Que mundo este, onde para ser escravo é preciso estudar!

O conformismo alimenta o esquecimento. À falta de esperança junta-se um entorpecedor sentimento de abandono

Num tempo em que se extrema a dicotomia entre a educação que temos e as expectativas com que sonhamos, a nova canção dos Deolinda vem retomar o tema. “Parva que sou” está nas redes sociais, gerando uma reacção intensa e espontânea. Alguém denuncia, finalmente, a condição de milhares de jovens, numa síntese clara dos seus problemas reais.

Já considerada como o hino de uma geração à deriva, afastada dos seus sonhos, que vive a prazo, que adia o futuro, que só conhece a precariedade como modelo de vida e para o trabalho. As posições demarcam-se e, como noutros tempos, há também quem nela veja um hino aos ‘’direitos adquiridos’’ e aos ‘’empregos para a vida’’. Mas o argumento não colhe, nem tão pouco serve para aniquilar toda uma geração, ou melhor, várias.

Muitos protestos se têm sustentado em canções panfletárias ou de intervenção. Para os que já viveram alguns, esta vem apenas recordar um problema antigo. A tal “geração sem remuneração”, a “dos recibos verdes”, não é a do século XXI. Não há memória, aliás, de que as anteriores alguma vez tivessem melhor enquadramento. Só para recordar os anos recentes, de uma geração “perdida”, depressa passámos a uma geração “rasca”, até uma outra “à rasca”. Os Deolinda propõe uma geração “parva”, porventura, a mais qualificada de sempre.

Nada disto é novo. Nem o conceito, nem as orientações. Os mais velhos já se lançaram à aventura, os mais novos trilham o caminho. Em comum, todos têm por adquirido que o paradigma não é, nem será, o que lhes ensinaram.

Que têm feito as instituições? Que têm feito os jovens? O conformismo alimenta o esquecimento. À falta de esperança junta-se um entorpecedor sentimento de abandono. Um amigo desabafava: “Finalmente vejo alguém dizer exactamente o que se passa com a geração a que pertenço. Precários é uma forma evoluída de dizer abandonados!”

O verdadeiro debate, esse sim, continua por fazer. A crise propicia esta inércia, alimenta o alheamento, justifica a desresponsabilização. Pois, está mau para todos! Não se aposta, não se potenciam capacidades. Porquê? Como esperar um retorno sem investimento? Demasiadas questões, para um debate quimérico!

É urgente discutir o tema e repensar valores. Na sua missão, a Igreja pode ter um desempenho acrescido. Mostrando-se exemplar na actuação, naturalmente, mas também marcando posição, lançando o debate, apoiando e ouvindo.

Sandra Costa Saldanha

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Agência ECCLESIA

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