O Papa João Paulo II e a Bioética

Entre muitas extraordinárias iniciativas do Papa que a cristandade acaba de perder deve referir-se a criação, pelo Motu Próprio de 11 de Fevereiro de 1994, da Academia Pontifícia para a Vida. Tendo tido a inesperada honra de ter sido escolhido para Membro desta Academia, desde a sua fundação, e tendo assistido a todas as Assembleias Plenárias anuais posso testemunhar que a ideia de criar esta instituição nesta oportunidade resultou da necessidade que o Papa sentiu de encontrar uma forma de comunicar a riqueza da Evangelium Vitae a todo o povo de Deus, com uma linguagem mais acessível saída de um órgão de predomínio laico, como era a Academia. No Estatuto, a missão que lhe está atribuída é “ estudar, numa perspectiva interdisciplinar, os problemas relacionados com a promoção e defesa da vida e informar, de forma clara, rápida e detalhada, as autoridades da Igreja, as várias instituições de Ciências Biomédicas e as organizações sociais e de saúde sobre os resultados dos seus estudos e de promover uma Cultura de Vida em conformidade com o Magistério da Igreja”. Dito em linguagem mais simples do que se tratava e trata é de fazer ouvir a voz dos cientistas e intelectuais cristãos, ligados aos problemas da vida, em todas as questões que se designam, habitualmente, como questões de ética médica ou de bioética (em sentido limitado). De toda a evidência o Papa não quis que o Vaticano ficasse fora do movimento global da bioética até porque, em alguns sectores, começava a apresentar-se a bioética (em sentido amplo) como uma espécie de religião laica da Natureza viva, pondo de lado a intervenção divina na criação da vida e do mundo. Bastará atentar nos temas que ocuparam as 11 Assembleias plenárias da Academia para entender como é exacto afirmar que ela é, de facto, uma instituição de Bioética. Nela estão 49 representantes de trinta e um Países de todos os Continentes e de formação muito diversa, como académicos e 58 membros correspondentes de mais dezanove países. Pode afirmar-se que, com esta iniciativa do Papa, a Igreja assumiu um lugar significativo na Bioética Global e na Ética em Saúde e conseguiu enriquecê-las com a perspectiva teológica numa postura de diálogo que exclui toda a intransigência no que não é matéria de Fé. A título exemplar indico alguns dos temas que foram já objecto de publicações da Academia : A dignidade da procriação humana (2004 ), Ética da investigação biomédica (2003 ), A dignidade das pessoas em processo de morte (1999 ), Genoma humano, pessoa humana e a sociedade do futuro (1998 ). O tema de 2005 foi :“Qualidade de vida e ética da Saúde” e, pela primeira vez, em onze anos, o Papa não pôde receber em audiência pessoal os Membros da Academia. Em todas as Assembleias anteriores, João Paulo II não se limitou ao discurso de circunstância mas demonstrou sempre o seu interesse e afecto por esta sua criação que é, de facto, uma intervenção forte em todos os domínios da bioética moderna. Um pouco por todo o Mundo, e também em Portugal, têm sido criados, junto das Universidades Católicas, Institutos de Bioética, em consequência do claro interesse de João Paulo II pela bioética. Curvo-me respeitosamente perante a figura deste Papa que o Espírito Santo guiou para “renovar a face da Terra“. E renovou. Daniel Serrão

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