Miguel Oliveira Panão (Professor Universitário), Blog & Autor
Quantas vezes um telemóvel toca durante a Eucaristia, ou vemos crianças a jogar para se manterem sossegadas e em silêncio, ou pessoas que de vez em quando o consultam. A missa será ainda um Encontro privilegiado de cada pessoa com Deus, e entre nós com Deus em comunidade? Será que a tecnologia não afecta esse encontro de um modo tal que favorece a superficialidade e não a profundidade?
Um dia, chegando à missa, no início das escadas que dão acesso à parte do coro na Igreja, estava uma jovem sentada e olhava para o telemóvel. Não era o momento das leituras por isso não estaria a consultá-las numa app. Reparei que trocava mensagens.
Muitas pessoas incomodam-se com a agitação das crianças, mesmo se já vi sacerdotes valorizarem a importância dessa agitação como parte da vida inerente à comunidade Cristã. O que é consolador, mas… encontrámos um modo mais simples de as acalmar passando um telemóvel para as suas mãos. Pintar desenhos é coisa do passado. Jogar ou visualizar vídeos no YouTube sem som é mais eficaz. Com um desenho que faz parte da nossa linguagem visual, uma criança capta sempre algo do que se passa à sua volta, mas um telemóvel exige do seu cérebro toda a sua atenção. Por isso, cala-se e está sossegada, mas será nestas condições alguma vez aprenderá a escutar Deus?
Há qualquer coisa na nossa postura que merece alguma reflexão. Imaginem alguém num Museu que se senta diante de um quadro de Rembrandt, puxa do telemóvel e começar a jogar. Ou então alguém que vai ao cinema, ou teatro, e começa a trocar mensagens com um amigo ininterruptamente. Imagina agora que estás a falar com alguém e queres dizer-lhe algo muito importante para a sua vida, mas esse tira do bolso o telemóvel e começa a consultar os emails.
É este o cenário que se avizinha se não procurarmos o equilíbrio entre o real e o digital. Há muito que oiço o aviso de como as nossas vidas estão demasiado artificializadas, mas nunca pensei o quão difícil seria chegar a um equilíbrio.
Há um mundo de possibilidades e esperança que se abre quando deixamos que Deus nos fale. Quando nos dispomos a escutar aquela voz interior que nos inspira e move. Uma voz que nos dá coragem de que o futuro será melhor do que qualquer passado. Porém, o que nos leva a preferir a distracção e a superficialidade a uma maior profundidade e realização?
Gratificação instantânea.
Penso que seja importante questionar se é a gratificação instantânea que me realiza totalmente. O Papa Francisco recordou na segunda catequese sobre a Missa que essa ”é o encontro de amor com Deus mediante a sua Palavra e o Corpo e Sangue de Jesus.”
Um encontro de amor que realiza em nós uma experiência transformativa, ou seja, que muda realmente a nossa vida, leva tempo, paciência, persistência. Mas, acontecendo, dá-nos uma alegria plena, sentido de realização, e significa qualquer coisa que nos inspira.
É um dar espaço a que Deus nos surpreenda com uma luz particular no silêncio, na oração, naquela palavra dita na homilia ou num abraço da paz – literalmente – que nos é dado.
Gratificação perene.
É esta a escolha que temos diante de nós.
Eu estou a fazer a experiência de deixar o telemóvel em modo de voo, ou mesmo em casa.
Queres experimentar?