Quem decide o que é verdade?

Evitar o sensacionalismo e distinguir realidade de criação mediática são desafios cada vez mais complexos O trabalho dos profissionais da comunicação social é cada vez mais dificultado pela pressão do sensacionalismo e pela confusão entre a realidade e a criação mediática. Este foi o tema de fundo para uma mesa-redonda sobre a questão “Decidir o que é e o que não é realidade na comunicação social”, nas Jornadas dedicadas a esta área que decorrem em Fátima. O Cón. António Rego, director do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais (SNCS), organismo que promove a iniciativa, lançou o debate ao citar Umberto Eco para falar na crescente concentração da imprensa no “mexerico”, convertendo em notícia o que antes não era. Manuel Arouca, escritor e conhecido argumentista de telenovelas, falou deste “acasalamento entre ficção e realidade”, que leva a escrever sobre “o que está a dar”. Neste contexto, as personagens devem ter “uma grande identificação”, devem ser “reais”, com passado, com empregos que os espectadores possam identificar. A ficção tem o poder de transformar um facto restrito em questão universal, formando um “cocktail explosivo” quando a ficção se torna realidade e vice-versa. Isabel Stilwell, directora do Jornal Destak, frisou que “há olhares mais verdadeiros do que outros” e admitiu que exista “má-fé para atingir objectivos” em determinados contextos. Falta, em muita gente, a capacidade de “lutar por uma verdade, uma realidade que os outros recusassem à primeira vista”. Já o Director de Informação da RR, Francisco Sarsfield Cabral, lembra que “o que não é novidade não é notícia”, o que explica em parte a predominância as “notícias negativas”, que implicam uma quebra da ordem normal. A escolha passa, assim, por um compromisso entre o que parece relevante para os jornalistas e o interesse das pessoas pelos temas. Este responsável manifestou-se contra o jornalismo “tablóide”, que mistura informação e entretenimento, defendendo que não se deve “desprezar a inteligência de quem nos ouve, de quem nos vê, de quem nos lê”. Quanto à responsabilidade especial de uma Rádio católica, Sarsfieldr Cabral considera que a Renascença “cumpre essa exigência, de não ser sensacionalista, dando atenção especial aos que não têm voz” ao abordar os “temas sociais mais importantes”. “A primeira obrigação é fazer informação séria, não propaganda”, indicou, justificando que a posição assumida no último referendo ao aborto, com apoio explícito ao “Não”, não implicava deixar de ouvir os apoiantes da liberalização. Sobre o espaço “massificado” da Internet interveio Abílio Martins, administrador do Portal SAPO, para quem é fundamental que exista “criatividade”, aproveitando a capacidade de “chegar ao emissor directamente”. Falando para os vários representantes da imprensa regional, presentes nestas Jornadas Nacionais da Comunicação Social, Abílio Martins fez questão de sublinhar que, também para eles, a “Internet surge como uma grande oportunidade”. O presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais, D. Manuel Clemente, disse esperar que os órgãos de informação católicos não cedam ao sensacionalismo, subordinando-se a critérios comerciais. “Não temos de ceder, temos de dar passos em frente”, referiu aos jornalistas, indicando a necessidade de conciliar a utilização dos recursos mediáticos com a promoção dos “valores da dignidade humana”.

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