O orçamento para 2012

O Orçamento de Estado para 2012 parece mau demais para ser verdade. O cenário económico que o suporta prefigura a pior recessão desde 1975, com uma queda no produto de 2.8% em 2012 após ter descido 1.9% este ano. O consumo das famílias deve cair uns impressionantes 4.8% no ano que vem, depois de se ter reduzido 3.5% em 2011, enquanto o investimento se encontra em queda livre (-10.6% em 2011 e -9,5% em 2012), tendo-se reduzido sempre desde 2001, excepto em 2007. O desemprego, que há dois anos está acima do seu máximo histórico, continuará a subir até 13.4%, atingindo quase 750 mil pessoas.

Em cima disto temos um rosário de medidas dolorosas. No lado fiscal o Governo, ao contrário de anos anteriores, preferiu não mexer nos valores das taxas dos grandes impostos. Em contrapartida altera uma miríade de escalões, deduções e isenções, multiplicando pequenas subidas de receita fiscal. Os aspectos mais marcantes são a alteração da estrutura das listas do IVA, subindo muitos bens das taxas reduzidas, e o alargamento da base tributável do IRS eliminando deduções.

Do lado da despesa avulta uma grande medida: o corte dos subsídios de férias e de Natal dos funcionários públicos e pensionistas acima de certo nível de receita. Para além disso existem múltiplas reduções na Administração em esforços de racionalização.

Uma estratégia destas não é apresentada ligeiramente nem por engano. Trata-se de um violentíssimo esforço de ajustamento. Será justificado? Todos vivemos por cá nos últimos anos e seguimos a irresponsabilidade e incapacidade que nos trouxeram a esta situação. Fomos o último país a acordar para a necessidade de austeridade perante a crise internacional, após mais de um ano de despesas eleitoralistas em 2009. O resultado foi a maior subida do défice público da nossa história, de 3.5% do PIB em 2008 para 10.1% em 2009. Seguiu-se a repetida inoperância das medidas de ajustamento, simbolizada na sequência dos quatro PECs, que agravaram o défice para 11.4% em 2010, depois ajustado a 9.8% por medidas extraordinárias. Tudo terminou com o pedido de ajuda internacional, por ruptura de acesso ao crédito, em Abril deste ano.

Agora que perdemos a credibilidade externa, para mais no meio de grave crise europeia, a única alternativa à derrocada financeira é a tentativa séria e dura de ajustamento. É preciso mostrar um empenhamento irredutível que convença os credores do nosso compromisso na estabilização orçamental. Este é o ponto decisivo, que o Governo erigiu como prioridade absoluta. O ano de 2011 já tinha um limite definido de 5.9% do PIB para o défice, que não foi cumprido. Ou melhor, será atingido de novo com recurso a expedientes contabilísticos. O resvalar das despesas e receitas do Estado, com sucessivas surpresas desagradáveis bem conhecidas, conduziu o défice este ano a 7.7%. Perante a indispensabilidade de cumprir a imposição lançou-se mão de medidas extraordinárias que permitem atingir formalmente os desejados 5.9%. Mas, na ausência de mais truques no ano que vem, será dos reais 7.7% actuais que temos de descer em 2012 para chegar aos pretendidos 4.5% da meta desse ano.

Não será a cura pior que a doença? Não é este o caminho que a Grécia seguiu e que já se viu que falhou? Dizê-lo é admitir à partida a inevitabilidade da derrocada financeira. Podemos já assumir essa via, o que terá como consequência cortes imeditos ainda mais drásticos, face à perda consequente da ajuda externa, e sobretudo muito mais prolongados, pois demorará décadas até sermos readmiti-dos como país respeitável. A alternativa, em que aposta este Orçamento é que, ao contrário dos gregos, os portugueses consigam fazer os sacrifícios necessários para ainda cumprir os seus compromissos com os credores, mantendo-se como país honesto.

Decisiva é a forma como Portugal enfrentará o triste cenário. Se mergulhar em contestação como os gregos, não haverá solução senão falir. Se suportar os sacrifícios e procurar novas soluções vencerá a crise. Este é o grande desafio desta geração.

João César das Neves

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Agência ECCLESIA

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