Pobreza/Portugal: Investigadora lamenta falta de dados sobre apoios sociais e critica políticas feitas «sem factos»

Maria d’Oliveira Martins sublinha que «há muito a fazer» no combate à pobreza

Foto: Beatriz Pereira/RR

Lisboa, 14 dez 2025 (Ecclesia) – A jurista Maria d’Oliveira Martins alertou para a ausência de estudos em Portugal sobre quem não recorre às prestações sociais a que tem direito, criticando a produção de anúncios políticos “sem factos”.

Em entrevista conjunta à Renascença e à Agência ECCLESIA, emitida este domingo, a especialista em Direito Constitucional lamentou que, ao contrário de países como a Alemanha, França ou Inglaterra, o Estado português desconheça a dimensão do “não recurso” aos apoios.

“Nós não temos sequer esse dado em Portugal. Eu não sei se são 40%, se são 50%, se são 30%, eu não sei”, afirmou a investigadora, referindo-se à percentagem de pessoas que, podendo ter acesso a prestações mínimas, acabam por não as solicitar.

A autora do livro ‘Direito a não ser pobre. Uma perspetiva jurídico-constitucional e de direitos humanos acerca da luta contra a pobreza’ foi perentória ao identificar uma falha na governação.

“Nós permitimos que haja politicamente anúncios sobre medidas sociais, sobre prestações sociais, sem factos”, alertou.

Para Maria d’Oliveira Martins, falta “um relatório que acompanhe a execução” das medidas, que esclareça “quantas pessoas foram beneficiadas” e “quantas pessoas não pediram”.

A docente da Universidade Católica sugeriu que o estudo rigoroso desta realidade, já aflorada pela Provedoria de Justiça, seria “uma das medidas que poderia avançar já”.

Confrontada com a recente distinção de Portugal como “economia do ano” pela revista ‘The Economist’, num momento em que antigos dirigentes sindicais apelam à greve geral, a membro da Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) falou num desfasamento real.

“Eu acho que, relativamente à luta contra a pobreza, não estamos a fazer tudo o que é possível. Há ainda muito para fazer”, declarou.

Maria d’Oliveira Martins defendeu que o combate à miséria deveria ser assumido como um “desígnio nacional”, pois a pobreza extrema representa a “denegação da dignidade humana”.

“Trata-se de colocar pessoas em situação de ausência de liberdade, numa situação em que estão condicionadas pelas suas necessidades e veem toda a sua vida condicionada por isso mesmo”, explicou.

A jurista criticou ainda a visão assistencialista que persiste em Portugal, onde o apoio aos mais vulneráveis é muitas vezes encarado numa lógica de “emergência” e não de direitos estruturais.

Sobre a questão dos imigrantes e da sua condição económica, a entrevistada sublinhou que os direitos fundamentais não podem depender da nacionalidade.

“Os direitos humanos são universais e, portanto, aplicam-se a qualquer pessoa, independentemente da sua nacionalidade, da sua origem”, concluiu.

Ângela Roque (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)

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