Portugal no Arquivo Secreto do Vaticano

Três mil páginas desvendam investigação referente à expansão portuguesa no Brasil, Oriente, costa de África e ilhas atlânticas

Lisboa, 03 out 2011 (Ecclesia) – O historiador José Eduardo Franco, coordenador da obra ‘Arquivo Secreto do Vaticano – Expansão Portuguesa”, afirmou à ECCLESIA que os três volumes da investigação que se estende até ao século XX revelam a “realidade nua e crua da Igreja”.

“Este arquivos são a expressão da realidade humana, que também é transversal à Igreja”, refere o investigador, acrescentando que os documentos desvendam “conflitos e sucessos, inveja e amor, ódio e guerra, vidas exemplares e vidas pouco exemplares”, revelando uma “realidade íntima, e também secreta, do governo e da administração” eclesiais.

O estudo, que se baseou num trabalho desenvolvido por várias equipas durante 15 anos em Portugal e no fundo da Nunciatura de Lisboa no Vaticano, é hoje apresentado na reitoria da Universidade de Lisboa, pelas 18h30.

Os três tomos, correspondentes ao Brasil, Oriente, costa ocidental de África e ilhas atlânticas, abordam o “processo de globalização do cristianismo e da Igreja Católica nas suas imbricações com as diferentes culturas e o Estado”, descreve o especialista madeirense.

O caráter expansionista da Igreja “foi casado, em determinados momentos, com o ideário de alguns Estados, nomeadamente das coroas ibéricas, no período da expansão portuguesa”, explica José Eduardo Franco.

Registaram-se também períodos de “tensão”, nomeadamente durante o governo do Marquês de Pombal (séc. XVIII) e no século seguinte, com o confronto entre poderes e ideologias defendidas pelo trono e pelo altar.

O coordenador está convencido de que o estudo é “um serviço à transparência da Igreja” e às suas relações com o Estado, já que, como o arquivo manifesta, “a política está promiscuamente presente” na atividade eclesial.

A obra com cerca de três mil páginas e quase 14 mil documentos, editada pela Esfera do Caos, patenteia também a importância precursora de Portugal e Espanha na aproximação das culturas.

 “A realidade da globalização em que vivemos deveu-se muito à existência de um ideário universalista que envolveu os povos ibéricos”, permitindo “quebrar as fronteiras de um mundo compartimentado e que não dialogava entre si”, considera José Eduardo Franco.

A difusão do cristianismo também se integrou neste dinamismo, por vezes marcado por erros: “O desejo de uniformização, em que muitas vezes a Igreja Católica se identificou com a Europa no processo de domínio do mundo, foi a parte menos positiva” da evangelização, refere o historiador.

Os equívocos não foram em vão, já que a Igreja, segundo José Eduardo Franco, soube aprender com o passado, adotando a “inculturação” como “método de evangelização” que “respeita” e “integra” os valores dos povos onde se insere.

A retrospetiva permite também uma análise mais enriquecida da realidade: “Podemos perceber melhor a dinâmica em curso no presente”, considera o investigador, salientando que “a informação é um dos capitais decisivos do processo de construção da Igreja”.

O investigador diz que “o Arquivo Secreto do Vaticano tem sido envolvido numa aura de mistério”, em parte devido à “publicação de muita literatura de ficção”, mas refere que “de secreto só tem o nome porque está acessível aos investigadores de todo o mundo”.

“Temos no Arquivo do Vaticano uma espécie de ‘ADN’ da história mundial, que não encontramos noutro lado”, assinala.

PTE/RM

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