Octávio Carmo, Agência ECCLESIA
O Papa Francisco recentrou o discurso da Igreja Católica (e não só), por força das suas intervenções e gestos com repercussão global, na defesa dos mais excluídos, dos descartados da sociedade, dos refugiados, dos “últimos”.
Não surpreende por isso que, depois de ter começado as suas viagens pela ilha italiana de Lampedusa, Francisco tenha decidido acorrer a Lesbos, uma espécie de Lampedusa do Egeu, como foi definida pelo Vaticano, para ali chamar a atenção do mundo para dois factos fundamentais, coadjuvado pelo patriarca ecuménico de Constantinopla: a tragédia humana que se esconde por trás de cada “número”, quando se fala em refugiados; e a perseguição contra as minorias religiosas, particularmente os cristãos, que as está a empurrar para fora dos seus lares.
Uma das frases mais marcantes do pontificado foi proferida durante a visita do Papa a um cemitério militar na Itália: ‘A mim, que me importa?’. Uma questão para toda a humanidade, uma espécie de teste ao coração de cada um. No fundo, dela depende o crescimento ou não da globalização da indiferença.
P.S. O debate que se seguiu à publicação da exortação apostólica pós-sinodal ‘A Alegria do Amor’ foi exatamente o que se esperava. Mais, exatamente o que o Papa esperava, como se pode ler: “Compreendo aqueles que preferem uma pastoral mais rígida, que não dê lugar a confusão alguma; mas creio sinceramente que Jesus Cristo quer uma Igreja atenta ao bem que o Espírito derrama no meio da fragilidade: uma Mãe que, ao mesmo tempo que expressa claramente a sua doutrina objetiva, ‘não renuncia ao bem possível, ainda que corra o risco de sujar-se com a lama da estrada’” (n.º 308).
Lembro-me que passei no exame de condução depois de ultrapassar um traço contínuo. O Código de Estrada é claro, só que não era possível fazer de outra maneira. Espero que a leitura de um texto tão rico como o do Papa Francisco não se limite a uma discussão sobre “traços contínuos” e se é possível ou não pisá-los ou ultrapassá-los. Seria uma pena.
Foto: (Vinheta de Mauro Biani para ‘Il Manifesto’)
Octávio Carmo