Padres não são gestores de empresas

Patriarca de Lisboa deixa alertas no VI Simpósio do Clero e pede que a Igreja seja um «todo»

O Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, alertou que “é preciso redescobrir o Concílio e o seu desafio de estar atento aos sinais que, apesar de tudo, nos vêm do seio desse mundo que mudou, a sugerirem o verdadeiro rosto da Igreja nesta nova etapa da missão”. E acrescenta: “Não se evangeliza esse mundo identificando-nos com ele e cedendo aos seus critérios, nem propondo-lhe formas de ser que já não o interpelam”.

No VI Simpósio do Clero de Portugal, a decorrer em Fátima até à próxima Sexta-Feira (4 de Setembro) e subordinado ao tema «Reaviva o dom que há em ti», D. José Policarpo realça também que a comunhão eclesial é fundamental na Igreja. “Enquanto houver alguns, bispos e padres, que se consideram com o direito de decidir pela sua cabeça, os caminhos de pastoral, o sentido da existência moral, a maneira de celebrar, estamos a fragilizar a proposta cristã, num mundo que saberá aproveitar, com os seus critérios, as nossas divisões. A Igreja é hoje um todo global, perante um mundo globalizado”.

Depois de tanta mudança nos últimos anos, no mundo actual, o futuro da Igreja “ultrapassa as capacidades de visão e de decisão de cada um de nós” – sublinha D. José Policarpo. Na sua conferência sobre «Crescer como pessoas para servir como pastores», o Patriarca de Lisboa sublinha que o padre “é chamado a pôr-se totalmente ao serviço da edificação da Igreja, com tudo o que é e tudo o que tem”. Esta radicalidade do serviço “é a mais bela realização da liberdade; é a dimensão em que o sacerdote se humaniza, exercendo o seu ministério, porque viver a vida como um dom, a Deus e aos irmãos, é a mais perfeita realização do ideal humano, num mundo retalhado de egoísmos e busca dos próprios interesses”.

Ao olhar para os padres de hoje, D. José Policarpo realça que muitos deles são “generosos no trabalho, desmultiplicam-se em actividades, como diz o povo, «trabalham que nem mouros», mas permanecem egocêntricos quando reivindicam autonomia de critérios, na gestão dos afectos, no estabelecer de prioridades, na atitude perante os bens materiais”. E acrescenta: “Para se pôr tudo ao serviço, não basta trabalhar muito”.

O adjectivo «pastoral» transformou-se numa “categoria omnipresente no discurso eclesial”. Com a elevação à categoria de disciplina teológica, a Teologia Pastoral nem sempre evitou, “talvez por influência das ciências humanas e mimetismo em relação à «teoria das organizações», uma certa burocracia pastoral”. Na sua prelecção, o Patriarca de Lisboa sublinha que “muitas vezes o «pastor» assemelha-se mais a um “gestor de empresas”, do que ao pastor que conhece as pessoas, com os seus problemas próprios e o seu ritmo de caminhada. E finaliza: “Um pároco escondido atrás de uma grande máquina pastoral, a fazê-la funcionar eficazmente, pode não traduzir o calor amoroso do Bom Pastor”.

Em relação ao celibato, D. José Policarpo defendeu que “é uma expressão profunda e libertadora do amor total ao rebanho que nos foi confiado, e é um dos aspectos em que o ministério sacerdotal é caminho de plenitude humana”.

“A vivência deste dom pode ser o fruto de convergência e reencontro de todos os que, sinceramente, buscam um novo rosto de Igreja, quer os que, movidos pelo entusiasmo conciliar, tenham partido ao encontro do mundo, quer desiludidos com o mundo, tenham partido à procura da Igreja”, concluiu.

Partilhar:
Scroll to Top
Agência ECCLESIA

GRÁTIS
BAIXAR