«O meu pai já esteve preso», dizia com orgulho Teresa Clímaco Leitão, quando andava na escola primária
Lisboa, 25 abr 2022 (Ecclesia) – José Leitão, presidente da direção do Centro de Reflexão Cristã (CRC) esteve preso antes da revolução de 1974 e lembra, com a sua filha, a participação dos católicos e da Igreja Católica na transição para a democracia.
“Ouvi em casa, devia ter 8, 9 anos que o meu pai tinha estado preso, em 69. Não percebi bem o que é que era, era uma coisa boa, ter estado preso era motivo de orgulho. E fui para a escola, andava na terceira classe, e disse muito orgulhosa, ‘o meu pai já esteve preso’”, recordou Teresa Clímaco Leitão, historiadora, em entrevista à Agência ECCLESIA.
A convidada sublinha que começou a “ouvir, muito pequenina” falar sobre o 25 de Abril, por causa do envolvimento do seu pai, José Leitão, nas lutas estudantis, por exemplo, e a sua afirmação na escola primária foi até um motivo para “a professora explicar porque é que tinha razões para estar orgulhosa”.
Teresa Clímaco Leitão acabou por se interessar, “cada vez mais, pelo que foi a transição para a democracia” em Portugal, também porque cresceu “a ouvir muitas histórias, do tempo em que não havia liberdade”.
Cresci num ambiente familiar em que sempre senti que havia uma luta e houve sempre uma luta pela democracia, não só em abril e durante o período revolucionário, mas toda a vida do meu pai foi uma luta, continua a ser uma luta e um alimentar pela democracia”.
A investigadora salienta que no ambiente familiar “foi sempre transmitida” a ideia de que “ser católico também é defender a liberdade”.
José Leitão, católico, membro fundador do Partido Socialista, esteve preso quanto era militante estudantil, em Coimbra, na altura da “greve estudantil de 1969”, e lembra que sentiu que “havia qualquer coisa que mexia”, com as lutas que vinham “de muitos democratas, de muita gente que foi presa, torturada, assassinada, por lutar pela democracia”.
“A luta começou naturalmente muito antes, há marcos importantes, o fim da II Guerra Mundial, e a esperança que houve em Portugal de se evoluir para a democracia. E aquela grande esperança, um marco fundamental na história portuguesa, que foram as eleições de Humberto Delgado [1958]. Essas eleições marcaram muito e assinalaram uma rotura de um grupo muito significativo de católicos com o regime salazarista”, desenvolveu, numa entrevista emitida hoje no Programa ECCLESIA (RTP2).
O atual presidente da Direção do CRC destaca que sempre existiram católicos “que se opuseram ao Estado Novo”, padres e leigos, que foram expulsos ou estiveram, como o padre Joaquim Alves Correia ou Manuel Serra, da Juventude Operária Católica (JOC).
Teresa Clímaco Leitão, que se tem dedicado ao estudo da Igreja Católica na transição para a democracia, acrescenta que nos anos da revolução, se encontram “leigos católicos empenhados em partidos de todo o espectro político, da esquerda à direita”, mesmo como dirigentes partidários e que “assumiam a sua identidade como católicos, e foram protagonistas na luta pela democracia representativa”.
A historiadora lembra também que a Igreja “defendeu que os católicos fossem votar”, apelando ao recenseamento e publicando uma nota em defesa do direito à liberdade sindical, em janeiro de 1975; Mário Soares, no ‘verão quente’ desse ano, pediu “o apoio da Igreja para mobilizar os católicos para as manifestações em defesa da democracia representativa”.
José Leitão salienta que hoje continuam a existir “muitos católicos empenhados em diferentes partidos políticos”, uma representação variada e diversificada que “faz parte da cultura portuguesa política”.
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