Paquistão: Cristãos reclamam justiça, um ano após ataque em Jaranwala

Dezenas de igrejas e casas foram destruídas nos episódios de violência de 16 de agosto de 2023, que continua hoje a instalar o medo entre a população

Foto: ACN

Lisboa, 21 ago 2024 (Ecclesia) – Os cristãos no Paquistão vivem em clima de medo e apelam por justiça, um ano depois de radicais muçulmanos desencadearem um ataque em Jaranwala, no distrito de Faisalabad, que resultou na destruição de 26 igrejas e 85 casas.

“As pessoas estão assustadas e desesperadas porque até agora não lhes foi feita justiça. Algumas pessoas estão com raiva e querem protestar. Exigem que atuemos para que a justiça seja feita, mas o que podemos fazer? Somente o governo pode fazer justiça. A maioria dos culpados está em liberdade sob fiança, o que perturba a comunidade”, afirmou o bispo de Faisalabad, D. Indrias Rehmat, em declarações à Fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS).

De acordo com clérigos proeminentes da diocese católica de Faisalabad, os serviços de segurança alertaram os cristãos em Jaranwala para que não realizassem eventos ao ar livre assinalando o primeiro aniversário da agressão.

Em 77 anos de história do país, nunca tinha ocorrido um incidente com tanta gravidade relacionado com a comunidade cristã; atualmente, a situação permanece instável, com os responsáveis a não terem sido responsabilizados pelo ataque.

O padre Yaqub Yousif, pároco de Jaranwala, garante que “as pessoas estão perturbadas pela falta de justiça e sentem-se inseguras”.

“Se as instituições responsáveis pela aplicação da justiça não podem ajudar, o que podem fazer as pessoas, enquanto minorias fracas?”, questiona, acrescentando: “eles estão com medo”.

Apenas cinco das 305 pessoas foram presas após os episódios de violência de 16 de Agosto de 2023 permanecem atrás das grades, informam os últimos relatórios da Comissão Nacional de Justiça e Paz da Igreja Católica do Paquistão.

Ehsan Shan, um jovem cristão que cumpre pena de prisão perpétua por blasfémia após ter sido considerado culpado por ter partilhado uma imagem do livro do Alcorão profanado nas redes sociais, incidente que desencadeou toda a violência em Jaranwala, é a única pessoa condenada.

“Gostaria de deixar claro que nós, cristãos, nunca pensamos em desrespeitar o Alcorão ou o profeta e não veríamos absolutamente nenhum valor em atos de profanação”, referiu o padre Yousif.

Cerca de 17 das 25 queixas apresentadas em relação aos incidentes de Jaranwala foram registadas por cristãos, apesar de, segundo o sacerdote, os fiéis terem gradualmente retirando as acusações face às ameaças violentas.

“Não se fez justiça nos últimos 12 meses. Os verdadeiros culpados deveriam ter sido condenados, mas não foi o caso. O governo tem sido muito fraco. Tem medo de agir. Cada vez mais temos a sensação de que o governo não pode fazer nada. A comunidade cristã tende cada vez mais a fechar-se em si mesma e a querer sair do país…”, lamentou o padre Boniface Mendes, sacerdote sénior da Diocese de Faisalabad.

O diretor executivo da Comissão Nacional de Justiça e Paz, Naeem Youssif Gill, alerta para a necessidade de implementação efetiva da lei, salientando que “a justiça deve ser realizada num espírito de retidão, igualdade e baseado na lei”.

“Medidas como a de acabar com as provocações nos altifalantes [das mesquitas], de proibir grupos extremistas e de confiscar literatura de ódio devem ser intensificadas e avaliadas, e o seu sucesso deve ser assegurado”, sublinhou.

A AIS informa que apesar da rápida ação do governo paquistanês para compensar as pessoas afetadas pelos ataques, apenas 26 das 86 casas danificadas nos ataques foram reabilitadas, segundo a Comissão Nacional de Justiça e Paz.

Além disso, o processo de recuperação das habitações está debaixo de críticas, nomeadamente do bispo de Faisalabad, que terá mandado suspender as reparações nas igrejas, obras patrocinadas pelo governo, alegando que os empreiteiros estavam a fazer um trabalho deficiente, nomeadamente ao nível dos telhados, deixando os edifícios inseguros, adianta a fundação pontifícia.

Após os ataques do ano passado, a Fundação AIS avançou logo, a nível internacional, com um pacote de ajuda de emergência para as 464 famílias mais atingidas, que incluiu primeiros socorros mas também apoio, por exemplo, para a reparação dos danos causados nas habitações e ainda a aquisição de veículos.

LJ/OC

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