O toque dos sinos pascais

Homilia do arcebispo de Braga na Solenidade da Páscoa

Na aurora da Esperança

O Novo Testamento atesta claramente que a cruz e a sepultura de Jesus Cristo só são luminosamente compreendidas à luz do acontecimento da Páscoa, o assento da fé cristã.

Sem a Páscoa não há Igreja. Por isso, odocumento final do Sínodo da sinodalidade inicia à luz da Páscoa: «Cada novo passo na vida da Igreja é um regresso à fonte, uma experiência renovada do encontro com o Ressuscitado que os discípulos experimentaram no Cenáculo na noite de Páscoa. […] a presença d’Aquele que, ao conceder o Espírito Santo, continua a suscitar no seu Povo uma unidade que é harmonia das diferenças».

O Evangelho narra a esperança feliz: «No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi de manhãzinha, ainda escuro, ao sepulcro e viu a pedra retirada do sepulcro. Correu então e foi ter com Simão Pedro e com o outro discípulo predileto de Jesus» (Jo 20,1-2). Os olhos que podem ver são somente os olhos iluminados do coração (cf. Ef 1, 18).

Na verdade: «Na manhã de Pentecostes, encontramos três discípulos: Maria de Magdala, Simão Pedro, o discípulo que Jesus amava. Cada um deles procura o Senhor à sua maneira, cada um tem o seu papel na aurora da esperança. Maria Madalena é movida por um amor que a leva primeiro ao túmulo. Avisados por ela, Pedro e o Discípulo Amado dirigem-se para o túmulo; o Discípulo Amado corre com a força da juventude, procura com o olhar de quem sente primeiro, mas sabe dar lugar ao mais velho a quem foi confiada a tarefa de guia; Pedro, oprimido por ter negado o Senhor, aguarda o encontro com a misericórdia da qual será ministro na Igreja. Maria permanece no jardim, ouve chamar pelo nome, reconhece o Senhor que a envia para anunciar a sua ressurreição à comunidade dos discípulos. É por isso que a Igreja a reconhece como Apóstola dos Apóstolos. A sua dependência recíproca encarna o coração da sinodalidade» (doc. final 13).

O sepulcro aberto e vazio não é, por si mesmo, argumento da Ressurreição, mas são-no as aparições de Páscoa. As aparições do Ressuscitado desembocam na missão.

A crise da Páscoa suscita a aurora da Esperança! Muitas vezes a palavra crise é vista negativamente, mas a origem grega da palavra crise significa passagem, páscoa, processo, pensar, preferir, decidir.

 

Cantar Aleluia

A cruz florida da Páscoa enche de perfume o compasso missionário da Esperança. Cristo ressuscitou! Aleluia!

O toque dos sinos dominicais tem hoje um novo som. Os sinos soam a futuro. Sim, «Por meio da esperança, Deus nos amamenta, nos nutre, nos fortalece e nos dá consolo nesta vida sofrida. Com esta esperança, cantamos “aleluia”. Vede só a alegria que existe na esperança!» […] «enquanto estamos nesta peregrinação, cantamos o Aleluia como viático que nos alivia; o Aleluia é agora para nós um cântico de viajantes. Avançamos por um caminho cansativo, em direção à pátria tranquila, onde, terminadas todas as nossas ocupações, nada mais nos restará do que o Aleluia. […] cantemos o Aleluia. Aleluia é o cântico novo. O homem novo canta o cântico novo» (Santo Agostinho, sermão 255).

 

O espírito pascal

Uma das tentações da Igreja pascal foi a de se tornar uma associação dos antigos discípulos de Jesus. Por isso, fecharam-se na sala de cima, onde aconteceu o Pentecostes pascal. O Espírito Santo liberta os discípulos deste grande risco e projeta-os para a saída em missão.

O Verbo fez-se carne e a carne fez-se Verbo. Jesus Cristo renova a juventude da Igreja envelhecida.

Um hino da liturgia das Horas canta assim: «Senhor, a vida que nos destes é passagem / até à vossa Páscoa da libertação».

No Jubileu dos 2025 anos da Encarnação, comemoramos os 1700 anos do I Concílio Ecuménico de Niceia, atual cidade de İznik, na Turquia. Este Concílio foi importante para o combate às heresias que negavam a divindade de Jesus, dele surgindo as primeiras formulações do Símbolo da Fé, comummente conhecido por Credo, sendo também aqui que se definiu a data da Páscoa. Felizmente, este ano a data da Páscoa, é a mesma para as Igrejas do Oriente e para as Igrejas do Ocidente, tal como acontecia no séc. IV. Queira Deus que se volte a uma data comum para a celebração da Páscoa em todas as Igrejas Cristãs.

Que o compasso pascal nos confirme peregrinos de esperança no caminho de Páscoa e o “beijar a cruz” nos conceda a paz do coração.

D. José Manuel Cordeiro,

Arcebispo de Braga

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