Presépio histórico reabre ao público no Museu do Azulejo

A partir de hoje o público que se dirigir ao Museu Nacional do Azulejo vai poder encontrar uma das obras primas da escultura portuguesa do século XVIII. Trata-se do Presépio da Madre de Deus. Não há registo exacto do número de peças que poderiam formar o presépio da Madre de Deus. Presentemente é composto por 42 peças, com diferentes tamanhos (de 15cm a 70cm), as quais compõem um dos primeiros exemplares de grandes presépios em terracota, que corresponde bem ao gosto português pelos presépios. A Sagrada Família, um conjunto de anjos que tocam, a adoração dos pastores, os reis magos que aparecem em último plano ainda a cavalgar em direcção à sagrada família fazem parte do conjunto. Característica desta obra também é o facto de as figuras serem retratadas tal como eram no princípio do Séc. XVIII: o camponês que trata dos queijos, outro que toca sanfona, um casal de camponeses com as crianças, criando uma grande associação com a realidade da época. “Há um realismo barroco na forma verdadeira como tudo é descrito, mas tudo está cheio de um espírito muito voluptuoso, os tecidos são muito belos, as figuras muito bonitas, sendo também um veículo de espiritualidade para todo o conjunto”, descreve Paulo Henriques, Director do Museu Nacional do Azulejo. O restauro demorou alguns anos. Neste processo “fomos à descoberta das cores iniciais das figuras”, relata, num trabalho levado a cabo por uma restauradora. O presépio tem uma dimensão teatral, porque as peças que estão mais próximas são maiores e as que se encontram mais distante são mais pequenas, igualando assim o efeito da perspectiva. Desmontada em 1830, esta obra integrou o património do Estado, dado o encerramento das instituições monásticas, e encontrava-se no Museu Nacional de Arte Antiga. O presépio foi reunido e conservado, chegando em grande parte até aos nossos dias. “A circunstância feliz agora permite o regresso à Casa do Presépio que existe no Convento da Madre de Deus”, sublinha o Director do Museu Nacional do Azulejo. “Sempre houve um espaço que se chamava a casa do presépio, sendo um espaço reservado que albergava o presépio no antigo Convento de Clarissas da Ordem de São Francisco, que iniciou o culto pelos presépios”, acrescenta. Esta peça tinha um grande peso na instituição dentro dos objectos rituais e litúrgicos tinha um peso central. É uma obra muito importante que se encontrava na Capela de Santo António, “regressa agora ao seu lugar de origem. Vamos poder usufruir de uma peça de escultura que é uma obra prima da escultura portuguesa”, frisa Paulo Henriques. Tradição portuguesa Há uma tradição de escultura em terracota em Portugal. O Director do Museu nacional do Azulejo afirma que este exemplar, a partir de hoje, disponível ao público, será dos primeiros exemplares de grandes presépios em terracota, correspondendo bem ao gosto português pelos presépios. Feitos de barro cozido, modelados por mãos de grande mestre, levam um preparo de gesso para receber a pintura de grande rigor e qualidade. Por último recebem uma folha de ouro. O século XVIII é considerado o século de ouro dos presépios portugueses, modelados pelos Franciscanos, Dominicanos e portugueses vindos recentemente de Itália onde tinham estudado por conta de fidalgos. Os frades de Alcobaça e de Mafra, as escolas de Lisboa e do Alentejo, e artistas como Joaquim Machado de Castro e Alexandre Guisti tomaram- se famosos nesta época. Machado de Castro, artista de Coimbra nascido em 1731, é um dos mais conhecidos escultores de presépios, tendo modelado inúmeros trabalhos deste género, cheios de fantasia, humanismo e imaginação. António Ferreira foi outro barrista da mesma época que modelou figurinhas cheias de fantasia, que se encontram no convento da Cartuxa de Laveiras e no da Madre de Deus em Lisboa. No século XIX as guerras que se fizeram sentir em Portugal fizeram com que não houvesse ambiente para se fazerem presépios. A extinção de conventos levou a que muitos presépios desaparecessem. Em algumas casas particulares nobres, os seus presépios também se perderam, no entanto ficaram frequentemente as figuras principais: o Menino, a Virgem, S. José, o burro e a vaca. No século XX e até hoje as tradições dos presépios não desapareceram. Um pouco por todo lado esta tradição mantém-se com recurso a uma genuína criatividade e, por vezes até, alguma aventura. O gosto pelo presépio que marca esta época do ano, tem características na sua descrição que se estendem aos dias de hoje: pequenos episódios que não se relacionando directamente com a cena central, ajudam a retractar o quotidiano da época “chegando mesmo a contar uma história para além da cena principal” declara Paulo Henriques. A roupa e os tecidos, são características deste tipo de presépios, sendo também documento da época em que a obra foi feita.

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