O silêncio de João Paulo II em Fátima

Fazer uma viagem no tempo e recordar um dos momentos mais intensos que se partilhou com João Paulo II, há precisamente, 25 anos atrás. José António Santos, actual secretário geral da Agência Lusa, estava em 1982 em Fátima, enquanto jornalista do Diário de Notícias a acompanhar a viagem que o Papa fazia ao nosso país. Já em 1982, quatro anos depois do início do seu pontificado, “percebia-se a forma electrizante como comunicava com as pessoas. Havia uma certa magia na relação. Só a sua atitude de estar, de se assumir como se apresentava era profundamente marcante”, recorda. No Santuário de Fátima o jornalista recorda em especial um momento muito significativo. Depois de uma celebração de três horas, no final da cerimónia do 13 de Maio, “a procissão do adeus já tinha terminado, depois de momentos festivos, vivos e alegres”, com a presença de milhares de pessoas. No final das celebrações “o recinto de um momento para o outro fica vazio”, numa passagem de “escassos minutos”. João Paulo II encaminha-se para a Capelinha das Aparições, “e ao contrário do que se poderia esperar, ajoelhou-se e caiu em profunda adoração”. Os Bispos já se haviam retirado para a Casa de Nossa Senhora do Carmo para o almoço. O Santuário estava vazio e em redor da Capelinha encontravam-se “umas escassas centenas de pessoas que perceberam que o Papa estava a rezar” e ali ficaram. Durante uns instantes de cinco ou 10 minutos mas “que pareceram uma eternidade” João Paulo II permaneceu em silêncio. O burburinho, em redor da Capelinha “que muitas vezes se sente, desapareceu e um silêncio profundo tomou conta do local”. Ninguém disse nada a ninguém, mas “todos perceberam que o Papa estava a rezar”, relembra. Quem ali estava associou-se à oração de João Paulo II e rezou com ele. Este testemunho marcou José António Santos porque ocorreu no final de uma oração de três horas. Como é que o Papa, “numa oração onde teve tempo para rezar, para agradecer à Virgem e louvar, depois de acompanhar a manifestação de fé de uma forma que o tinha impressionado, pois estava profundamente emocionado, depois de tudo isto o Papa ainda acha que precisa de meditar e rezar”. Como se transmite um momento como este? “O melhor é fazer silêncio”, adianta. Mas “a surpresa ainda estava para vir”. João Paulo II ficou “absorto em oração” e não se apercebeu que estava rodeado de muitas pessoas. Quando se levantou viu uma “pequena multidão que irrompeu num grande aplauso”. Neste momento “o Papa falando em português, sem papel disse «Muito obrigado por terem rezado com o Papa, mas agora temos que ir embora para almoçar». José António Santos recorda a ligação presente naquele local, “primeiro pelo silêncio e depois em português”. João Paulo II, “deu-me o grande momento de reportagem em Fátima”. Este momento marca profundamente a devoção que, já em 1982, João Paulo II tinha por Fátima. “Apenas recordo outro gesto equivalente no Papa”, afirma, recordando em 2000, nova viagem que João Paulo II fez a Portugal para a beatificação dos pastorinhos de Fátima. Na véspera da beatificação o Papa recolhe-se em oração junto da Capelinha das Aparições e “entrega à imagem de Nossa Senhora, o anel que o Cardeal Wyzynski lhe ofereceu. Estes dois momentos são para mim muito marcantes”. “São gestos visíveis do Papa elucidativos quanto à devoção e relação com Nossa Senhora de Fátima, o primeiro marcado pela oração, testemunho do silêncio e do profundo recolhimento, o segundo marcado pelo recolhimento também mas selado pela entrega do anel”. Estes exemplos são marcantes para “crentes que não ficam indiferentes a estes gestos. Mas também para não crentes, que até por uma razão cultural não ficam indiferentes”.

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