A Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) considera que as próximas eleições legislativas são o momento certo para que os cristãos do nosso país assumam as suas responsabilidades individuais na vida política. Num contexto de crise política, derivada da dissolução da Assembleia da Repúblicas e consequente demissão do Governo, o acto eleitoral de 20 de Fevereiro motivou um comunicado da CNJP, intitulado “Propor a esperança, abrir as portas a um futuro melhor”. A iniciativa foi considerada pelo presidente do organismo, Armando Sales Luís, como correspondente a “uma sensação de necessidade” de intervir nesta área. Chama a atenção, desde logo, a opção por falar de “esperança” num contexto que todos classificam de crise. Jorge Wemans, secretário da CNJP, liga esta decisão à nota do Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), do passado dia 14 de Dezembro, sobre a actual situação política. Em consonância com os Bispos do nosso país, a CNJP apela à participação de todos e critica as atitudes de “desânimo e pessimismo” em relação ao futuro. Assim, para a Comissão, “todos temos o dever de dar testemunho das razões de esperança que existem, visíveis na quantidade de pessoas que em Portugal se dedicam, de uma forma activa e generosa, ao bem comum”. Manuela Silva, vice-presidente do organismo, classifica este comunicado como “um olhar atento sobre as circunstâncias concretas do país”. A intenção é que o próximo acto eleitoral não seja apenas mais um exercício de voto partidário, mas uma ocasião para uma participação mais activa e responsável de toda a sociedade. Os cristãos são desafiados a responder ao convite formulado pelos Bispos portugueses na sua Nota Pastoral: “empenhar-se na construção da comunidade nacional é, para os cristãos, uma forma de exprimirem a sua fidelidade cristã”. “A participação de todos e de cada um é necessária”, sublinha o comunicado da CNJP. “O momento que vivemos precisa das vozes da esperança, precisa dos gestos que se pautam pelo fazer bem, precisa de corações que acarinhem sonhos de dias melhores e que os partilhem com os demais, precisa de muito investimento nas pessoas e de muita dedicação ao bem comum, precisa da cooperação como principal trampolim para a melhoria da nossa vida colectiva, precisa de cada uma e de cada um”, acrescenta o documento. Compromisso cristão Apelando ao compromisso dos cristãos na vida política, a CNJP refere que “mais do que nunca, neste próximo mês, os cristãos deste país são chamados a serem testemunhas da esperança que abre as portas de um futuro melhor para todos”. Aos portugueses é recordado que “não há cidadãos dispensáveis, dentro e fora dos partidos políticos, quando se trata de criar uma comunidade nacional solidária, desenvolvida, apta a enfrentar com esperança os tão incertos dias que se avizinham”. Neste sentido, a CNJP faz um apelo à participação de todos, considerando que “não há nenhuma razão para que as pessoas não se envolvam no processo eleitoral”. Os responsáveis deste organismo eclesial lamentam, aliás, que entre alguns cristãos subsista uma posição de distanciamento em relação ao acto eleitoral. “As eleições legislativas são um momento particularmente importante da vida democrática. Todos temos o dever de as encarar seriamente. Sem falsos messianismos – esperando que alguém se proponha resolver todos os nossos problemas –, nem fácil cinismo – argumentando que “é tudo a mesma coisa”. Ambas as posições são modos subtis de fugirmos à nossa responsabilidade individual e de recusarmos tomar consciência das relações entre o modo como vivemos, as escolhas que fazemos no nosso dia-a-dia e as prioridades que queremos ver inscritas na condução dos assuntos públicos”, pode ler-se. Nesta próxima etapa da vida do país, as comunidades católicas têm um papel a desempenhar na discussão de propostas políticas, aproveitando as redes que se estabelecem no seu interior para debaterem estas questões. Alfredo Bruto da Costa, outro dos vice-presidentes da CNJP, insistiu na responsabilidades dos católicos na vida política, a partir de “um entendimento do ser cristão que implica a intervenção activa na construção do mundo”. O alerta está presente no documento agora apresentado. “Não há verdadeiro amor cristão que se possa alhear das escolhas que determinam boa parte do nosso viver em comum. Ninguém se respeita a si próprio se nega o seu labor diário por uma sociedade mais justa e mais fraterna, ao não participar nos momentos em que se escolhem os programas e as pessoas que vão presidir, nos próximos anos, à gestão da coisa pública”. Campanha de verdade A CNJP considera que a campanha para as eleições legislativas de 20 de Fevereiro deve ser uma oportunidade para debater seriamente os problemas do país, fugindo à demagogia e a falsas promessas. “Sem apresentação clarificadora do que consideram ser os principais problemas e as maiores potencialidades do país, sem propostas para enfrentarem uns e reforçarem outras, a campanha eleitoral pode reduzir-se a simples habilidades de comunicação, determinando maior afastamento dos cidadãos em relação aos seus eleitos”, alerta o comunicado. Para o futuro do país, será essencial multiplicar “gestos concretos de solidariedade e de compromisso com os mais pobres, de envolvimento na inovação, em muitos locais de trabalho e de vida, de melhoria permanente das condições da existência e de promoção da dignidade humana, no funcionamento das instituições públicas e privadas”. A CNJP insiste na necessidade de “reforçar a exigência de qualidade no debate partidário, sublinhar a necessária participação de todos e dar razões da nossa esperança quanto ao futuro do país”. “Também nós somos testemunhas de que, apesar de um clima de pessimismo que parece querer instalar-se, encontramos pessoas disponíveis, interessadas em melhorar as condições de vida dos cidadãos, o modo de gerir as suas empresas e de aplicar os seus rendimentos, de aperfeiçoar as relações de trabalho e as relações interpessoais. Em todos os ambientes encontramos pessoas construtoras permanentes e persistentes do bem comum”, aponta. “Precisamos de criar dispositivos de valorização e de incentivo público a todos e cada um dos portugueses e portuguesas que assim agem. Dispositivos que podem ser muito diversos, mas que se deveriam nortear pela partilha do que de mais positivo se faz e se alcança, pela valorização do trabalho perseverante que tantos desenvolvem em prol de uma sociedade mais justa e fraterna, pela comunicação da esperança que tantos desencadeiam em tantos rostos angustiados e esquecidos”, acrescenta a CNJP. A Comissão pede uma mobilização para o voto, convocando todos, portuguesas e portuguesas, “a encontrar uma forma de participar no próximo acto eleitoral, afirmando um direito e um dever cívico, no respeito que as pessoas devem ter por si próprias”. A CNJP foi criada há 20 anos pela CEP e é um organismo laical, com a finalidade genérica de promover e defender os ideais da Justiça e da Paz à luz do Evangelho e da Doutrina Social da Igreja. A Comissão actua sob a sua própria responsabilidade, não vinculando necessariamente a hierarquia.
