O Uso Excessivo dos Ecrãs: Desafios e Perspetivas Futuras para os Jovens

Hélder Pires, Diocese de Bragança-Miranda

Vivemos numa era cada vez mais digital, onde os ecrãs – sejam eles smartphones, computadores, tablets ou consolas – se tornaram elementos centrais na vida dos jovens. O seu uso, embora ofereça vantagens significativas em termos de acesso à informação, comunicação e lazer, levanta preocupações crescentes quanto ao bem-estar físico, psicológico e social dos adolescentes e jovens adultos.

As redes sociais, como o Instagram, TikTok, Facebook ou X (antigo Twitter), são ferramentas poderosas de conexão social, mas podem tornar-se fontes de ansiedade e depressão quando usadas de forma excessiva. Jovens que passam mais de três horas por dia nestas plataformas apresentam maior propensão para sintomas depressivos, baixa autoestima e isolamento social (Simion & Dorard, 2020).

A constante procura por validação através de “likes” e comentários leva à construção de uma identidade virtual muitas vezes desconectada da realidade. Esta discrepância alimenta sentimentos de inadequação e insatisfação pessoal. Além disso, fenómenos como o cyberbullying, o assédio e o contacto com conteúdos nocivos, como discurso de ódio ou violência, contribuem para o agravamento do estado emocional dos utilizadores (Adès et al., 2019).

Os videojogos representam uma das atividades mais comuns entre os jovens. Embora tragam benefícios cognitivos, como a melhoria da coordenação e da capacidade de resolução de problemas, podem tornar-se altamente viciantes.

Segundo a OMS, o “distúrbio do jogo” já é reconhecido como uma condição de saúde mental. Elementos como o sistema de recompensas, a competição constante e o sentimento de pertença a grupos ou “clãs” tornam os jogos online, como Fortnite ou League of Legends, altamente envolventes (Griffiths & Pontes, 2014). Estes jogos promovem a experiência de flow, onde o jogador perde a noção do tempo e da realidade, dificultando o controlo do tempo de jogo.

A exposição precoce a ecrãs, incluindo videojogos, em idades inferiores a 3 anos compromete o desenvolvimento motor, cognitivo, social e emocional das crianças (Adès et al., 2019; SPNP, 2024).

As apostas online emergem como uma nova e preocupante forma de dependência digital. O fácil acesso através dos dispositivos móveis expõe os jovens a jogos de azar desde cedo. A promessa de gratificação imediata e ganhos rápidos atrai especialmente os adolescentes, cuja impulsividade natural os torna mais vulneráveis (Patrão & Sampaio, 2016).

Este tipo de comportamento pode resultar em perdas financeiras significativas, problemas emocionais e decisões impulsivas que afetam negativamente o desempenho académico, a vida familiar e a saúde mental.

Os diversos usos dos ecrãs, embora distintos, partilham desafios comuns:

  • Saúde física: postura incorreta, obesidade, perturbações do sono e problemas oculares (Adès et al., 2019);
  • Saúde mental: ansiedade, depressão, irritabilidade e dependência digital (Griffiths & Pontes, 2014);
  • Relações sociais: isolamento, conflitos familiares e dificuldades de comunicação (Patrão et al., s.d.).

Dados do SICAD (2020) revelam que 1 em cada 4 jovens portugueses apresenta problemas associados à utilização da internet, com implicações no rendimento escolar, profissional e socioemocional. Um estudo de 2014 revelou que mais de 70% dos jovens mostravam sinais de dependência da Internet (Patrão, 2016).

O futuro dos jovens numa sociedade hiperconectada dependerá da alfabetização digital, da autorregulação e da parceria entre pais, educadores e instituições de saúde. A parentalidade digital, baseada no exemplo e no acompanhamento consciente, torna-se essencial (Patrão & Sampaio, 2016).

A Sociedade Portuguesa de Neuropediatria (SPNP, 2024) emitiu diretrizes para limitar o tempo de ecrã em função da idade:

  • Até aos 3 anos: evitar ecrãs (exceto videochamadas);
  • 4 a 6 anos: até 30 minutos diários, com supervisão;
  • 7 a 11 anos: até 1 hora por dia;
  • 12 a 15 anos: até 2 horas por dia;
  • 16 a 18 anos: até 3 horas por dia.

É recomendado que as redes sociais apenas sejam utilizadas a partir dos 16 anos, embora legalmente o mínimo seja os 13.

O uso excessivo dos ecrãs é um fenómeno complexo que exige uma resposta integrada da sociedade. A tecnologia não é um inimigo, mas sim uma ferramenta poderosa, desde que usada com moderação e consciência. Cabe aos adultos orientar, educar e ser exemplo para os mais jovens. Apenas através de um equilíbrio entre os benefícios do mundo digital e os princípios do bem-estar humano será possível garantir um futuro saudável para as novas gerações.

Referências

  • Adès, J., Agid, Y., Bach, J.-F., Barthélémy, C., Bégué, P. Berthoz, A., Dubertret, L., Falissard, B., Le Moal, L., Léna, P. & Tisseron, S. (2019). L’enfant, l’adolescent, la famille et les écrans : appel à une vigilance raisonnée sur les technologies numériques. Bulletin de l’Académie Nationale de Médecine, 203(6).
  • Griffiths, M.D. & Pontes, H.M. (2014). Internet Addiction Disorder and Internet Gaming Disorder are Not the Same. Journal of Addict Research Therapy, 5:124.
  • Patrão, I. & Sampaio, D. (2016). Dependências online. O poder das novas tecnologias. Lisboa: Pactor.
  • Patrão, I. (2016). Comportamentos online em jovens portugueses: Estudo da relação entre o bem-estar e o uso da internet. In Atas do 11º Congresso Nacional de Psicologia da Saúde (pp. 347-353). Lisboa: ISPA-Instituto Universitário.
  • Patrão, I., Machado, M., Fernandes, P., & Leal, I. (s.d.). Jovens e internet: Relação com o bem-estar psicológico, isolamento social e funcionamento familiar. In Actas do 13º Colóquio de Psicologia e Educação (pp. 241-249).
  • Proença dos Santos, T. & Sampaio, M. (2024). Recomendações da Sociedade Portuguesa de Neuropediatria para a utilização de ecrãs e tecnologia digital em idade pediátrica. SPNP: Lisboa.
  • SICAD (2019). Jogo, Internet e Outros Comportamentos Aditivos. Serviço de Intervenção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências: Lisboa.
  • Simion, O. & Dorard, G. (2020). L’usage problématique des réseaux sociaux chez les jeunes adultes : quels liens avec l’exposition de soi, l’estime de soi sociale et la personnalité ? Psychologie Française, 65(3).

 

Hélder Pires, Coordenador do Observatório Social da Diocese de Bragança-Miranda

(Os artigos de opinião publicados na secção ‘Opinião’ e ‘Rubricas’ do portal da Agência Ecclesia são da responsabilidade de quem os assina e vinculam apenas os seus autores.)

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