Pemba e Braga: tão longe e tão perto

Trabalho missionário na Diocese moçambicana durou cerca de dois anos A poucos dias da realização do Simpósio do Clero (de 5 a 8 de Setembro), em Fátima, os padres Jorge Barbosa e João Miguel Campos abrem pistas para um eventual debate sobre a acção pastoral que muitas dioceses portuguesas têm adoptado. Enviados em 2004 pela Arquidiocese de Braga para missões na Diocese de Pemba, em Moçambique, os sacerdotes assumiram em Novembro do ano passado as paróquias de São Paio de Arcos, Esporões, Guizande, Tadim e Priscos e, de forma descomplexada, reportam-se aos desafios que as comunidades bracarenses têm que enfrentar para suprirem a escassez de presbíteros, que, «para já, ainda não se faz sentir». Para estes clérigos, «se a Igreja quiser ter um futuro mais risonho terá que perceber que só se pode realizar um bom trabalho pastoral se um presbítero estiver inserido numa comunidade com outros presbíteros». O padre Jorge Barbosa refere mesmo que «a questão não passa pela partilha da mesma casa. O problema reside na partilha de trabalho». «De forma geral, os padres têm alguma dificuldade em trabalhar em equipa. Duplicamos ou triplicamos tarefas e esforços. No fundo, andamos todos a fazer o mesmo. Essa é a maior “ferida”», sustenta o sacerdote. De acordo com o padre João Manuel Campos, «em África este aspecto é mais fácil de resolver porque existem menos presbíteros. A quantidade [de padres] nem sempre facilita uma boa evangelização. Se uma empresa tiver gestores a mais, pode começar a ter prejuízos. Se tiver os gestores certos, que trabalhem em equipa, é mais fácil. Quando um responsável está a prestar um mau serviço, também está a prejudicar a organização. Porém, muitos sacerdotes não têm esta perspectiva, devido à estrutura que continuam a alimentar». Sem pretender «comparar o incomparável», o sacerdote bracarense explica que «no continente africano, se uma pessoa não se baptiza na sua paróquia de origem, é impensável que seja baptizada noutra. As comunidades estão de tal forma estruturadas, que isso é impensável. Em Portugal, se um padre não pode prestar um determinado serviço, as pessoas arranjam outro. A expressão “arranje um padre” é pobre!» Por outro lado, estes dois jovens sacerdotes defendem que, «mais do que o “profissionalismo” dos padres, seria necessário trabalhar o sentimento de pertença entre os clérigos», «capaz de combater a tentação individualista na qual as comunidades se acabam por rever». «O bairrismo é típico de muitas sociedades, mas os padres devem compreender que se está a atingir o limite: temos vindo a manter o mesmo esquema pastoral há vários anos e assistimos a uma diminuição substancial de sacerdotes. Falta ousadia e continuamos a manter uma Igreja que “vende serviços avulso”: se alguém pretende uma celebração do baptismo consegue-o fora da vida da comunidade. Isso vai contra toda a teologia do Baptismo. A comunidade tem que celebrar a alegria dos seus membros e, infelizmente, isso só se resolve com a falta de padres. As pessoas têm que sentir a escassez de padres para mudar esta mentalidade. Isto só se resolverá se as pessoas cultivarem o sentido de pertença», afirmam convictamente os sacerdotes bracarenses, que, de forme despretensiosa, garantem que, «em África, o Evangelho é muito “caro”. Porém, dá a sensação de que noutros lugares está a “saldo”. No continente africano é muito difícil ser-se cristão. Os pais têm que ter sentido de pertença a uma comunidade». «Não podemos estar permanentemente à espera que a Igreja nos possa dar alguma coisa. Em Moçambique, os cristãos estão sempre à espera de dar algo à igreja, porque se sentem Igreja. Quando um muçulmano está a dialogar com um cristão, pergunta-lhe o seguinte “Como é que está a tua Igreja?” O cristão sente isso de forma profunda», explicam. Para os sacerdotes, «a região Norte do país está demasiadamente bem habituada à presença do pároco ». «A fartura estraga muitas pessoas», referem os clérigos, que, abordando uma problemática que só está ao alcance de quem já sentiu na pele a escassez de celebrações, acabam por fazer um reparo à quantidade de celebrações eucarísticas que se realizam só na cidade de Braga. «Celebrei Eucaristia em determinadas comunidades onde já não havia missa há 30 anos», conta padre João Miguel Campos, que, no entanto, prefere enveredar por um discurso optimista em relação ao futuro das comunidades minhotas e destaca «a coragem do Arcebispo Primaz, D. Jorge Ortiga», «que aceitou o repto» e enviou os sacerdotes em missão para Pemba quando estes se ordenaram. «Aveiro deve ser a Diocese do país que melhor está a trabalhar nesta vertente. A Diocese não está à espera que os Institutos Religiosos tomem a iniciativa de enviar agentes de pastoral. Mas a própria Diocese aveirense envia anualmente leigos ou padres missionários e responsabiliza- se por eles a nível financeiro, para que todos se sintam co-responsáveis e representados na missão. Espanha e a Itália fazem isto há dezenas de anos com a maior naturalidade», explicam os sacerdotes minhotos, que vêem na partida de leigos missionários para outros continentes «uma das manifestações mais eloquentes e grandiosas do Espírito Santo na Igreja em Portugal».

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