«Política do virar costas não pode ganhar», frisa o coordenador da PAR, André Costa Jorge
Lisboa, 8 jan 2019 (Ecclesia) – A Plataforma portuguesa de Apoio aos Refugiados associou-se hoje ao apelo do Papa e de várias organizações internacionais, para que a Europa acolha os 49 migrantes que esperam há vários dias por uma solução, a bordo de dois navios no Mediterrâneo.
Em entrevista hoje à Agência ECCLESIA, o coordenador da PAR frisa que está em causa “uma situação de emergência humanitária”, com “vidas humanas em jogo”, algo que “não pode ser simplesmente ignorado”.
André Costa Jorge alerta que este impasse que envolve 32 migrantes a bordo do navio Sea Watch 3, e 17 migrantes recolhidos por uma embarcação da organização Sea Eye, pode ter um custo elevado, já que “as condições a bordo, com o passar do tempo”, têm vindo a “deteriorar-se”.
“A informação que vamos tendo é que, para além da redução de mantimentos, as condições de higiene, de salubridade e de saúde mental tendem a agravar-se, já que as pessoas estão num espaço confinado”, sublinha o também diretor do Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS) em Portugal.
Os migrantes a bordo do navio Sea Watch 3, detido por uma organização não-governamental com o mesmo nome, foram resgatados a 22 de dezembro ao largo da Líbia.
Em causa estão vinte e um homens, quatro mulheres, três crianças e quatro menores que permanecem a bordo da embarcação, à deriva no Mediterrâneo, há 14 dias.
No que toca ao navio Sea Eye, são 17 pessoas que estão nesta situação, neste caso há uma semana.
Nos últimos dias, os Salesianos de Malta, “impossibilitados de ajudar diretamente os migrantes, ofereceram-se para receber os 16 tripulantes” dos navios que, segundo a Agência de Informação Salesiana, tratam-se na sua maioria de “marinheiros alemães, já exaustos pela longa espera de quase quatro semanas em uma missão de resgate no mar”.
“As nossas orações acompanham aqueles que ainda estão a bordo, enquanto pedimos por uma ação humanitária em favor daqueles que arriscaram tudo para salvar as suas vidas e das suas famílias, fugindo dos seus países de origem e da Líbia”, referem os salesianos de Malta, em comunicado.
A crise migratória que tem batido à porta da Europa nos últimos anos conheceu recentemente novas dificuldades, depois de a Itália, em junho de 2018, ter fechado os seus portos à entrada de mais deslocados a partir do Mediterrâneo.
Desde então, cada caso tem de ser analisado e avaliado individualmente, o que faz com que o processo seja mais moroso e arriscado.
Em 2018, de acordo com dados da Agência das Nações Unidas para os Refugiados, mais de 2240 pessoas perderam a vida a tentar chegar a território europeu através do Mar Mediterrâneo.
O coordenador da Plataforma portuguesa de Apoio aos Refugiados considera que há países que “estão a hipotecar os valores europeus” e que é fundamental “não deixar ganhar esta política do virar costas, do fechar portas”, que “só cria mais vítimas”.
Para isso defende a necessidade de “uma abordagem mais abrangente às políticas migratórias” e “que sejam tomadas medidas concretas”, que dêem alternativas às pessoas migrantes e refugiadas.
Entre essas medidas, André Costa Jorge realça a importância de “adotar vias legais e seguras para as migrações”, de apostar na criação de “vistos humanitários” e de criar condições mais favoráveis ao “reagrupamento familiar” das pessoas deslocadas.
Aquele responsável chama ainda a atenção para a urgência de “uma reforma nas políticas europeias para que haja maior cooperação e consenso entre todos os Estados-membros da União Europeia, e não apenas de alguns”.
Até agora, foram 10 os países que manifestaram a sua disponibilidade para receber parte destes 49 migrantes que foram referidos, incluindo Portugal, que mostrou a sua abertura a acolher 10 pessoas.
Para André Costa Jorge, “a posição do Estado português é uma posição sensata e certa”, no sentido que reforça precisamente essa mensagem, de que é preciso “partilhar parte da responsabilidade do acolhimento”, de que “a resposta europeia deve ser isso mesmo, europeia”.
Quanto ao papel que a PAR está disposta a desempenhar nesta situação concreta, aquele responsável realça que “tal como desde a sua fundação”, em 2015, a Plataforma vai continuar a procurar ser “uma resposta da sociedade civil” portuguesa “para o drama dos refugiados”.
“A Plataforma está disponível para continuar a acolher os refugiados que se enquadrem na nossa capacidade de acolhimento. No caso concreto, se houver famílias nesses navios, se houver crianças, a PAR dará o seu contributo para o esforço de todos”, salientou André Costa Jorge, que adiantou que neste momento a PAR está ativamente a buscar mais instituições de acolhimento que possam participar neste esforço, que implica tão somente ter “um coração largo” e “a coragem da hospitalidade”.
“Foi isto que as instituições nos ensinaram ao longo destes anos. E queremos melhorar as respostas, porque é possível fazer melhor”, sustentou o coordenador da PAR.
A Plataforma portuguesa de Apoio aos Refugiados, constituída por cerca de uma centena de instituições da sociedade civil, entre as quais diversos organismos católicos, acolheu nos últimos três anos 675 pessoas, distribuídas por 144 famílias, através do seu programa PAR – Famílias.
JCP