Caminhos para uma formação adequada de crianças e adultos À luz dos conceitos da psicologia reflectir sobre a transmissão da fé. Foi este o objectivo de dois encontros que por iniciativa dos párocos da cidade de Beja confrontou os participantes com a importância da coerência entre actos e palavras. Partindo da Carta Encíclica de João Paulo II “Fides et Ratio” – A fé e a razão, foram abordadas as forma como as crianças reagem aos estímulos e acções dos adultos. “As crianças de oito, nove anos funcionam essencialmente por mimetismo”, afirma o psicólogo Paulo Godinho, conferencista do encontro. A imitação social, os mecanismos psicológicos de mimetismo, de modelagem são elementos geradores de comportamentos “que facilitam a transmissão da fé”. Estes mecanismo vêm relatados no Novo Testamento, “mesmo Jesus já os usava”, adianta, e está muito presente no magistério dos Papas, em particular de João Paulo II. Banalização da Palavra Esta reflexão confrontou os participantes para a importância da coerência. “A fé actualmente só é possível ser transmitida por actos concretos, porque a palavra banalizou-se”, sublinha. Nas sociedade primitivas a palavra era «sagrada», mas actualmente deu-se lugar a um “desrespeito pela palavra, porque existem muitas. Banalizaram-se os conceitos”, adianta. “Quando falamos de amor, cabe muita coisa”, exemplifica o psicólogo. A transmissão no Séc. XXI é uma transmissão por actos. A coerência implica uma “grande responsabilidade e isto foi descoberto pelos participantes no encontro”, sublinha o psicólogo, que dá conta da geral percepção que algo falha na transmissão e na vivência da fé. “Falamos muito e agimos pouco”, adianta. “Talvez porque os actos implicam uma maior implicação do ser, uma reflexão na estrutura interna de cada pessoa”. Paulo Godinho afirma que Paulo VI apontava em tom profético o que hoje se constata. “Existe um divórcio entre fé e vida de tal forma que partilhamos a nossa fé dentro do espaço eclesial, mas dentro do espaço social, familiar, profissional demitimo-nos”, aponta, o que não acontece com “outras confissões”. Formação inadequada Os católicos têm uma formação de “primeira comunhão”. Nesse sentido aponta que “precisamos de crescer pessoalmente para dar resposta a novas necessidades que já não se adequam ao discurso antigo da «Velha Cristandade»”. Há uma crise sim, mas “a fé católica jamais desaparecerá e esta é uma das certezas que nos mantém”, sublinha o conferencista. Mas esta reflexão põe em causa muitas coisas não só “sobre a formação das crianças mas também dos adultos”, porque “estamos a fazer o processo ao contrário, começamos pelo tecto e não temos os fundamentos da casa, que neste caso são os adultos, como primeiros responsáveis da transmissão da fé aos mais novos”. As crianças ouvem uma realidade na catequese, mas com os pais experimentam outra diferente. “Passam mais tempo com os pais e na escola, que tem um ambiente adverso ao cristianismo”. Conceitos que na sociedade portuguesa ganham forma “dada a gravíssima mutação cultural”. Os caminhos foram apontados já no “Concílio Vaticano II, temos é de os actualizar, porque está tudo lá”. Há pelo menos 20 anos que os Papas e os Conselhos Pontifícios alertam para várias acções que podem ser feitas para superar esta situação social e cultural. A fé católica baseia-se na Escritura e na Tradição. “Dedicámos muita importância à escritura mas há que redescobrir a tradição”, finaliza Paulo Godinho.