Responsável pela Comissão diocesana dos Bens Culturais constata a existência de «espírito auto-didacta que por vezes é demolidor»
Santarém, 19 Jan (Ecclesia) – Limpar imagens religiosas recorrendo a detergentes abrasivos ou ao vinho branco misturado com água são alguns dos processos de conservação do património que a Igreja Católica quer erradicar.
“As pessoas vão fazendo como ouviram dizer”, lamenta o director da Comissão para os Bens Culturais da Igreja da diocese de Santarém, padre Joaquim Ganhão, que salienta a necessidade de formação mesmo para executar operações “simples”.
A limpeza de “um chão em pedra antiga”, a atenção às alfaias litúrgicas, “especialmente quando têm metais preciosos”, ou a dobragem e acondicionamento de um paramento “são operações que, à partida, uma senhora acha que sabe fazer bem”.
No entanto, “nestas coisas da arte ligada à liturgia há um certo espírito auto-didacta que por vezes é demolidor”, adverte o sacerdote, dando como exemplo o costume “de lavar as imagens com vinho branco e água” antes das procissões.
Sem saberem que estão a estragar em vez de preservar, há zeladores que “utilizam detergentes abrasivos para limpar imagens com estofo ou talha dourada, e passado uns tempos começam a ver que já não está lá nem o ouro, nem o estofado nem os outros elementos da peça”, conta o responsável.
“Hoje há uma orientação para que não se meta o património nas mãos de curiosos, mas que se entregue a pessoas formadas”, uma regra frequentemente ignorada: “Quer os padres quer os leigos são por vezes demasiado convencidos que está tudo no bom caminho, quando não está”, sublinha.
O sacerdote ressalta que há indicações “muito concretas por parte do bispo diocesano no sentido de não se fazerem obras nem restauros sem o parecer da Comissão para os Bens Culturais”, o que tem sido “relativamente bem acolhido por quase todos”, embora “ainda subsista uma cultura muito paroquial em relação a esta matéria”.
Por isso, a principal dificuldade daquele departamento tem sido “sensibilizar as comunidades e os párocos para as boas práticas”, embora o responsável saliente que “já há um caminho muito positivo e que é promissor”.
A 3.ª Jornada para os Bens Culturais da diocese de Santarém, que decorreu no último Sábado em Torres Novas com a presença de 60 pessoas, pretendeu proporcionar a aprendizagem de boas práticas e de procedimentos de conservação preventiva.
O bispo de Santarém, D. Manuel Pelino, interveio no início da sessão, tendo feito uma “apresentação muito interessante” sobre os bens culturais como manifestação de Deus, referindo-se também à dimensão evangelizadora dos bens culturais da Igreja, descreveu o sacerdote.
O padre Joaquim Ganhão sublinha que a diocese nunca “perde de vista o horizonte para o qual o património religioso foi criado”, isto é, a sua dimensão evangelizadora, que se mantém mesmo quando as obras estão integradas num museu.
“Há a tentação de reduzir o património a uma coisa antiga muito interessante. Mas cada peça tem uma leitura crente que esteve na sua origem e que continuamos a preservar e a valorizar, no sentido de fruirmos a mensagem que ela tem para nos transmitir hoje e que queremos continuar a propor aos nossos contemporâneos”, frisa o responsável.
O sacerdote destaca a “aposta da diocese na procura de pessoas qualificadas”, e os protocolos com a Universidade Nova e o Instituto Politécnico de Tomar, entidade com quem a Igreja tem mantido uma “relação extraordinária, fecunda e feliz”.
RM