Porto: Homilia da Celebração da Paixão do Senhor

Irmãos e Irmãs,

1.Nesta tarde de Sexta-Feira Santa tem redobrado sentido olhar para a Cruz de Cristo.

Ao olhar para a Cruz não estamos sós. Connosco, de olhar fixo no Crucificado, estão todos os que sofrem.

Se olharmos, também nós, o mundo a partir da Cruz de Cristo veremos que se ampliam os sentimentos do nosso coração e se alarga o nosso campo de visão. Na Cruz, a Humanidade deixa de ser vítima do pecado e da morte para iniciar a partir de Cristo e com Ele a sua própria história da salvação fascinado pelo valor incondicional e sagrado da vida e pela certeza inabalável da ressurreição.

Quando a Cruz pesa sobre alguém, todos nós somos necessários e imprescindíveis como cireneus, mesmo que a nossa ajuda pareça insignificante perante a imensidão da dor. Assim compreendemos que Jesus não esteve só no caminho da Cruz. Com Ele fizeram caminho também o Cireneu, a Verónica, as mulheres de Jerusalém, o discípulo João e sobretudo a Mãe de Jesus. A Mãe é sempre quem melhor compreende o mistério da dor e mais alivia o peso da cruz.

O caminho do Calvário de todos os que sofrem não prescinde, também hoje, de cireneus que partilhem a dor e que reparem a humilhação, o desprezo, a indiferença, a injustiça, o luto e a miséria que são em todos os tempos da história angustiantes e demolidoras experiências de sofrimento e de cruz.

2.A narração da paixão, agora proclamada, diz-nos que no auge da crucifixão, Jesus revela, pelas palavras que se lhes soltam do coração, a sua doação obediente até à morte e a dimensão infinita do seu amor pela Humanidade.

Um condenado, ali crucificado a seu lado, implorou de Jesus que se lembrasse dele quando estivesse no seu reino. (Lc. 23, 42). A reacção de Jesus foi acolhê-lo de imediato, sem cláusulas nem condições: “Hoje mesmo entrarás no Paraíso” (Lc. 23, 43).

A Humanidade sempre recorreu a Deus. E sempre O procurou. Mesmo que seja por caminhos estranhos, veredas silenciosas ou periferias ignoradas ou desconhecidas.

E a última palavra, surpreendentemente serena e confiante, é esta: “Pai nas tuas mãos entrego O meu Espírito” Lc 23, 46).

É a manifestação de que tudo está cumprido. A Humanidade está salva. Está restabelecida a Aliança nova entre o Senhor e o Seu Povo, reaberto o diálogo entre Criador e a Criação e restabelecido o amor entre Deus e a Humanidade.

3.Nesta tarde de Sexta-Feira Santa, queremos continuar, dois mil anos depois, a olhar o Crucificado e a rezar-Lhe: Quando vires, Senhor, pobres na nossa cidade, gente sem pão nem abrigo, sem mesa e sem lar nas nossas terras…

…Faz que as nossas portas se abram, as nossas mãos se estendam e o nosso pão se reparta. Quando encontrares, Senhor, multidões sem rumo e sem rosto, jovens sem horizonte e sem projectos, braços sem trabalho e sem emprego…

…Faz que as nossas ruas ganhem vida com pessoas felizes, o nosso futuro recupere encanto e a terra que pisamos nos ofereça alegria, trabalho e esperança. Quando sentires, Senhor, lágrimas tristes e magoadas de crianças sem família, sem escola ou sem terra ou de idosos, irmãos gémeos da solidão, do desânimo e do abandono…

… Faz que a vida seja defendida e respeitada, como direito sagrado e valor eterno, as famílias cresçam em amor e em paz e os idosos e doentes recebam em presença, afecto e respeito o que nos dão em sabedoria, exemplo e bênção.

Quando souberes, Senhor, que há Calvários levantados em lugares de gente abandonada e inocente, cruzes de dor erguidas em holocaustos de sofrimento e corações rasgados em momentos de abandono…

… Faz que encontremos coragem humana, decisão crente e determinação evangélica para percorrer caminhos com os que sofrem e partilhar as dores dos irmãos sem ninguém.

Quando ouvires, Senhor, orações de súplica, de gratidão e cânticos de louvor cristão em comunidades vivas de fé, de entusiasmo e de comunhão…

… Faz que a vida, a fé, a esperança, a caridade e a missão desta amada Igreja do Porto se centrem sempre em Ti e irradiem para o Mundo a partir de Ti, Senhor Jesus.

Igreja Catedral do Porto, 18 de Abril de 2014

António, Bispo do Porto

 

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