Quando o padre se suicida…

Luísa Gonçalves, diocese do Funchal

A notícia do suicídio do padre Matteo Balzano, de apenas 35 anos, da Diocese de Novara — encontrado sem vida no dia 5 de julho, numa casa paroquial em Cannobio — deixa-nos uma profunda sensação de dor e ao mesmo tempo de perplexidade.

Talvez o impacto mais forte seja o da contradição: um homem do sagrado, acolhedor e dedicado à comunidade, encontrava-se tão fragilizado que levou a cabo o gesto mais extremo. Este contraste entre a imagem pública — de um pastor dedicado — e o silêncio do sofrimento interior, exige reflexão, compaixão e ação.

A fragilidade humana não escolhe batina

Padres, médicos, professores — todos somos humanos. O padre Balzano, apesar do seu compromisso vocacional, enfrentava batalhas internas invisíveis. Como recordou Fr. Jean Claude Schembri, “um padre é um ser humano com as mesmas lutas emocionais…” Embora aparentemente fortes, podem sentir-se desamparados. E é aí que novelas da alma podem transformar-se em tragédias reais.

Há algo de paradoxal em servir como figura moral: espera-se perfeição, presença constante e uma vida exemplar — sem espaço para vulnerabilidade. Mas essa pressão pode esmagar. Com frequência, quem cuida mais dos outros não cuida de si. E assim, dentro das comunidades, muitos “profissionais” do sagrado acabam por sofrer em silêncio.

Comunidades: lugar de cura ou de julgamento?

Os comentários de psicólogos sensibilizados com o caso sublinham uma verdade urgente: vulnerabilidade não tem rosto nem função social. E está na hora de quebrar o silêncio. Quantos sinais de alerta terão sido ignorados ou não lidos? E quantos ambientes eclesiásticos e comunitários continuam pouco preparados para acolher fragilidades, medos e pedidos de ajuda?

Devemos questionar: será que temos mesmo cultura de escuta, de apoio, de proximidade honesta — ou somos mais tribunais do que lar? A morte de Balzano revela a necessidade de transformar comunidades em espaços de cuidado real, onde se possa perguntar “como estás?”, em vez de apenas “o que pregaste hoje?”.

Em vez de apenas lamentar, é momento de agir. Não por condescendência, mas por compaixão e humanidade. Um gesto simples como perguntar sinceramente o que alguém sente pode transformar vidas.

O suicídio do padre Matteo Balzano não é, infelizmente, um ato isolado — é antes um sinal de alerta. Ele convoca-nos a tratar cada ser humano (inclusive os que vestem a batina) com dignidade, atenção e carinho.

Que esta tragédia nos inspire não só tristeza, mas mudança concreta: mais compreensão, mais apoio, mais humanidade — e menos julgamento.

Luísa Gonçalves

(Os artigos de opinião publicados na secção ‘Opinião’ e ‘Rubricas’ do portal da Agência Ecclesia são da responsabilidade de quem os assina e vinculam apenas os seus autores.)

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