Luís Salgado de Matos e padre João Seabra discutiram papel de Afonso Costa e da lei da separação de 1911
Lisboa, 14 abr 2011 (Ecclesia) – A dimensão da perseguição das instituições republicanas à Igreja Católica em Portugal, após a revolução de 1910, dividiu hoje opiniões no congresso internacional de história «100 anos de separação – Religião, Sociedade e Estado».
A iniciativa, a decorrer na Universidade Católica Portuguesa (UCP), juntou Luís Salgado de Matos, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, e o padre João Seabra, da UCP, num debate em torno da Lei da Separação da Igreja do Estado, de 20 de abril de 1911.
Para o sacerdote, autor da tese «O Estado e a Igreja em Portugal no início do século XX – A Lei da Separação de 1911», a “intenção persecutória” de Afonso Costa, ministro da Justiça do governo provisório que assinou esse decreto-lei, é “clara”.
“Todo o regime se destina a submeter a Igreja ao domínio ilimitado do Estado”, em particular “do ministro da Justiça”, declarou João Seabra.
O especialista minimizou a intervenção de Pio X [Papa entre 1903 e 1914), nesta questão, e afirmou que a legislação republicana em matéria religiosa deu origem a uma “verdadeira e própria perseguição à Igreja”.
Salgado de Matos, que assina a obra «A Separação do Estado e da Igreja. Concórdia e conflito entre a Primeira República e o Catolicismo», considerou, por seu lado, que a lei de 1911 “foi feita não para perseguir a Igreja”, mas para “manter a Igreja à defesa”.
Admitindo um conflito social e “simbólico” neste âmbito, o autor disse ser possível “separar instituições”, mas não “separar a organização religiosa da organização social”.
Segundo Luís Salgado de Matos, a aplicação efetiva da legislação de separação foi escassa e promovida por católicos que nunca foram “excomungados” por o terem feito.
O padre João Seabra assinalou que “a separação e a sua lei deram origem a uma avalanche de diplomas” e que este quadro impôs “um regime muito restrito” de organização às confissões religiosas.
Em particular, o sacerdote apontou o dedo ao artigo 17.º da lei de 1911, que considera ter sido redigido “para e contra a Igreja Católica”.
Nesse artigo, pode ler-se que “os membros ou fiéis de uma religião só podem coletivamente contribuir para as despesas gerais do respetivo culto por intermédio de qualquer das corporações, exclusivamente portuguesas, de assistência e beneficência”.
Para o padre João Seabra, “o agravamento da reação da Igreja é uma resposta ao agravamento do regalismo” [interferência do chefe de Estado em assuntos internos da Igreja Católica] por parte do regime da I República.
Luís Salgado de Matos destacou a importância de se compreender, nesta análise, que “a lei da separação vem a configurar uma dada Igreja”, com consequências que diferem do que estava previsto nos documentos legislativos.
O congresso, que decorre até sábado em Lisboa, inclui mais de uma centena de comunicações sobre temas históricos e atuais, proferidas por investigadores universitários da Europa, América, Ásia e África.
OC