O paradoxo do sofrimento à luz do testemunho do Papa Francisco

António Luciano dos Santos Costa, Bispo de Viseu

Foto: Agência ECCLESIA/PR

Ao longo destes dias, os cristãos e todas as pessoas de boa vontade voltam o seu olhar, o seu pensamento e as suas orações em direção ao Hospital Gemelli, em Roma, onde se encontra internado, desde alguns dias, o Papa Francisco, com um prognóstico reservado devido a uma pneumonia dupla, como relatam os médicos através do Gabinete de Imprensa do Vaticano.

Os cristãos rezam pelas melhoras do Papa, junto ao Hospital onde está internado, no Vaticano, e em todo o mundo.

No dia em que foi eleito, como sucessor do Príncipe dos Apóstolos e Bispo de Roma, Francisco pediu aos fiéis que estavam reunidos na Praça de São Pedro para que rezassem por ele. O Papa pede sempre aos fiéis para rezarem por ele.

Nós rezamos pelo Papa Francisco que nos ensinou a rezar por ele e pela humanidade. Agora que ele se encontra numa situação de maior fragilidade e sofrimento, somos nós como Igreja a pedir pelas suas melhoras, numa atitude de gratidão e conforto espiritual.

A pedido da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), estamos a pedir a Deus o conforto, a consolação e a saúde, através da seguinte prece: “Pelo Papa Francisco, sucessor de Pedro, para que o mistério da cruz o fortaleça, o alivie, o reanime e lhe dê esperança. Oremos”.

A comunhão com o sucessor de Pedro pode fazer-se de muitos modos…

A conversão dos fiéis e a renovação da própria Igreja acontece a maior parte das vezes pela via privilegiada do sofrimento e da doença, que nos surpreende na vida. É nesta provação que se insere o paradoxo do sofrimento!

Na vida quotidiana de um doente encontra-se sentido e confiança no mistério da cruz e na vida do crucificado. Jesus Cristo aceitou o sofrimento e fez-se obediente ao Pai até à morte na Cruz, por isso Deus o Exaltou e o Ressuscitou ao terceiro dia.

Parece que tudo devia ser diferente…Mas na verdade Deus ofereceu o seu Filho à humanidade para nos reunir, remir e salvar pelo caminho da cruz e pela via do sofrimento. Por isso, a doença parece não fazer parte daquilo que é a razão da nossa existência humana. Mas os desígnios de Deus confundem-nos, porque Ele é o Senhor da vida.

O Evangelho lembra como é estreito o caminho e a porta que nos conduz a Deus e ao mistério da salvação.

A porta estreita significa um caminho de reconfiguração com Jesus Cristo, que sendo rico se fez pobre para nos enriquecer com a sua pobreza. Também este é um paradoxo da vida cristã, que assenta na aceitação do mistério da graça e no seguimento de Cristo pela via do sofrimento e da cruz na obediência à sua santíssima vontade.

Não há vida cristã nem humana sem envolvimento no sofrimento e no levar a cruz, de cada dia, ao caminhar com o Senhor. Vivemos num mundo em mudança em que, à luz da razão, o sofrimento não teria sentido nem justificação. Mas diante do sofrimento, assumido com fé, faz-se caminho de integração global e acolhe-se o mistério da salvação do género humano, na esperança de saborear a bondade e a beleza de pronunciar o doce nome de Jesus.

As estatísticas nacionais e mundiais mostram que o mundo do sofrimento cresceu exponencialmente na sociedade atual e os doentes aumentaram consideravelmente, fazendo multiplicar as diversas patologias biológicas, as psíquico-somáticas,  as mentais, as morais e as espirituais.

Cientificamente, parece que as razões apresentadas para as respostas no mundo da saúde são plausíveis e eficazes, contudo na prática faltam ainda muitos recursos para ajudar os utentes que carecem de cuidados.

O estilo de vida atual que as pessoas vivem, fruto das exigências civilizacionais levam-nos a fazer algumas reflexões. A persistência da guerra, da fome, as alterações climáticas e químicas que afetam os próprios alimentos, o stress da vida, as consequências do covid-19, as respostas das vacinas, a vida agitada da sociedade, a vulnerabilidade dos povos e nações, o desinvestimento em saúde pública e preventiva, a falta de condições laborais, a poluição, o aumento de ciclos migratórios, a fuga dos refugiados, a produção de armas químicas e nucleares, entre outros fatores, parecem estar a provocar um desequilíbrio biológico fazendo aumentar as doenças, principalmente cardíacas, cancerígenas, respiratórias ou mesmo as chamadas raras e auto-imunes.

Num tempo de tanta tecnologia, com o uso da inteligência artificial, e o desenvolvimento de estruturas políticas, económicas e sociais, onde seria de se esperar a diminuição das doenças, não só aumentou o seu número, como também afetam cada vez mais as faixas etárias jovens.

Diante destes conflitos, guerras, doenças e destruição da Aldeia Global, o que fazer para propor às pessoas melhores estilos de vida saudáveis? Que respostas podem dar os governantes das nações para alterar esta tendência?

Resta-nos esperança nos responsáveis dos povos e nos Organismos Internacionais para que coloquem todas as suas potencialidades ao serviço dos investigadores para descobrirem novos fármacos e vacinas que respondam às necessidades do ser humano, na família, na escola, no trabalho, no lazer e na gestão dos próprios recursos humanos e económicos.

Não podemos desanimar! O caminho é de esperança! Temos que enfrentar as fragilidades, as vulnerabilidades, as doenças e o sofrimento com coragem, confiança e resiliência. Todos juntos, neste Ano Jubilar de Esperança, devemos fazer um caminho que nos ajude a dar sentido à nossa vida e à existência das relações pacíficas entre povos e nações.

 

António Luciano dos Santos Costa, Bispo de Viseu

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