Prisões: «Na cadeia tenho 80 filhos. Temos de os amar» – Irmã Fátima Magalhães

Atividades do grupo «Mateus 25» continuam no Estabelecimento prisional de Elvas, apesar da pandemia

Elvas, 18 nov 2020 (Ecclesia) – A irmã Fátima Magalhães, responsável pelo grupo «Mateus 25», que visita o Estabelecimento Prisional de Elvas, disse hoje à Agência ECCLESIA que o trabalho dos voluntários não ficou interrompido durante o tempo de pademia.

“Só durante o confinamento em março e abril é que não pudemos ir à cadeia, mas desde então, não interrompemos as visitas semanais. Agora foi-nos pedido que mudássemos o dia de visita, geralmente ao sábado, para um dia de semana, por causa do confinamento, e passamos a ir à quinta-feira”, explica a religiosa da congregação da Companhia de Santa Teresa Jesus.

As visitas decorrem durante uma hora, entre as 10h00 e as 11h00, numa sala onde os reclusos, “não mais de dez” e os voluntários, “no máximo quatro”, conversam e rezam.

“Temos máscaras, álcool-gel e ficamos separados por acrílicos. Antes andávamos pelos pátios e na biblioteca mas agora temos de ficar logo à entrada, na salinha”, indica a religiosa que desde 1995 visita os reclusos no Estabelecimento prisional de Elvas, onde cerca de 70 a 90 detidos preventivos ou a cumprir penas mais leves.

Durante os meses de março e abril, conta a irmã Fátima Magalhães, mantiveram-se em contacto com a diretora do Estabelecimento e com o responsável para alguma necessidade e não podendo entrar na cadeia, o grupo «Mateus 25» elegeu um responsável, entre os reclusos, a quem entregaram “algum material, como missais e Novos Testamentos”, que fez chegar aos restantes detidos.

Na Páscoa, foi entregue um livro com “mensagens do arcebispo, do pároco e minha”, amêndoas, “sabonetes e sabão azul, que dizem ser um bom desinfetante” e o grupo prepara, neste momento, algumas ofertas para o Natal.

Este ano não podemos fazer um lanche tradicional mas vamos oferecer a cada recluso roupa interior, um novo testamento, um terço, um saco com chocolates, e vamos entregar a todo o estabelecimento, não apenas aos que vêm ao grupo. Já pedi uma lista para conhecer os que têm filhos até aos 14 anos, e fazemos uma recolha de brinquedos, para depois distribuir entre os reclusos para entregarem aos filhos”.

O grupo «Mateus 25» quer ser uma “presença da Igreja” junto da população prisional no Estabelecimento Prisional de Elvas, procurando ser um sinal “de esperança e amor para os reclusos através dos gestos significativos”: “Vamos voluntariamente e gratuitamente”, assinala a religiosa.

“Entregámos um plano de atividades que foi aprovado pelo Estabelecimento e validado pela Direção-Geral dos Serviços Prisionais. Temos muito apoio, estamos lá para os escutar”, indica.

São muitas as histórias que a irmã Fátima Magalhães partilha como sinal de que um caminho de acompanhamento, “escuta” e “verdade” são as formas de conversão.

“Um jovem disse-me uma vez que lá fora não lhe faltavam amor, drogas e dinheiro, mas que foi dentro da cadeia que encontrou a paz”, recorda.

A irmã Fátima, que antes da sua profissão religiosa já visitava presos, sublinha que o importante é dar a conhecer “a liberdade interior” e que “é sempre possível recomeçar do zero”.

“Não batemos palmas aos erros mas dizemos que não estão à parte da Igreja e para Deus. Não são os erros e crimes que cometeram. Têm dentro uma parte boa, que é a imagem de Deus que está lá, podem recomeçar do zero”, esclarece.

E a religiosa diz que fica feliz porque com os detidos descobre gestos de generosidade que não encontra fora do estabelecimento e assiduamente partilha com a sua comunidade que a melhor meditação do evangelho que faz a cada semana é um os reclusos.

“Um senhor foi detido por roubar comida para a mulher, doente e os filhos. Os seus colegas na prisão, guardaram as suas ceias, que são iogurtes ou sandes, e entregaram-lhe para ele dar aos filhos”, conta.

A irmã Fátima Magalhães, que indica ser apenas o rosto de mais de 100 voluntários, indica o quanto os detidos precisam de sentir que alguém gosta deles, e olha para as pessoas em si, “não para os erros”.

“Uma vez uma senhora perguntou-se se eu era religiosa e se tinha filhos. Disse-lhe que era religiosa sim, e na cadeia de Elvas tinha 80 filhos. Temos de os amar”, sublinha.

A religiosa lamenta a falta de preparação das igrejas e comunidades para receber e acompanhar os reclusos que saem: “Não é dizer «vem à missa», porque muitos nem sabem o que isso é. Têm de ser apoiados, com grupos de acolhimento”.

“Se os pobres são o centro da Igreja, eles têm de estar no centro das vidas de quem se diz cristão”, sublinha.

LS

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Agência ECCLESIA

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