegurar o encontro de mães que permita oferecer à criança uma família onde possa crescer. “Fazer-se um” com cada bebé implica uma renúncia das nossas preocupações pessoais para nos sensibilizarmos à total vulnerabilidade de uma vida cuja causa da fecundação pode ser indesejada, mas que não tem qualquer responsabilidade sobre isso.

O direito ao aborto surge da necessidade das mulheres sentirem terem o controlo sobre as suas vidas porque durante milénios foram subjugadas à vontade masculina. Quando existem escolhas erradas na vida sexual que levam à concepção de um bebé, na prática, poderíamos argumentar que o bebé é forçado, pela natureza humana, a entrar no seio de uma mulher contra a sua vontade. Por isso, quando a mãe escolhe retomar o controlo sobre as suas escolhas, e abortar, não é lícito que lhe seja dado esse direito? O problema neste raciocínio vicioso é o de que o mesmo poderia ser dito relativo ao bebé. Isto é, muitas vezes, ser humano e filho provém da escolha de outros que forçam a nossa existência no mundo. Mas graças a essa escolha errada, eu vivo, respiro, penso, consolo, ajudo, inspiro. Graças a escolhas erradas ou acções criminosas foi-me dada a oportunidade de existir e ser humano.

As leis que facilitam o aborto ignoram a voz daqueles que sobreviveram ao aborto. Melissa Ohden havia sido abortada com alguns meses e enquanto os médicos e a mãe decidiam sobre o que haviam de fazer à criança, uma enfermeira nota que ela, ofegante, se esforçava por respirar, por viver e decide dar-lhe essa oportunidade. E foi uma graça de Deus porque existem histórias reportadas nos media sobre como aos bebés abortados que sobrevivem se lhes quebra o pescoço e são deitados ao lixo.

Claire Culwell também sobreviveu a um aborto quando a sua mãe tinha apenas 13 anos. Obrigada pela mãe a abortar porque resolveria o seu problema, a jovem mãe de Claire acabou por embarcar numa vida traumática que levaria a lágrimas tristes quando leu da sua filha, que sobreviveu, a procurou e estava ali diante dela, as palavras escritas num cartão — «obrigado por teres escolhido a vida por mim.» Claire não sabia até àquele momento que tinha sido uma sobrevivente de um aborto.

Por demasiado tempo a sociedade quer tornar as vozes dos sobreviventes dos abortos irrelevantes porque representam uma contradição profunda para todo o movimento a favor do aborto. Mas penso ter chegado o momento de saber aprender com as vozes daqueles que sobreviveram ao aborto de que este não é um direito humano, mas um inimigo humano. É urgente oferecer uma resposta humana às mães que temem sê-lo, dizendo-lhes — «Dá uma oportunidade ao teu bebé. Estamos contigo. A vida escolheu que ele existisse. Quem sabe qual a razão. Deixemos que nasça e veremos.»


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