Nelson Ribeiro, diretor de programas, RR
A ideia de criação de uma Emissora Católica em Portugal nasceu no início dos anos 30 do século XX quando os sacerdotes Magalhães Costa e Domingos Bastos publicaram diversos artigos no Diário do Minho, nos quais defenderam a importância da Igreja Católica possuir um veículo capaz de levar a sua voz a milhares de portugueses em simultâneo. O projeto começou a ganhar forma, a partir de 1933, pela mão do Pe. Lopes da Cruz que, a partir desta data, e durante seis anos, assumiu a responsabilidade de redigir uma página da revista católica Renascença, onde, todas as quinzenas, escrevia com o objetivo de tornar possível o nascimento da Emissora Católica. Não tardou muito até começar a receber as primeiras ofertas provenientes de leitores, incluindo de membros da Hierarquia da Igreja.
As emissões diárias regulares iniciaram-se a 1 de janeiro de 1937 e, embora o Pe. Lopes da Cruz tivesse deixado claro que estas não se destinavam “apenas a transmitir longos sermões”, a preocupação de contribuir para o aprofundamento da fé dos ouvintes esteve presente desde o primeiro momento. A oficialização da estação, enquanto organismo da Acção Católica, veio posteriormente a ocorrer a 10 de abril de 1938, tendo-se seguido anos de grandes dificuldades financeiras, fruto do contexto originado pela II Guerra Mundial. Não obstante os mais diversos contratempos, o Pe. Lopes da Cruz não desanimou na sua missão, tendo prosseguido com as campanhas de angariação de fundos que tornaram viável o crescimento da Renascença que, nos anos 50, seria um dos sócios fundadores da RTP.
A partir do final dos anos 60, e ao longo do período marcelista, a Renascença ficou conhecida por transmitir diversos programas inovadores pelo facto de abordarem questões sociais que habitualmente estavam afastadas das ondas hertzianas e que o Estado Novo procurava manter invisíveis nos meios de comunicação. No entanto, seria após a revolução do 25 de Abril de 1974 que a estação entraria numa fase de grande afirmação na sociedade portuguesa. Durante o PREC, o controlo da Emissora Católica transformou-se num palco central da luta ideológica que então se travava no país. Tal tornou-se sobretudo visível a partir de maio de 1975 quando a Renascença foi ocupada por elementos da extrema-esquerda, que passaram a controlar a emissão à revelia da Hierarquia da Igreja. Durante a ocupação, que se arrastou durante vários meses, foram transmitidos conteúdos antieclesiais, levando a que em muitas cidades do país milhares de pessoas se manifestassem a favor da devolução da Renascença à Igreja. Os sucessivos governos provisórios manifestaram uma total incapacidade de retirar os ocupantes do interior da estação pelo que, em novembro de 1975, o então primeiro-ministro Pinheiro de Azevedo ordenou a colocação de explosivos nos emissores da Buraca, dado ter sido a única forma que encontrou para silenciar os ocupantes. A programação, já sob o controlo da Igreja, seria posteriormente retomada em janeiro de 1976.
A Renascença havia-se, então, transformado num símbolo da luta ideológica contra os que pretendiam instaurar um regime coletivista em Portugal. Tal contribuiu de forma decisiva para que estação tivesse ganho uma enorme credibilidade e adesão por parte da maioria dos portugueses, tendo passado a ser líder de audiência pouco depois de ter voltado a emitir. Aliás, até ao início dos anos 90, a Renascença permaneceu como a única estação nacional não controlada pelo Estado, dado não ter sido abrangida pelo decreto de nacionalização das emissoras de rádio publicado em dezembro de 1975. Desta forma, os anos 80 ficaram marcados pela afirmação da Emissora Católica como uma voz independente na sociedade portuguesa e pela transmissão de programas de enorme sucesso junto da audiência, com destaque para o “Despertar” apresentado por António Sala e Olga Cardoso.
Paralelamente, e antevendo a pulverização do mercado com novos estações, bem como o adensar do fenómeno da segmentação, a Renascença criou outros canais de rádio destinados a diferentes públicos. Fruto dessa estratégia, em 1987 surgiu a RFM, atualmente a estação líder em Portugal, e em 1998 foi a vez de começar a emitir a MEGA FM, hoje em dia MEGA Hits, destinada a um público jovem entre os 15 e os 24 anos. Mais recentemente, em 2008, foi lançada a Rádio Sim, destinada ao público sénior. Nos últimos anos o Grupo tem investido fortemente na sua presença online, com a criação de webrádios, webtvs, e um jornal digital (Página Um).
Nelson Ribeiro, diretor de programas, RR
Autor da obra ‘A Rádio Renascença e o 25 de Abril’