Religiosidade: Deus perde terreno para o turismo

Sacerdote sugere prioridades da Igreja para aproveitar festas e romarias

Lisboa, 12 jun 2012 (Ecclesia) – O investimento do poder civil na religiosidade popular deve-se mais às motivações económicas do que à promoção da espiritualidade cristã, considera o pároco da Senhora da Hora, capela que está no centro de uma importante romaria em Matosinhos.

A recuperação das tradições não pretende “devolver à alma do povo o que o racional lhe retirou” mas resulta da “aposta num turismo religioso, muitas vezes de mera imitação ou reprodução ou ressuscitação históricas”, escreve o padre Amaro Gonçalo na edição de hoje do Semanário Agência ECCLESIA.

O responsável nota que “o interesse dos políticos e especialistas das ciências sociais é, em muitos casos, puramente arqueológico, sem nenhuma preocupação por atualizar os significados dessas experiências religiosas”, embora reconheça que essa preocupação não lhes pertence.

Há manifestações que perderam a correspondência com a realidade religiosa e sociológica locais, o que não impede alguns autarcas de apoiarem a sua promoção, acrescenta o sacerdote, que também conhece bem a devoção popular ao Beato Gonçalo de Amarante, já que foi responsável por esta paróquia.

Os católicos devem conhecer e valorizar a religiosidade popular, pelo que é imprudente “ignorar ou abolir os revestimentos culturais” de uma fé que pode não ser coerente com a doutrina católica mas que contribui para preparar o anúncio da mensagem cristã.

A religiosidade popular, “um dos acessos mais diretos e penetrantes do coração e da alma de um povo”, é uma oportunidade para a “santificação pessoal” e evangelização da sociedade, desde que se cumpram “certas exigências”, acentua.

A extinção “de um mau costume ou de um costume pagão” deve ser feita mediante “um rito de substituição” que traduza “fiel e adequadamente” a perspetiva cristã, mas “sem pressas iconoclastas de má memória”, sublinha.

A Igreja deve também propor “a atualidade e a beleza” do santo que se assinala, dando a conhecer a sua biografia através de novas narrativas, linguagens e meios, como o cinema e o teatro.

O sacerdote destaca a importância de envolver os grupos de catequese e de jovens na preparação e celebração da festa, iniciando as novas gerações “na comunhão com uma tradição viva, depurando-a de expressões “desencontradas da vivência cristã”.

As recomendações incluem o aviso de “tornar claro o destino das ofertas dos fiéis e a sua aplicação, sobretudo, no âmbito do culto e da caridade, para que se respeite a intencionalidade dos oferentes”.

O dossier do Semanário Agência ECCLESIA desta terça-feira é dedicado à religiosidade popular.

RJM

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