«Vem alterar, substancialmente, toda uma história que parecia monolítica e sempre segura de que era tudo 100% católico», afirmou o padre Agostinho Jardim Moreira

Porto, 29 out 2025 (Ecclesia) – A ‘Carta das Religiões do Porto’, da autarquia portuense sobre a presença religiosa na cidade, identificou 135 locais de culto e nove tradições, para o presidente da Comissão Diocesana para o Diálogo Inter-Religioso “é importante” terem “consciência da diversidade”.
“É importante termos consciência da diversidade, da presença de religiões ou de tradições religiosas no Porto, que vem alterar, substancialmente, toda uma história que parecia monolítica, e sempre segura, de que era tudo 100% católico”, disse o padre Agostinho Jardim Moreira, esta quarta-feira, 29 de outubro, em declarações à Agência ECCLESIA.
O sacerdote acrescenta que com a chegada de novas comunidades tudo se vai alterando, e com as religiões não-cristãs tornou-se “ainda mais notórias”, por isso, é importante perceber e conhecer esta realidade, ter “um diagnóstico correto”, para poderem equacionar “todo um trabalho nesta área do diálogo inter-religioso”.
Segundo o Município do Porto, esta ‘Carta das Religiões’ surge da necessidade de “compreender as dinâmicas sociais e culturais da cidade, contribuindo para uma maior perceção sobre a diversidade religiosa”, e o papel que estas comunidades desempenham na vida urbana; no mapeamento, realizado em 2025, identificaram 135 locais de culto, agrupados em nove grandes grupos ou tradições: Cristianismo; Islamismo; Judaísmo; Fé Bahá’í; Hinduísmo; Budismo; Siquismo; Tradições Japonesas; e Doutrinas Espiritualistas.
O presidente da Comissão Diocesana para o Diálogo Inter-Religioso do Porto adianta que têm “conhecimento desta diversidade, se calhar não tão minuciosa”, e tem acompanhado também esse trabalho no sentido de partilharem “os conhecimentos e as oportunidades de trabalho em rede”.
Neste contexto, o padre Agostinho Jardim Moreira lembra a constituição de “uma equipa, de uma comissão de diálogo inter-religioso”, com judeus, muçulmanos, bahá’is, Hare Krishna, budistas, hinduístas e mórmons, e acrescenta que não incluem, por exemplo, “o espiritismo dentro de uma religião, nem o ioga, nem coisas parecidas”.
A ‘Carta das Religiões do Porto’, do município portuense, apresenta uma pesquisa que vai para além da identificação do local de culto, dos espaços, moradas e contactos, horários, os limites, responsáveis e números de voluntários, mas também as atividades e vida social, atividades de apoio social, atividades de ensino religioso.
“Nós acolhemos a ‘carta’ com muito interesse, porque é um elemento importante de informação e para podermos depois também equacionar a participação de todos neste grupo, onde se possam integrar no sentido de criarmos entre nós espíritos de tolerância, de respeito e de convivência pacífica”, acrescentou o entrevistado.
O documento, com mais de 480 páginas, indica que uma das “conclusões mais relevantes deste levantamento” foi compreender que muitas destas comunidades religiosas “desempenham um papel crucial no acolhimento e integração dos migrantes”, assumem, frequentemente, o papel de primeira “família” das pessoas migrantes na cidade.
Sobre este trabalho das religiões com os migrantes, o padre Agostinho Jardim Moreira observa que essa resposta “torna-se pouco clara na prática”, dando o exemplo de pessoas, “particularmente de Bangladesh ou do Nepal”, que fazem outra rede de apoio, “alugando uma casa de comércio e, a troco de uma mensalidade, permitem que seja dada a residência para ter acesso aos documentos”.
“Não sabemos bem, não percebemos, há aqui um controlo, há uma prepotência sobre estes senhores e estas senhoras que nos escapa ainda, há um domínio, uma exploração qualquer”, desenvolveu o pároco de São Nicolau e Vitória, na zona histórica do Porto.

O sacerdote observa que a língua é umas barreiras neste estabelecer relações pessoais, mas, a nível das chefias, estão “a reunir”, com encontros mensais, e trabalham bem, como esta segunda-feira onde reuniram com o foco na solidariedade, e foi “muito interessante aquilo que une pelo amor, o amor fraterno, o amor a Deus, e criou-se ali um dinamismo de amizade e de partilha muito grande entre todos”.
A ‘Carta das Religiões’, da cidade do Porto, nas considerações finais, assinala que no “contexto de crescente diversidade religiosa”, o protestantismo tem “vindo a ganhar um papel de destaque, especialmente com o crescimento das comunidades evangélicas e pentecostais”, o surgimento de novas comunidades evangélicas, “compostas por uma população jovem e ativa, tem contrastado com as comunidades católicas”.
Para o padre Agostinho Jardim Moreira, os católicos “estão muito acomodados, são católicos de bancada”, o argumento de serem uma comunidade envelhecida “não vale”, lamentando “a indiferença dos cristãos católicos diante da sua fé e diante da sua postura na vida e na sociedade”, porque “uma fé tradicionalista e uma fé apenas de ritos, facilmente se torna insegura”.
“Só acho que isto é um desafio enorme. Eu penso que o clero e os cristãos mais responsáveis nas suas comunidades devem despertar para esta realidade para podermos ser, de facto, transformadora nesta sociedade, porque de outra forma as coisas podem complicar-se”, concluiu o presidente da Comissão Diocesana para o Diálogo Inter-Religioso do Porto.
A ‘Carta das Religiões’ do Município do Porto foi uma colaboração realizada através do Departamento Municipal de Coesão Social com a área de Ciência das Religiões da Universidade Lusófona.
Em 2024, a Comissão para o Diálogo Inter-religioso do Porto publicou uma ‘Carta de Princípios’, “unindo as religiões na construção da fraternidade humana”, e que pretende “instituir os princípios orientadores que servem de base à constituição de uma comissão para o diálogo inter-religioso”, uma iniciativa do bispo do Porto, que foi divulgada no dia 1 de março.
CB/OC
