O alargamento da UE cria um espaço de 450 milhões de habitantes que traz consigo uma grande diversidade de tradições culturais e religiosas, onde a herança católica é fundamental O alargamento da União Europeia, que irá incluir 10 novos Estados membros no próximo dia 1 de Maio, é um momento de transformação da história do nosso continente, criando um espaço de 450 milhões de habitantes e 263 milhões de católicos, mas também a realização de uma esperança da Igreja, em particular de João Paulo II, o qual já tinha dito em várias ocasiões que a Europa não pode respirar sem os seus dois pulmões – o Leste e o Ocidente. O alargamento representa uma abertura a Leste, com oito países provenientes do antigo bloco soviético: Estónia, Letónia, Lituânia, República Checa, Eslováquia, Hungria, Polónia e Eslovénia. Completam o número a Malta e a zona grega do Chipre. Além da inquietação com as adaptações socio-económicas que a entrada na UE implica, as lideranças católicas da nova Europa têm defendido a necessidade de que o Velho Continente se transforme também num espaço de humanidade e de espiritualidade, onde a solidariedade encontre o seu espaço. A última declaração da Comissão das Conferências Episcopais da Comunidade Europeia (COMECE), “A solidariedade é a alma da União Europeia”, deixa bem claro que este é o caminho para a realização do alargamento e deve ter prioridade sobre o objectivo do “desenvolvimento económico”. Os novos Estados membros trazem consigo uma grande diversidade de tradições culturais e religiosas. Prolongam-se desde o Báltico, no Norte, até às ilhas do Mediterrâneo, no Sul, passando pelos povos eslávicos e a Hungria, no centro. A maior parte deles partilharam a experiência do totalitarismo, embora com graus diversos, e este facto conduziu a uma cultura fortemente secularizada em determinados locais, sem que isso obstasse a que a prática religiosa seja muito mais forte em alguns dos novos Estados membros do que na actual UE. Segundo os dados apresentados pela COMECE, a tradição religiosa dominante vária de região para região: o Catolicismo destaca-se na maioria dos países, mas as Igrejas Protestantes são muito importantes na República Checa e na Hungria, enquanto os Ortodoxos têm grande influência nos limites do Norte e do Sul da nova UE. Se a paz tivesse sido acordada no Chipre, teríamos mesmo um pequeno grupo, muito significativo, cuja religião é o Islamismo. A unificação da Europa confirma a pluralidade da nova UE. Nenhum grupo ou Estado está em maioria, pelo que os cristãos também se encontram em minoria nalgumas situações, embora sejam sempre uma presença significativa. Polónia
A terra natal do Papa João Paulo II é um país claramente marcado pelo Catolicismo: da sua população de 38,6 milhões de habitantes, 90,7% professam a fé católica. Isto faz da Polónia um caso único entre as nações do antigo bloco comunista, com o catolicismo a ser uma maioria: os Ortodoxos são 1,4% e os protestantes representam 0,8% da população. A liderança da Igreja local está confiada a 3 cardeais, 120 bispos, mais de 21 mil padres e 6200 religiosos. Este país é, além do mais, um autêntico oásis de vocações sacerdotais na Europa, abarcando quase 25% dos seminaristas e novos padres do Continente. A Organização da Igreja Católica está, de resto, firmemente consolidada, com 45 Dioceses para os 313 mil km2 de território, quase 10 mil paróquias, mil centros pastorais, 500 escolas católicas e universidades. A Polónia surge na UE como um dos países que mais se tem batido pela referência à tradição cristã no Preâmbulo da Constituição Europeia, vincando os seus bispos que “omitir essa referência significaria privar a Europa de um dos elementos vitais da sua identidade histórica”. O compromisso dos fiéis polacos neste momento de alargamento vai ser marcado por um gesto inédito: o primaz da Polónia, cardeal Jozef Glemp, convidou os fiéis a uma jornada de jejum, a pão e água, na manhã de sexta-feira 30 de Abril, como sinal de preparação espiritual. Os bispos da Polónia, terra natal de João Paulo II, pedem aos católicos que aproveitem esta hora de mudança para “aprofundar a dimensão espiritual e viver coerentemente os seus valores religiosos”. O documento com que a conferência episcopal assinala a entrada na UE apresente motivos de preocupação pelo futuro do país, mormente no que diz respeito ao esquecimento das “ricas tradições religiosas nacionais”. Tendo em conta a secularização que se vai estendendo por todo o continente, os bispos chamam os polacos à coerência entre os valores religiosos e a sua aplicação nos diferentes âmbitos da vida quotidiana: família, trabalho, cultura, ciência, economia e política. Eslovénia
A mais pequena das repúblicas da ex-Jugoslávia, com 20 mil km2, é um dos países mais euro-optimistas que se juntam à UE neste sábado. No referendo de Março de 2003, 88% dos votantes disse “sim” à entrada na União. D. Franc Rodé , presidente da Conferência Episcopal local, destaca que uma das vantagens mais claras para o seu país, bem como para todos os que vêm do bloco comunista, é a “consolidação de uma democracia que nos nossos países é claudicante, com muitos desequilíbrios”. Por ocasião do alargamento da UE, os bispos da Eslovénia também publicaram uma nota, lida em todas as igrejas do país, onde asseguram que os valores fundamentais da Europa são compartilhados pela Eslovénia, e que as suas raízes cristãs “são a garantia mais segura de unidade”. A Igreja eslovena está convencida de que “não é possível imaginar uma Europa sem o cristianismo. Europa sem o cristianismo deixaria de ser Europa”. 70% dos dois milhões de eslovenos são católicos. Todas as paróquias e dioceses têm previstas celebrações litúrgicas e culturais para assinalar o dia 1 de Maio como grande momento na história do país, independente . A personalidade “eslava” desta Igreja, como a de várias outras, dá uma dimensão mais “oriental” à nova UE. “Junto a nós, na União Europeia, entram alguns outros povos eslavos. Assim, a Europa começará a respirar com os seus dois pulmões, Ocidente e Oriente, segundo o desejo de João Paulo II”, explicam os bispos na sua carta. Estónia
A Estónia é um dos novos países da UE em que o Catolicismo está em clara minoria, dado que conta apenas com 5 mil católicos, menos de 1% da população. O país conta com 1 milhão e 400 mil habitantes, concentrados sobretudo em Tallin e Tartu. O território de 45 mil km2 conta apenas com 7 paróquias e a responsabilidade pastoral está confiada ao Núncio dos países bálticos, Peter Zurbriggen, 13 sacerdotes e 25 religiosos. A Igreja Luterana é a primeira confissão no país, com 180 mil fiéis, onde há mais 10 denominações cristãs importantes. Grande parte da população declara-se ateia, fruto dos 51 anos de ocupação soviética, mas as Igrejas cristãs têm vindo a recuperar fiéis. Por tudo isto, mais do que falar em Igreja, faz todo o sentido falar em Igrejas da Estónia, todas elas muito preocupadas com a “compreensão liberal da Europa Ocidental no âmbito da moral”, que no país é bastante mais conservadora. Ainda assim, os habitantes locais parecem muito satisfeitos por desenharem um futuro menos marcado pela influência russa. A entrada na UE marcou, também, a revisão de algumas leis no âmbito dos direitos humanos, no que diz respeito a possíveis discriminações entre os cidadãos e à abolição da pena de morte. Este país foi convidado por João Paulo II a apoiar os esforços do Vaticano para que o Tratado Constitucional da UE “reconheça o papel do cristianismo no coração da vida e do futuro deste continente”. Letónia
Este país báltico é mais uma das pequenas repúblicas que agora se junta à UE. A população é de 2,6 milhões de habitantes, dos quais 15% de declaram católicos, 16% luteranos e 18% Ortodoxos. O resto da população declara-se ateia. Ao contrário do que acontece na Estónia, neste país existem 4 Dioceses, confiadas a outros tantos Bispos, 150 sacerdotes e 100 religiosos. Os 64 mil km2 do território são cobertos por 280 paróquias. A Letónia é marcada por fortes tensões sociais, com muitas pessoas a viverem na pobreza e no desemprego. A entrada na UE aparece assim como uma esperança para as novas gerações. Um pouco à imagem do que acontece em todos os novos membros da União, permanece, contudo, o medo do “Euro-choque”, o aumento de preços que se viveu nos outros países da UE no momento da passagem da moeda nacional ao Euro. Lituânia
Das três repúblicas bálticas que entram na UE, a Lituânia é a única em que a Igreja Católica está em maioria: 72% dos 3,7 milhões de habitantes são católicos, 3% protestantes e 2,8% ortodoxos. Sensivelmente com o mesmo território da Letónia (65 mil km2 contra 64 mil km2), a Lituânia tem o dobro das Dioceses, oito. 14 Bispos, 670 padres e 104 religiosas trabalham nas 676 paróquias do país. Os lituanos são muito optimistas em relação à entrada na UE, antecipada pela adesão à Nato, o que representa um “regresso” à Europa. O caminho, contudo, ainda não está concluído, dado que só em 2007 terá lugar o alargamento do Tratado de Schengen, colocando um ponto final nas restrições à livre circulação dos seus cidadãos. República Checa
A expectativa é grande neste país em relação ao alargamento da UE, mas entre as incertezas e o medo do futuro surge a convicção do cardeal VLK, arcebispo de Praga, sobre a importância do contributo dos cristãos e da Igreja para a “nova” Europa. A população de 10,3 milhões de habitantes conta com 6 milhões de cristãos, dos quais 4 milhões são católicos. A Igreja estrutura-se nos mais de 79 mil km2 de território à volta de 9 dioceses e 3138 paróquias, confiadas a 16 Bispos, 1335 padres, 595 religiosos e 2246 religiosas. A Igreja Católica no país assume como missão ser um “sinal de esperança nestes tempos de incerteza”, promovendo um modelo alternativo que privilegia a abertura ao outro. Como disse o Cardeal VLK à agência Sir, não serão os políticos a mudar a Europa, “mas o autêntico e concreto testemunho dos cristãos”. Hungria
A entrada da Hungria na UE é oficialmente apoiada pela Igreja local, embora os Bispos não tenham deixado de manifestara alguma desconfiança em relação às possíveis “influências negativas do Ocidente”. País com 10 milhões de habitantes e 79 mil km2 de território, a Hungria conta com 6,3 milhões de católicos e 2,5 milhões de protestantes. As dioceses são 16 e as paróquias 2223. Os seus 16 Bispos, 1946 padres e 557 religiosos testemunharam um passado de polícias secretas e opressão que, ainda hoje, marca a vida dos húngaros. O fim do bloco soviético e as ilusões então criadas chocaram com o difícil processo de aprendizagem da democracia. A Igreja na Hungria, apesar do número de católicos, tem pouca visibilidade na vida pública, estando a procurar novos caminhos e pontos de encontro com os mundos da ciência e da cultura. Eslováquia
A Igreja Católica na Eslováquia tem sido muito activa em relação à integração do país na nova Europa e já em 2002 publicava uma carta pastoral sobre o alargamento da UE e a sua entrada na mesma. A visita de João Paulo II, em Setembro de 2003, serviu para reforçar o entusiasmo com que os católicos do país. O próprio Papa destacou a importância da adesão da Eslováquia à União Europeia, pedindo que “o vosso país contribua para a construção da identidade da nova Europa, com a vossa rica tradição cristã; não se contentem apenas com as vantagens económicas”. No dia 1 de Maio é organizada uma peregrinação nacional a Nitra, onde se encontra o local do início da missão de Cirilo e Metódio, co-padroeiros da Europa, no ano de 863. A Eslováquia tem com 5,4 milhões de habitantes, 82% dos quais são católicos. A Igreja local conta com 8 dioceses, 1480paróquias, 1893 padres e 615 religiosos. Malta
O mais pequenos dos novos Estados membros, com apenas 316km2 e 394 mil habitantes, Malta constitui um dos locais da UE em que a percentagem de católicos é maior, chegando aos 95%. A ilha onde esteve o apóstolo São Paulo tem duas dioceses, 3 bispos, 941 padres, 79 paróquias e mais de 1600 religiosos. Em Janeiro deste ano, o presidente do país foi recebido por João Paulo II, o qual pediu à população maltesa que “construa uma sociedade digna da nobre tradição” de Malta. O Papa vincou que esta é uma nação de “antigas heranças cristãs”, presentes desde a passagem de São Paulo. A Igreja no país considera o alargamento como um passo decisivo para a “reunificação pacífica da Europa”, após séculos de divisão e confrontos. Nesse sentido, os seus membros têm estado comprometidos, ao lado das forças políticas e sociais de Malta, a trabalhar para tirar os máximos benefícios da adesão à UE. Chipre
A ilha de Chipre é, nitidamente, um caso especial dentro dos 10 novos países da União, entrando na UE com uma divisão entre a zona grega e a zona turca. A fronteira entre as duas, a “linha verde” é a mais curiosa das fronteiras da UE, com mais de mil soldados da ONU a vigiarem o local. João Paulo II manifestou publicamente o seu apoio à inclusão de Chipre na UE e mostrou-se confiante de que este país poderá “encontrar-se numa posição vantajosa para tornar a Europa mais consciente de suas próprias raízes cristãs”. O Papa nunca escondeu, contudo, a sua tristeza pelo perpetuar da divisão da ilha de Chipre, que o referendo falhado pela reunificação não conseguiu evitar. A presença da Igreja na ilha é diminuta, dado que 78% da população pertence à Igreja Ortodoxa da Grécia e outros 18% são muçulmanos. No total de 800 mil habitantes, apenas 13 mil são católicos, o que representa uma percentagem de 1, 28%. Por tudo isto, a presença da Igreja no país não tem um grande impacto na sociedade e está mais limitada à celebração litúrgica, dentro das comunidades católicas, de tradição maronita – a única das igrejas católicas orientais, que não tem uma facção separada de Roma. Uma arquieparquia (divisão eclesiástica correspondente à nossa arquidiocese) e 13 paroquias espalham-se pelos 9 mil km2 da ilha, contando apenas com 12 padres e 50 religiosos.