Portugal: Igreja Católica tem sido «principal ajuda» dos pobres – João César das Neves

O número de pobres em Portugal não desce e, pela primeira vez em sete anos, a taxa de risco de pobreza subiu. Portugal tem 2,1 milhões de pobres, ou seja, cerca de um quinto da população é pobre ou está em risco de exclusão. Mais preocupante ainda, o facto de ser no grupo de crianças e jovens que a taxa de risco de pobreza mais se agravou. Acresce a tudo isto, o aumento do número de pessoas em situação de sem-abrigo. Em 2023, eram mais 2300 os cidadãos em situação de sem-abrigo do que em 2022.  Para refletir esta realidade, é convidado esta semana da Renascença e da Agência Ecclesia, João César das Neves, professor catedrático de economia da Universidade Católica Portuguesa

Foto: RR/Beatriz Pereira

Entrevista conduzida por Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)

Nas últimas semanas, tivemos vários convidados a falar sobre situações de exclusão, de iniciativas de solidariedade social, de debates sobre a pobreza. Sabemos que o desemprego em Portugal é um fator de risco para a pobreza e a exclusão social, mas mesmo pessoas empregadas, e estamos a falar de quase 10% dos trabalhadores, são pobres. Percebemos que um dos problemas em Portugal também tem a ver com o nível dos salários?

Esse é o problema principal, de facto. Os salários são baixos e não sobem. E não sobem porque o sistema não deixa subir. É uma coisa que está instalada e não é fácil de mudar. Podemos dizer que o cobertor é demasiado curto e para a maior parte da população chega, mas há uma fatia, que é uma fatia importante, acabamos de ver hoje os números, que não lhe chega e o sistema não consegue dar a volta. E não consegue dar a volta porque está bloqueado. Está bloqueado por leis laborais, está bloqueado por impostos, está bloqueado por interesses instalados, por uma enorme quantidade de coisas que não são ladrões, não são maus, não são corruptos, não vale a pena insultar, mas que não deixam desenvolver o país. Por isso a taxa de crescimento é baixa, por isso os salários são muito baixos e o que é extraordinário é que a maneira para tratar disto, que nós estamos a ver em todos os partidos, é mais doses da mesma terapia que nos trouxeram.

 

A palavra pode ser estranha, mas falta também algum sentido de risco?

Sim, está tudo instalado, de facto, o país está contentinho. O país está contentinho, quer dizer, de tal maneira que nós tínhamos até há pouco tempo uma maioria absoluta. Agora a coisa está um bocadinho mais confusa, mas em geral os partidos grandes do meio são iguais, dizem as mesmas coisas. Portanto o país está estável, é uma coisa importante, porque os outros países da Europa andam todos à pancada e já tivemos épocas de Portugal em que estivemos à pancada. Isso é uma coisa boa. Portugal é um país rico, é preciso dizer isto para não cairmos também nos desânimos habituais, agora o sistema está bloqueado e não tem maneira de sair. Quer dizer, as várias experiências que tentámos não saem… tem a ver com coisas que nós todos acreditamos e que são falsas.

 

Mas por exemplo, o salário mínimo: temos a ambição de em 2028 atingirmos os 1020 euros. Em 2025, vai situar-se nos 870 euros. Quando diz que os salários não sobem, está a referir-se eventualmente ao salário médio nacional? 

Claro, é esse o problema. O salário mínimo em Portugal é uma das causas do desastre, porque ele está altíssimo – não em termos nominais, porque temos o mais baixo da Europa, agora se calcularmos em percentagem o salário médio, é o mais alto da Europa. O que isto quer dizer? Quer dizer que o desejo, a ânsia de todos os governos, e este é muito diferente do anterior e tem exatamente a mesma linha do anterior, de subir o salário mínimo, é um mito de que vai resolver o problema, mas não vai. Vai aumentar a pobreza, porque ao subir o salário mínimo vamos estrangular uma enorme quantidade de empresas, e não só empresas, conheço várias associações de solidariedade social, que andam a ajudar os pobres e que dizem que não conseguem sobreviver com a subida sistemática do salário mínimo. Portanto, ficam uma enorme quantidade de pessoas que estão desqualificadas, deixam de trabalhar, não têm produtividade para isso, empresas que vão abaixo, e nós alegadamente resolvemos o problema da pobreza subindo o salário mínimo. É um desses mitos, esse caso é um dos casos mais típicos do mito de conseguir resolver o problema com uma lei, ainda por cima não tem nenhuma despesa do Estado, porque o Estado não paga salários mínimos, quem paga são as empresas. Portanto, fazem boa figura à custa do dinheiro dos outros, e não percebem que com isto estão a espremer o leque salarial, de baixo para cima: já há muitas profissões que estão a receber o salário mínimo, porque, entretanto, o salário mínimo atingiu a produtividade. Como a única maneira de subir os salários, os mínimos, os médios e todos, é aumentar a produtividade, mas isso está do lado do capital, que aliás é o mau desta história, em Portugal o grande capital é o grande inimigo de todas as coisas, temos o país descapitalizado, temos o país endividado, não temos capital, não sobe a produtividade, os salários médios não sobem, e depois andamos a fazer cosmética, de subir o salário mínimo, convencidos que com isso resolvemos o problema e não resolvemos. O que a teoria económica diz, é que o salário mínimo deve ser um indicador estrutural da economia, o que quer dizer que deve ser estável, subindo nas gerações, porque a produtividade do país vai aumentando e, portanto, ele deve subir, mas subir muito lentamente.

 

Mas também temos esta realidade, que em Portugal a grande maioria dos portugueses recebe salários muito baixos, próximos do salário mínimo…

Por causa disso, porque não temos produtividade, mas era para aí que se devia virar a atenção. Devíamos virar a atenção para a produtividade, e como é que se aumenta a produtividade? Aumentando o investimento, aumentando o investimento de qualidade, não é como se vê com o PRR a impingir tudo em construção e em burocracia. É olhar para a produtividade das empresas, inovação, mas esses são os maus da fita, esses são os patrões, esses são os investidores, esses são os especuladores, são aqueles que nós insultamos sistematicamente quando falamos dos pobres, e não percebem que ao fazer isso estão a destruir a única maneira de acabar com os pobres, que é haver crescimento económico. Nós estamos com a economia empatada há mais de 20 anos, não cresce, quando chega a 2% ficamos todos entusiasmados. Anda a crescer pouquinho, porquê? Por causa disto.

 

Certamente tem a noção, porque já está nisto há muitos anos, que muitas das coisas que está a dizer não são das mais populares de se ouvir…

Nem queira saber…

 

Muitas pessoas referem que as receitas que estão a ser implementadas não funcionam. Há uma questão que tem a ver com as prestações sociais, porque sem as prestações sociais ainda mais pessoas estariam na pobreza em Portugal. Mas os dados mostram que estas são uma das causas estruturais, porque são baixas, ou seja, não ajudam as pessoas a sair da situação em que se encontram…

Sim, essa é a outra face. A primeira e a principal razão é o mau funcionamento da economia. A segunda razão é o mau funcionamento da máquina de apoio à pobreza, que está capturada pelos idosos, que são muitos e votam todos, e, portanto, conseguem aquilo que é a principal finalidade da política social portuguesa, que é aumentar as pensões. Nós temos um peso enorme nas prestações sociais das pensões, e essas estão boas. A descida da taxa de pobreza dos idosos foi extraordinária, foi um dos grandes sucessos.

 

Sim, aliás, foi comentado nesta série de entrevistas…

Exatamente, por causa disto, por razões diferentes. Mais uma vez, temos pensões baixas, mas comparadas com o último salário, são as mais altas não só da Europa, mas da OCDE. Temos mais do dobro da taxa de substituição, que é comparando a pensão com o salário anterior, mais do dobro de países ricos, como por exemplo os Estados Unidos, o Japão, a Suécia – países que têm menos pensões relativamente ao salário. Claro, mais uma vez, o problema são os salários baixos, voltamos à primeira questão. Mas relativamente à segunda questão, o que é extraordinário, a União Europeia publica estas coisas: o impacto das nossas transferências sociais – esqueçamos as pensões e vamos para as outras- o impacto que as transferências sociais têm sobre a taxa de pobreza é dos mais baixos.

 

A Comissão Europeia fala disso…

Exatamente, nós temos uma forma ineficiente de tratar os pobres, o que quer dizer que nós não gastamos pouco com os pobres, o dinheiro não vai é para eles, é capturado para o outro lado.

 

Estamos a gastar mal?

Estamos a gastar mal o dinheiro, exatamente.

 

Estes dados e esta aparente ineficácia nas medidas de combate à pobreza, significam que não estamos a seguir a melhor estratégia. E, por exemplo, em Portugal, dizia na introdução da nossa conversa, que em 2023 havia cerca de 13 mil pessoas a viver em situação de sem-abrigo, um aumento de 2300 casos em relação ao ano anterior. Isto é mais um sinal da ineficácia das estratégias, dos programas, ou a crise na habitação também justifica de alguma forma estes números?

Sim, a população sem-abrigo é uma pequena percentagem, se compararmos com os milhões de pobres que nós temos. E o problema resulta da mistura dessas duas coisas que afirmou. Por um lado, é uma manifestação da situação de pobreza, portanto as pessoas só estão naquela situação porque o sistema funciona mal, quer o sistema económico, quer o sistema de apoio aos pobres, mas também tem a ver com outra coisa, que aliás está a funcionar mal na generalidade dos países desenvolvidos, que é a questão da habitação. O mercado da habitação é um problema nos Estados Unidos, é um problema na Europa, é um problema em Portugal também. Está a funcionar mal, foi mal calibrado, tem a ver com várias coisas, e como sabe a última crise financeira, a grande crise financeira, teve a ver exatamente com casas de habitação. Tem a ver com isso, tem a ver com um problema mais estrutural, que em Portugal está mal pensado, está mal gerido. E tem a ver com todos os elementos, tem a ver com as Câmaras Municipais, que negoceiam terrenos para a construção, tem a ver com os bancos, que estão interessadíssimos em construção, e grande parte do seu crédito, não vai para as empresas, vai para a construção. Tem a ver com as construtoras, tem a ver com os mercados depois, onde é que há dinheiro e temos uma data de casas vazias. Portanto, é um problema estrutural, que não é fácil de mudar, não é com cosmética que nós lá chegamos. Isto está a funcionar mal para toda a gente, não é só para os pobres, quer dizer, temos pessoas ricas, mas que têm os filhos a viver em casa porque os filhos não arranjam casa, e, portanto, é um problema geral da sociedade portuguesa, que evidentemente depois cai, e como volto a dizer, numa pequena parte, mas talvez a mais visível, a mais escandalosa, da pobreza, que é aquela que está sem casa, sequer sem teto.

 

E nessa necessidade de mudança do sistema, transferir competências para o poder local ajuda ou a experiência mostra que não é nenhuma varinha mágica? 

Eu penso que não é uma varinha mágica. Tem algum efeito, e às vezes tem efeito positivo, depende muito da qualidade das câmaras, mas o problema aí é que as câmaras têm uma grande percentagem das suas receitas vindo desse lado; entregar o ouro ao bandido não é necessariamente uma boa ideia para resolver o problema do banco.

 

São múltiplos os apelos para que o combate à pobreza seja um desígnio nacional, até porque perante os números que conhecemos ninguém devia ficar indiferente. Estamos mais perto de considerar o combate à pobreza como um desígnio, ou Sr. Professor, falta ainda muito para lá chegarmos? 

Eu diria que, pôr assim o problema, é pô-lo mal, deixe-me dizer isto, mais uma vez uma coisa impopular, agora para o outro lado, só estou a dizer coisas impopulares, mas isto mostra porque o problema é grave, porque se as coisas que eu estou a dizer fossem populares o problema estava resolvido. Quer dizer, colocar a questão como o problema de combate à pobreza é já em si colocar a questão mal. Porquê? Porque o problema fundamental é o problema do crescimento da economia. A razão pela qual nós temos hoje, realmente, muito menos pobres do que tínhamos há 100 anos, não é porque o nosso combate à pobreza seja melhor do que há 100 anos, é porque nós estamos mais ricos do que há 100 anos.

A única maneira de resolver este problema é exatamente virarmos o país para o crescimento, para a desenvolvimento da economia. Não é qualquer crescimento, porque há muito crescimento que aumenta a pobreza, não é um crescimento pelo crescimento, tem de ser um crescimento que, por exemplo, envolva aquilo que são os ativos que os pobres têm mais, que é exatamente trabalho não especializado. Se nós tivermos um crescimento muito centrado na alta tecnologia, no final os pobres ficam na mesma, conseguimos uma riqueza, conseguimos umas start-ups e umas coisas que fazem imenso brilharetes, mas não conseguimos nada com os pobres.

 

Temos de introduzir a reindustrialização do país?

Não necessariamente, o problema provavelmente vai ser salvo pelos serviços, a indústria já deu o que tinha a dar. Provavelmente será nos serviços, e aliás grande parte das pessoas que estão a ganhar mais dinheiro e das pessoas que estão a ganhar menos dinheiro estão a trabalhar nos serviços. Portanto, provavelmente será nos serviços, e em vários níveis, não é só o turismo, o famigerado turismo, que também é muito importante e onde os pobres estão muito a trabalhar, mas também é um problema a vários níveis. Temos uma enorme quantidade de setores de serviço, do comércio à educação, da saúde, etc. e tem de se deixar a economia crescer, mas isso não é fácil, não é fácil. Porquê? Porque a economia está a ser estrangulada por uma enorme quantidade de pessoas, e volto a dizer, não são ladrões, não são corruptos, mas querem ganhar o seu imediatamente e com isso estrangulam uma coisa, que se deixassem crescer, depois até ganhariam mais. Se os sindicatos deixassem a economia crescer, tinham mais salários para os seus membros, não menos, mas eles não querem deixar e, portanto, têm de bloquear com uma enorme quantidade de restrições. A nossa lei laboral é das mais rígidas da Europa. Agora a Holanda saltou para a frente de nós, mas tirando a Holanda só estamos nós e a República Checa, penso eu. Temos uma legislação laboral das mais rígidas da Europa. Portanto os nossos trabalhadores têm imensos direitos, estão muito mais protegidos do que os outros países da Europa, que são muito mais ricos e muito mais felizes. Os trabalhadores dos outros países da Europa são muito mais ricos e muito mais felizes, têm muito menos direitos, precisamente porque esses direitos estão mal pensados. É a falácia mais antiga do governo que é, instituir uma coisa numa lei é conseguir essa coisa. Não, é exatamente o contrário.

 

O Papa Francisco disse algumas coisas que também não foram muito populares, talvez noutros meios, e uma delas é que esta economia mata. Como é que se explica a ideia da opção preferencial pelos pobres em linguagem não-teológica?

Primeiro, ele não disse que esta economia mata, ele disse a economia de exclusão e depois sim, esta economia mata, é importante esclarecer esse ponto. O Papa Francisco conheceu uma realidade dramática, que é a realidade da Argentina, a Argentina é o único país em vias de subdesenvolvimento, portanto é um país que está em queda brutal, como todos sabemos.

Veio para a Europa e talvez com surpresa para ele, encontrou as categorias que lá tinha apreendido reais aqui outra vez, o que é extraordinário é que embora a Europa seja objetivamente uma situação bastante diferente do que é a Argentina, as categorias que ele tinha de análise não chocam na Europa, porque a Europa tem outros tipos de problemas, tem pressões migratórias, por exemplo, na Argentina isso não existe, aqui existe. Essas pressões migratórias são uma grande percentagem da pobreza, grande parte dos pobres que nós temos, mesmo em Portugal, são migrantes, e, portanto, aparece um outro tipo de doenças sociais, e isso no fundo é que levanta a questão fundamental que o Papa Francisco tem repetido sucessivamente. O problema da pobreza não é um problema económico, não é um problema social, é propriamente um problema religioso.

 

De dignidade humana…

Exatamente. Ele está sempre a falar na idolatria do bezerro de ouro, da idolatria do dinheiro, é um problema religioso, é o ídolo que nós pomos no centro da nossa sociedade. E isto é que é o ponto. A razão por que “pobres sempre os tereis convosco”, como disse Nosso Senhor no Evangelho, é porque a pobreza vem do pecado, e o pecado, enquanto a gente estiver nesta terra, vai andar sempre por aí.

Já experimentámos todas as políticas sociais que podíamos imaginar, já experimentámos todos os sistemas económicos, não era assim há 100 anos, há 100 anos havia uma enorme quantidade de razões para que os pobres fossem pobres, porque não tínhamos experimentado essas coisas todas. Nos últimos 100 anos, experimentámos nos vários países, e continua a aparecer a pobreza, que renasce sucessivamente com novas formas. Aparece a droga, depois aparece o divórcio, depois aparece o desemprego, aparecem novas doenças que não existiam anteriormente, porque há 100 anos isto não existia, e que gera novas situações de pobreza. O que é que isto quer dizer? Quer dizer que a pobreza é uma coisa contra a qual nós devemos estar sempre a lutar, nunca desistir, mas nunca vamos conseguir erradicar, ela vai renascer de outra maneira. É como a doença, é como a violência, são coisas que nós, por mais que avancemos na sociedade, vamos ter sempre de ter a humildade de lutar contra elas. E o mito de que vamos resolver a pobreza, e erradicar a pobreza, é uma das piores doenças, porque desistimos, às tantas já não vale a pena, afinal não funciona. A preocupação com os pobres, a opção preferencial pelos pobres que o Papa Francisco repete sucessivamente, tem exatamente a ver com isto.

 

E o papel das instituições de solidariedade social têm, de alguma forma, combatido “esse pecado”?

Sim, claro, quer dizer, em primeiro lugar, a Igreja, que tem sido a instituição em Portugal que, ao longo dos séculos e hoje ainda, é a principal ajuda dos pobres. Depois é importante não esquecer um outro elemento muito importante, normalmente não é referido, que é, os principais ajudantes dos pobres são os pobres. ‘Ai dos pobres se não fossem os pobres’. Não são aqueles que falam sobre pobreza, nem são os ricos que salvam os pobres.

 

São solidários no terreno…

Exatamente, são aqueles que estão lá e sabem o que é a pobreza, porque um dos problemas que nós temos, daqueles que falam da pobreza, sobretudo nos gabinetes, é que estão a tratar uma pobreza que não existe. Não conhecem a verdadeira pobreza.

Gasta-se muito dinheiro para coisas que realmente não existem, passam ao lado. Por isso é que nós temos aquela despesa toda e depois no final a taxa da pobreza não desce. Portanto, não estão a perceber o problema. É preciso estar com eles, e a Igreja está com eles, e uma enorme quantidade das instituições, algumas delas que não são confessionais, estão também com eles. E tem sido muito importante, se não fosse isso, a situação seria muito pior. A pobreza em Portugal seria muito mais dramática e o desespero que nós temos numa enorme quantidade de pessoas, e em particular crianças e jovens, como já foi dito, seria muito mais dramático se não fosse assim.

 

Há um tema que lhe é muito querido, sobre o qual já escreveu muitas vezes. E estamos a 10 dias do Natal. Nós, como cristãos, celebramos o nascimento de Cristo num contexto que está, vou-lhe chamar assim, sequestrado pelos interesses comerciais. Há,  efetivamente neste anúncio, para muitas pessoas é o único anúncio que existe, que vai acontecer algo extraordinário nos próximos dias, também a possibilidade de uma mensagem?

Sim, porque essa é a realidade, o Natal desde o Natal, desde o primeiro Natal. Nós temos de olhar para o Natal com os mesmos olhos que Nossa Senhora, porque o Menino na altura não olhava, que Nossa Senhora olhava para esta situação.

A incompreensão de não haver lugar na hospedaria é a incompreensão que hoje encontramos nos centros comerciais, que encontramos em muitas consoadas e em muitas outras circunstâncias, e, no entanto, Ele nasce. O ponto é esse, o que faz a diferença, não é o nosso reconhecimento, o que faz a diferença é o facto de Ele nascer, de Ele insistir em nascer, também neste tempo, e é a confiança nele que nos salva. Não vale a pena estarmos aqui com coisas, nem ralhar aos outros, nem ralharmos a nós, mas simplesmente recolher aquilo que vem, e que vem mais uma vez este ano, como nos anos anteriores, para um mundo que não o compreende e que no final até o mata. A história não só começou mal, mas correu mal e acabou mal, e esse é o mistério do mal, e, no entanto, a Ressurreição a terceiro dia dá a vitória do bem. E, portanto, é essa a esperança a única coisa que nos pode salvar, e também é isso que nós temos de dizer aos pobres. O que falta principalmente, nas nossas políticas de pobreza, é dizer aos pobres que eles são bem-aventurados, é uma coisa que nós não dizemos. Estamos muito preocupados com os problemas, estamos muito preocupados com o dinheiro, e não lhes dizemos que são bem-aventurados. Se os pobres percebessem que são bem-aventurados, tudo o resto é necessário, não estou a dizer para não fazer, mas havia uma mudança no combate à pobreza, que é aquela mudança que o Evangelho trouxe, porque pobres já havia antes, e há depois, mas a diferença é esta: percebermos que só os pobres é que são bem-aventurados, que nós próprios temos de ser pobres, se quisermos ser bem-aventurados.

 

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Agência ECCLESIA

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