Ondine: um Conto de Esperança e Redenção

Numa vila piscatória da costa irlandesa, Syracuse é um pescador irlandês cuja vida é inteiramente dedicada à faina e à sua filha Annie, confinada a uma cadeira de rodas. Comportando o pesado fardo da culpa por um passado perdido no álcool, Syracuse, a quem os locais chamam, por troça, “Circus”, sofre o dia-a-dia num silêncio apenas quebrado pelos momentos com Annie e as confissões esporádicas ao padre local.

Um dia, porém, as redes que lança trazem-lhe do fundo do mar uma inesperada surpresa: uma bela mulher, segundo Annie, em tudo semelhante a uma “selkie”: figura marinha do folclore gaélico que temporariamente perde pele e escamas para assumir a figura humana, capacidade transformadora operada pela força do amor.

Renitente primeiro, amedrontado depois pela perspectiva de voltar a amar e ser amado, Syracuse deixa-se render ao encanto da bela Ondine e à fé da sua filha Annie, recuperando aos poucos a esperança de ser e tornar feliz quem o rodeia.

Numa reviravolta final, nem tudo será o que parece com esta “selkie” de sonho a poder esconder uma realidade bem mais prosaica. Mas, uma vez vencido o medo, não há realidade pior que a descrença na mudança.

Neil Jordan, realizador irlandês de versatilidade expressa nos seus bem diferentes “Mona Lisa”, “Entrevista com o Vampiro”, “O Fim da Aventura” ou “Breakfast in Pluto”, lança redes à sua fantástica tradição gaélica/céltica e pesca uma ideia que cozinha embebida em modernidade. O resultado é um conto, no mínimo, curioso. Servido por um magnífico trabalho visual, boa fotografia, boa banda sonora, filmagem minimal de uma agreste e pardacenta costa irlandesa, a estrutura e exposição fílmica de um belo argumento sofre algumas escolhas menos consensuais quanto à fluidez narrativa. Algumas deficiências na edição sonora, sobretudo nos temas cantados por Ondine e alguns diálogos excessivamente palavrosos, como os de Annie, reforçariam a credibilidade das personagens, a quem qualquer dos actores dá um bom contributo.

Prós e contra pesados, com mais ou menos mitologia mas plena honestidade, Ondine traz-nos uma importante mensagem redentora das profundezas do mar irlandês.

Margarida Ataíde

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Agência ECCLESIA

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