Relançar o voluntariado em Portugal

No Ano Europeu do Voluntariado, Fernanda Freitas, coordenadora nacional da iniciativa, fala à ECCLESIA dos projectos para os próximos meses

No dia 27 de Novembro de 2009, o Conselho de Ministros da União Europeia declarou oficialmente 2011, Ano Europeu das actividades voluntárias que promovam uma cidadania activa. Em Portugal, a coordenadora nacional é a jornalista Fernanda Freitas, que em entrevista à ECCLESIA fala dos projectos para os próximos meses e da intenção de promover o que chama de “voluntariado de proximidade”.

 

Ecclesia (E) – Depois de um ano marcado pela Luta contra a Pobreza e Exclusão Social, sucede um ano dedicado ao Voluntariado. Há uma complementaridade entres estes dois temas? É importante estimular o voluntariado, neste quadro social e económico que vivemos?

Fernanda Freitas (FF) – É interessante o facto de o ano europeu do Voluntariado suceder ao ano de combate à pobreza e exclusão social. No ano passado, fizemos o que eu chamo um diagnóstico. Este ano iremos encontrar parte das respostas, não digo todas. Uma delas pode ser o voluntariado. Há acções, não apenas no voluntariado social e assistencialista, que podem ser desenvolvidas em prol da sociedade.

O povo português é muito generoso, gosta de ajudar. Penso que falta compromisso, ou seja, ser generoso mas numa lógica de compromisso, não apenas quando se é solicitado.

Quando o português assumir o compromisso de ser um povo voluntário, para além de solidário, estaremos no bom caminho para resolver grande parte dos problemas sociais, sobretudo de exclusão social.

 

E – O que vai caracterizar estes próximos meses?

FF – O Ano Europeu de Voluntariado começou oficialmente no mês de Dezembro, mas cada país europeu marca o seu ritmo. Em Portugal, o ano começa, oficialmente, a 3 de Fevereiro com uma iniciativa – «A volta do voluntariado». É uma feira de voluntariado, que começa em Lisboa.

O desafio da Comissão Europeia é situar esta volta nas capitais, mas a comissão portuguesa de acompanhamento do ano, quis ser mais ambiciosa. Em Portugal esta iniciativa, em maior ou menor escala – dependendo do espaço onde se realize – vai espalhar-se pelo país, chegando também às ilhas.

Esta vai ser uma grande acção de voluntariado. Não pretendemos angariar fundos, mas voluntários. Estas «voltas» querem transmitir a disponibilidade que as entidades têm para receber, mas também provocar o inverso – as pessoas devem dirigir-se às entidades e oferecer-se como voluntários. O mais importante deste ano é divulgar o voluntariado e, sobretudo, o voluntariado de proximidade. Antes de atravessar o mundo, para desenvolver projectos em países em vias de desenvolvimento, pergunto se não deveríamos atravessar a rua e perceber o que podemos fazer pela comunidade, bairro ou prédio.

O grande desafio do ano vai ser lançar a semente do voluntariado, que pode estar no espírito dos portugueses, mas falta concretizar. Na comissão de acompanhamento estão representadas entidades de todo o país – paróquias, bombeiros, Juntas de Freguesia, Autarquias, Santas Casas – e vão espalhar a notícia. Acredito que vai ocorrer uma contaminação positiva do que é ser voluntário em Portugal.

 

E – Ser voluntário é um desafio íntimo que exige um compromisso?

FF – Ser voluntário é fazer a diferença, começando pela vida pessoal. Uma coisa é ajudar, outra é um compromisso. Quando se assume interiormente o voluntariado, está a assumir-se um compromisso de missão para concretizar uma ajuda que não é apenas espontânea. Quando fazemos uma acção de voluntariado ficamos mais cheios e felizes. Não há que ter medo de o assumir. É uma entrega extraordinária que nos torna diferentes e melhores pessoas, com mais competências sociais e afectivas.

 

E – A entrega ao voluntariado exige um passo diferente que os portugueses têm ainda de dar?

FF – Sinto que a grande lacuna está na educação. Estamos habituados a ver pais e amigos a ajudar no Natal, a participar com bens consumíveis, no multibanco através de transferências… mas, e depois? É importante ser solidário também em época de Natal, mas não exclusivamente. É importante ser generoso, solidário e voluntário o ano todo. Uma acção pontual surge numa época, mas no restante ano a instituição vai continuar a precisar de ajuda – não apenas de dinheiro ou de arroz, mas das nossas competências.

Ninguém é obrigado a fazer voluntariado. É legítimo pensar que se faz o que se deve – paga-se impostos e contribuiu-se com algo no Natal. Mas somar uns pontos à nossa capacidade de ser humano, encontrar um projecto que se adeque à nossa personalidade, estar feliz nesse projecto, é perceber que ser voluntário é um desafio.

 

E – As instituições têm também um caminho a fazer neste ano?

FF – As instituições têm um grande trabalho a fazer no campo voluntário, sobretudo no dar respostas. O que mais retenho nestes primeiros meses de trabalho, é que muita gente procura ser voluntário e não recebe resposta. Isto não pode acontecer. Não podemos desperdiçar potencial humano. As instituições precisam de abrir espaço ao voluntariado, saber que os voluntários não vão falhar e perceber que um voluntário não vai substituir um trabalhador. Há espaço para toda a gente.

Outro caminho a explorar este ano é o voluntariado empresarial. São muitas as empresas que procuram formação para constituir «Bancos» empresariais de voluntariado, ligando-se a uma instituição ou acção.

 

E – Como vive este desafio de somar este voluntariado a outro que já vinha fazendo?

FF – Em Agosto, o Ministério do Trabalho e Solidariedade Social desafiou-me a ser coordenadora nacional deste Ano Europeu do Voluntariado. É um prazer estar a trabalhar em prol do voluntariado, algo em que acredito piamente. Significa muito trabalho, mas também muito orgulho e, sobretudo, sentido de missão.

Quando as pessoas encontram respostas como «não tenho tempo ou dinheiro», costumo dizer «Quem quer fazer, arranja maneira. Quem não quer fazer, arranja desculpa».

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