O mapa das violações da Liberdade Religiosa em todo o mundo Europa Os governos da Comunidade não aprovaram ainda o esboço de Constituição que tantas críticas provocou devido à ausência de uma referência às raízes cristãs da Europa [o texto foi entretanto aprovado pelos líderes da EU, encontrando-se em processo de ratificação pelos Estados-membros]. Em alguns Países, como a Bulgária, foram promulgadas leis que tornam difícil a acção missionária ao passo que a presença de muçulmanos em França foi alvo de medidas administrativas como a proibição de usar o véu islâmico ou outros símbolos religiosos em lugares públicos, seguindo o exemplo da normativa em vigor na Turquia onde aliás se notam sinais de abertura às comunidades cristãs. Entre os antigos países social-comunistas, a Bielorrússia destaca-se pela legislação repressiva contra as minorias religiosas. ALBÂNIA Após décadas de ateísmo comunista, com a nova Constituição a liberdade religiosa é essencialmente respeitada pelas forças políticas no poder embora permaneça uma secularização generalizada, sequelas do regime marxista. As relações entre as várias comunidades são boas e nenhuma denominação religiosa goza de um estatuto especial. Está ainda por completar o processo de devolução às comunidades religiosas das propriedades confiscadas em 1967 pelo regime comunista de Hoxha. BIELORÚSSIA O regime autoritário do presidente Alyaksandr Lukashenko criou uma série de obstáculos legislativos e burocráticos que tornam a acção religiosa legítima, mas quase impossível de praticar para muitas comunidades religiosas minoritárias. Uma delegação da comissão dos EUA sobre a liberdade religiosa internacional visitou o País, sublinhando que “a liberdade religiosa é muito limitada na Bielorrússia e a nova lei sobre a religião alargou significativamente as ameaças à liberdade de expressão e à prática religiosa”. Entre os principais obstáculos que limitam a liberdade religiosa, destacam-se a recusa do registo oficial, a proibição para as comunidades não registadas de se encontrarem sistematicamente numa habitação, a restrição dos eventos religiosos celebrados em lugar público, a recusa de licenças para construir, comprar e alugar espaços para fins religiosos e as limitações aos direitos dos operadores religiosos estrangeiros. Apesar do cunho ainda profundamente laico dos órgãos do Estado, a Igreja Ortodoxa goza de um estatuto privilegiado em relação aos outros grupos religiosos, até porque os funcionários do Governo a consideram fundamental para atingir os interesses geopolíticos do Governo. A Concordata assinada em 2003 entre o Estado e o Patriarcado Ortodoxo fez aumentar a “ilusão de poder” desta instituição. Actualmente, o acesso aos vários sectores do Estado está vedado às outras religiões. Continua a ser intensa no País a influência ideológica ateia do período soviético. Textos utilizados nas escolas oficiais apresentam afirmações como “são ilusórias e enganadoras as promessas que faz a religião de que nela se encontra tudo aquilo que se procura” e “depois de 1918 nenhuma religião foi vítima de qualquer tipo de opressão”. BULGÁRIA A 22 de Dezembro de 2002 foi aprovada uma lei que reconhece à Igreja Ortodoxa alguns privilégios, e segundo a qual todas as comunidades religiosas – excepto a ortodoxa – têm a obrigação de se registar no Tribunal Municipal de Sofia. A lei suscitou protestos e as primeiras “vítimas” foram os padres salesianos e as freiras Missionárias da Caridade (de Madre Teresa de Calcutá) aos quais foi recusada a autorização de residência. FRANÇA A França foi em 2003 o País que, mais do que qualquer outro, viu a liberdade religiosa no centro das atenções e do debate cultural e doutrinal, por causa da lei contra o uso do “véu islâmico” e dos outros símbolos religiosos nas escolas francesas. Os trabalhos da Comissão presidida por Bernard Stasi, instituída em Julho de 2003, terminou a 28 de Janeiro de 2004, quando o governo Raffarin aprovou o decreto-lei que proíbe o uso “ostensivo” de símbolos religiosos nas escolas francesas, posteriormente aprovado pela Assembleia Nacional. A proibição do uso dos símbolos religiosos nas escolas surge no contexto cultural de defesa da laicidade, princípio constitutivo da República desde 1789 e, em particular, desde a lei de 1905 sobre a separação das religiões e do Estado. A lei foi polémica, mesmo entre as diferentes religiões e, concretamente, dentro da Igreja Católica – cujas posições, no entanto, foram maioritariamente contra, embora acantando o diploma legal, como aconteceu com a maior parte das comunidades islâmicas. ITÁLIA Continua em suspenso o processo de aprovação de uma lei sobre a liberdade religiosa, sobretudo por causa da posição hostil da Lega Nord, um dos partidos do Governo, que teme o reconhecimento das religiões estranhas ao património cultural local e, em particular, está preocupado com o reconhecimento do Islão por parte do Estado. MOLDÁVIA O respeito pelo direito à liberdade religiosa não causa preocupações particulares. As comunidades religiosas não registadas não têm autorização para adquirir terrenos ou construir igrejas ou seminários, mas os seus membros podem celebrar as funções nos seus apartamentos, comprar terrenos e pedir licenças de construção em nome de um membro do grupo. RÚSSIA Verificou-se uma melhoria razoável em relação à liberdade religiosa, sobre cuja situação está em curso um amplo debate que envolve várias esferas, em especial a jurídica e a educativa. A nível local a aplicação das leis relativas à liberdade religiosa regista variações significativas em função da atitude das autoridades locais. A administração presidencial procura usar o instrumento religioso. Vários observadores afirmam que com Putin começaram mudanças sistemáticas na maneira de ver a ortodoxia: independentemente da sua religiosidade pessoal e privada, nota-se uma tentativa de envolver a Igreja nos projectos políticos em grande escala. E no entanto, o Presidente ainda não se quis pronunciar sobre uma série de solicitações prementes feitas pelo Patriarcado: a “cultura ortodoxa” continua a ser matéria facultativa nas escolas; a instituição de capelães ortodoxos no exército ainda não foi abordada; o problema dos bens religiosos em poder dos museus foi resolvido a favor destes, e até a própria devolução de terrenos à Igreja Ortodoxa está a decorrer com grandes dificuldades. Embora não se tenham registado grandes progressos na promoção do diálogo entre a Santa Sé e o Patriarcado de Moscovo, houve pequenos factos que ajudaram a retomar o diálogo há muito tempo cheio de tentativas falhadas de reaproximação. No relatório, são explicadas em detalhe as razões de origem do conflito entre o Patriarcado de Moscovo e os católicos, bem como os principais aspectos da actual situação. Há problemas para várias outras comunidades religiosas analisados em detalhe no relatório. SÉRVIA E MONTENEGRO A Igreja Ortodoxa, que contribui para a definição da identidade nacional sérvia encontra-se numa situação de absoluta predominância sobre os outros cultos. A adopção de nova Constituição imobilizou o processo da lei sobre liberdade religiosa. A objecção de consciência ao serviço militar obrigatório ainda não foi introduzida na legislação, mas há sinais de uma repressão menos dura em relação às Testemunhas de Jeová. KOSOVO Em 2003 a tensão resultante do longo conflito entre a minoria sérvia e a maioria albanesa diminuiu globalmente embora tenha voltado a rebentar em Março de 2004. As vítimas de violência são sobretudo as minorias sérvia e ortodoxa, com vários casos referidos no relatório. Do ponto de vista religioso a liberdade de movimento do clero e dos religiosos ortodoxos (e sérvios) é bastante limitada. Peregrinações, cerimónias religiosas, até as saídas dos mosteiros e das igrejas para fazer compras, têm de ser protegidas pelas tropas da KFOR. Desde 1999, 116 igrejas e lugares de culto e cemitérios ortodoxos foram danificados ou incendiados no Kosovo, mas nunca ninguém foi processado por estes factos. TURQUIA Em 2003, o Governo aprovou uma série de alterações normativas que visam reforçar o respeito dos direitos humanos e das liberdades pessoais, na sequência das exigências feitas pela União Europeia para facilitar a adesão do País à UE. Consequência deste abrandamento da tensão é a autorização formal para a reabertura do seminário greco-ortodoxo de Halki, nas proximidades de Istambul, encerrado desde 1971. Um frade capuchinho italiano, o padre Roberto Ferrari, 60 anos de idade e há 45 anos missionário na Turquia, foi investigado pelas autoridades que chegaram a retirar-lhe o passaporte impedindo-o de regressar ao seu país por ter baptizado um jovem de 26 anos. UCRÂNIA Continua o processo de devolução dos edifícios confiscados aos vários grupos religiosos durante o período de opressão comunista, embora com alguns litígios, enquanto se registam episódios de tensão entre católicos e ortodoxos – cuja origem é referida no capítulo sobre a Rússia. Américas As tentativas de reconciliação entre a guerrilha e o governo, promovidas pela Igreja Católica na Colômbia, não impediram o desencadear de novos actos de violência que atingiram precisamente aqueles que estão empenhados no diálogo e na paz. Em Cuba e na Venezuela a perseguição aos católicos não conheceu tréguas tendo chegado mesmo a ameaçar a liberdade e a vida dos próprios líderes católicos mais expostos. Por sua vez, o processo de pacificação iniciado no México entre o Governo e a Igreja parece não ter ainda chegado a bom porto. Apesar de alguns obstáculos relacionados com uma interpretação laicista da Constituição, os Estados Unidos da América continuam no bom caminho relativamente ao total reconhecimento do papel das comunidades religiosas na vida civil. COLÔMBIA Com quase 3 milhões de desalojados obrigados, por causa das lutas de guerrilha e do narcotráfico, a abandonar os seus lugares de origem, a Colômbia surge em terceiro lugar na lista de desalojados, ultrapassada apenas pelo Sudão e pela República Democrática do Congo, já que os desalojados colombianos representam 10% do total mundial. Em 2003 continuou a impressionante sequência de atentados, de homicídios e de raptos, que atingiram também muitas figuras do mundo religioso – casos referidos em pormenor no relatório. Representou uma luz ao fundo do túnel a instituição em meados de Agosto de uma Comissão encarregada de procurar um acordo entre o Governo e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) para a libertação de todos os reféns. O vice-presidente da Conferência Episcopal, Luís Augusto Castro, membro da Comissão, declarou que esta iniciativa abre as portas a um diálogo mais fácil. O guerrilheiro Raúl Reyes, numa entrevista ao jornal “El Comercio”, de Quito, declarou: “Damos as boas vindas ao representante da Igreja com quem esperamos poder discutir dando-lhe a conhecer o nosso ponto de vista para assim se resolverem os problemas da Colômbia”. Em meados de Dezembro, o Governo e a Igreja chegaram a um acordo sobre a atribuição de mais poderes a esta Comissão. CUBA O arcebispo de Havana, cardeal Jaime Ortega y Alamino, publicou no dia 25 de Fevereiro uma carta pastoral, onde propõe uma análise da situação geral da ilha cinco anos depois da visita de João Paulo II. A carta faz uma análise da profunda decadência do respeito pela vida inocente da ilha, depois da difusão da prática do aborto de forma praticamente livre e sem qualquer restrição: “Havana, além de se ter tornado um espaço de casas de jogo e prostituição, é também o lugar onde as mulheres estrangeiras encontraram condições favoráveis para abortar”. O cardeal afirma que há sistemas de pensamento que “começam por afirmar que a fé religiosa é uma questão privada: é a melhor maneira para fomentar o processo de descristianização; a Igreja é banida da vida pública e de uma forma ou de outra a sua voz é silenciada ou não é ouvida”. E queixa-se da situação de degradação das famílias cubanas e da alarmante situação social, da extrema pobreza que leva tantas pessoas a emigrar. No dia 23 de Março, a Comissão Episcopal Justiça e Paz denunciou a detenção de quase oitenta dissidentes acusados de “conspirar” com os Estados Unidos. A maioria deles era coordenador provincial do projecto-Varela, como sublinhou Oswaldo Payá Sardinas, responsável do Movimento Cristão Libertação. Na semana de 18 para 24 de Agosto, funcionários do regime cubano prenderam os membros de uma organização religiosa que anunciavam dias de oração pelos dissidentes presos; Benito Salas Molína, Amaury Hinojosa Molestá, Edilio Morales Rivas e Zenaida Bárbara Ramos, do movimento “Hijos de la Virgen de Regla”, foram presos depois de terem participado na liturgia. A 11 de Setembro, a polícia política cubana e um grupo de paramilitares impediu violentamente o acesso de um grupo de dissidentes católicos ao santuário mariano de Nossa Senhora de la Caridad del Cobre, padroeira de Cuba. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA Em 2003 várias disposições e medidas administrativas passaram a facilitar as práticas de financiamento de projectos sociais de grupos religiosos. Ao mesmo tempo o Parlamento está a examinar uma lei – proposta pelos senadores Rick Santorum (Republicano da Pennsylvania) e Joseph Liebermann (Democrático do Connecticut) e aprovada pelo Senado a 9 de Abril – que prevê deduções fiscais para quem fizer doações caritativas às organizações religiosas. Michigan, Washington, Nova Iorque, Nova Jersey, Lousiana, Oregon, Alabama, Missouri, South Carolina, Winsconsin e South Dakota são os 11 Estados que até agora recusaram a atribuição de bolsas de estudo a estudantes de teologia. Não teve ainda uma solução legislativa a proposta feita pelos senadores Rick Santorum (republicano da Pennsylavania) e John Kerry (democrata do Massachussetts, candidato às eleições presidenciais de 2004) e que visava a tutela dos direitos dos cidadãos de qualquer grupo confessional que desejem expressar as suas crenças religiosas nos locais de trabalho. O projecto visa garantir a liberdade de usar símbolos característicos duma fé religiosa e autorização para poder frequentar os locais de culto, mas ainda se encontra para análise na Comissão de Saúde, Instrução, Trabalho e Reformas do Senado. Para o Conselho das Relações Americano-Islâmicas, as agressões contra muçulmanos aumentaram em 70% ao longo de 2003. Um documento apresentado à imprensa a 3 de Maio de 2004 aponta 1019 incidentes e casos de violência anti-islâmica, em particular nos Estados do Arizona, de Nova Iorque, da Califórnia e de New Jersey. “Human Rights Without Frontiers” do dia 26 de Fevereiro refere-se ao polémico projecto do FBI de querer efectuar um recenseamento dos muçulmanos americanos e dos seus lugares de culto. Muitos muçulmanos temem que esta iniciativa venha a criar uma ligação implícita entre fé islâmica e terrorismo. HAITI A Igreja Católica está a travar uma intensa batalha contra os ritos vodu, característicos do hibridismo religioso do País. A 11 e 12 de Maio a Igreja Católica e a Igreja Protestante promoveram um encontro com a participação de membros da sociedade civil, pelo fim da crise política. A 15 de Junho, o presidente da Conferência Episcopal do Haiti, Hubert Constant, e o Núncio Apostólico, Luigi Bonazzi, organizaram um encontro entre o presidente Jean-Bertrand Aristide e a oposição. MÉXICO O País vai mudando gradualmente a sua atitude em relação à questão religiosa saindo da condição de laicismo repressivo que caracterizava a sua legislação. Em 2003 o subsecretário dos Assuntos Religiosos registou 17 novas associações. O Governo estabelece uma série de lugares para as reuniões e as conferências de tipo religioso, mas admite a possibilidade de estas terem lugar – mediante comunicação prévia – em espaços que não constam dessa lista. Para poderem visitar o País por motivos religiosos os operadores têm de obter autorização do Governo e – embora o Governo federal estabeleça limites ao número de vistos por cada grupo religioso recebido no País – o processo burocrático realmente é uma simples rotina e a autorização obtém-se com muita facilidade. Entre o dia 1 de Junho de 2001 e o dia 30 de Abril de 2003 o Governo concedeu 7.812 vistos. Além disso o Governo continuou a intensificar iniciativas destinadas a fomentar a compreensão entre as religiões através da coordenação do diálogo inter-religioso. Onze anos após a entrada em vigor da lei sobre as associações religiosas, foi publicado o regulamento que reconhece aos católicos o direito de participar em celebrações religiosas mesmo quando desempenham cargos públicos. Vários partidos denunciaram diversos bispos por “crimes eleitorais” de intromissão nas campanhas políticas – ou seja, por apontarem aos partidos conteúdos programáticos que consideravam anticristãos. Estes episódios lançaram um amplo debate na sociedade mexicana. Um caso que envolve cristãos evangélicos e remonta a 1997 continua sem julgamento. NICARÁGUA Daniel Ortega, ex-secretário da Frente Sandinista de Libertação e antigo presidente da Nicarágua, apresentou publicamente as suas desculpas aos bispos da Nicarágua e a toda a Igreja Católica pelo comportamento do seu governo no princípio dos anos 80. Durante o governo sandinista dezenas de sacerdotes católicos foram expulsos, os bispos foram contestados no exercício do seu magistério e os documentos da Conferência Episcopal nicaraguense e da Santa Sé foram censurados. O pedido de desculpas, de 19 de Julho de 2003, foi feito nestes termos: “Tenho de admitir que cometemos erros e pedimos desculpa à Igreja Católica e aos bispos. Se cometemos erros foi por causa do profundo amor que sentimos pelos pobres, pelos camponeses e por quem não tem nada”. A hierarquia da Igreja reagiu positivamente, dizendo que os bispos sempre insistiram “na necessidade de alcançar na Nicarágua um verdadeiro desenvolvimento humano mediante uma justa convivência democrática dos seus habitantes e governantes em todo o País”. PERU A 14 de Março, o Congresso aprovou o artigo 71 do projecto de reforma da Constituição que define as relações entre o Estado e as Igrejas e reconhece “a Igreja Católica como elemento importante na formação histórica, cultural e moral do Peru, presta-lhe a sua colaboração”, “e respeita todas as confissões religiosas e estabelece acordos de colaboração com estas”. O Conselho Evangélico, apesar de apoiar o projecto, não se mostrou plenamente satisfeito com a versão aprovada. VENEZUELA A atitude do presidente Hugo Chávez, sobretudo em relação à Igreja Católica, provocou a reacção do episcopado. A Conferência Episcopal considerou uma “ameaça” a carta que o Presidente e chefe do Governo, Hugo Chávez, enviou aos bispos a pedir-lhes que deixassem de falar de assuntos relativos à actual crise política do País. Baltazhar Enriques Porras Cardozo, arcebispo de Mérida e presidente da Conferência Episcopal, retorquiu que a Igreja não pode ficar indiferente à realidade do País e que os bispos não vão deixar de trabalhar no sentido de estabelecer contactos com todos os sectores dispostos a colaborar com ela para travar a violação dos direitos humanos, da vida e das pessoas na Venezuela. Em Maio, o arcebispo Porras acusou o Governo de tentar destruir a credibilidade da Igreja Católica inventando escândalos que têm como alvo sacerdotes e bispos. O prelado descreveu ainda toda uma série de assaltos contra igrejas, catedrais, residências de sacerdotes, que à primeira vista parecem servir para espalhar o pânico e não para roubar objectos de valor. Várias vozes da Igreja pediram a realização do referendo sobre o mandato do Presidente, que acabaria por se realizar já em Agosto de 2004. Ásia Enquanto se prepara este relatório, abrem-se novos e inesperados cenários no já complexo panorama do continente asiático onde convivem o islão e o hinduísmo, o cristianismo e o budismo. A Índia é abalada por mudanças institucionais resultantes da vitória eleitoral de uma coligação de tipo laico liderada pelo Partido do Congresso que elegeu um primeiro-ministro sikh, Manmohan Singh, após o interregno de maioria nacionalista hindu. No entanto não há garantias de que estes resultados venham a atenuar as dificuldades dos cristãos, visados pelas leis anticonversão promulgadas por muitos estados indianos. No vizinho Paquistão continuam em vigor normas igualmente repressivas, embora as numerosas absolvições do famigerado crime de “blasfémia” pareçam indiciar uma certa descompressão. A mesma tendência para a tolerância parece afirmar-se no caso da Malásia onde o Partido Islâmico fundamentalista foi recentemente derrotado nas eleições. Por outro lado, no Irão e na Turquia diminuiu significativamente o número de atropelos à liberdade religiosa, embora constitua motivo de preocupação o projecto constitucional sujeito à apreciação da Autoridade Nacional Palestiniana que estabelece o Islão como religião de Estado em detrimento das outras comunidades. Pelo contrário, em vários outros países islâmicos, entre os quais a Arábia Saudita e o Kuwait, conservadores, fundamentalistas e ultra-fundamentalistas travam uma luta de resultado imprevisível. Tudo vai depender da evolução da situação iraquiana e afegã, bem como das repercussões políticas do terrorismo que atinge de modo especial os países de maioria islâmica, confirmando as divisões internas nesta parte do mundo. Na China, a actividade repressiva contra os cristãos e os Falun Gong não conhece tréguas, tal como acontece aliás na Coreia do Norte, dois regimes de terror de onde nos chegam terríveis testemunhos de martírio e perseguição. AFEGANISTÃO Em 2003 foi elaborado o esboço da Constituição aprovada no início de 2004. Com este passo, após 20 anos de guerra, os afegãos demonstraram querer resolver os seus problemas através do diálogo e já não pelas armas. O Estado Islâmico Transitório do Afeganistão foi estabelecido pela Loya Jirga, que reúne os líderes políticos (tribais) do país. A maior parte do país, exceptuando a capital, Kabul, ficou sob o controlo dos “senhores da guerra”. Na parte ocidental do país, a província de Herat é controlada por Ismail Khan e aqui é possível verificar um claro regresso ao estilo de vida característico do período mais sombrio do regime talibã. As mulheres não podem frequentar as universidades com os homens, a cidade é patrulhada pela polícia religiosa e as raparigas são obrigadas a submeter-se a testes de virgindade. A maioria dos não-muçulmanos que fugiram do país na época dos talibãs continua ainda hoje nos campos de refugiados montados nos países vizinhos e esta é uma das possíveis explicações para o facto de existirem escassos relatórios de denúncia de perseguições contra os não-muçulmanos. No fim de 2003 a situação da liberdade religiosa não tinha mudado muito. A Constituição proclama o Islão como “religião sagrada” e “religião de estado” (artigo 2) sem excluir a prática das outras religiões. O artigo 18 estabelece o dever do Estado de instituir e organizar mesquitas, madrassas (escolas corânicas) e centros religiosos islâmicos. Até os partidos políticos, as organizações sociais e as associações que os cidadãos “têm liberdade de criar” ao abrigo do artigo 35, são obrigados a ter “estatutos em conformidade com os princípios do islão”. Estes artigos da Constituição contradizem o disposto pelo artigo 24 da mesma Constituição, segundo o qual o Estado tem o dever de respeitar e proteger a liberdade e a dignidade de todo o ser humano. A situação das mulheres não melhorou: longe de Kabul, nas muitas zonas controladas pelos “senhores da guerra”, regressaram as burqas, a peça de vestuário feminino imposta pelos talibãs, hoje usada mais por medo do que por tradição. Nestas zonas as mulheres não podem trabalhar nem sair de casa, nem desempenhar qualquer papel social que as ponha em contacto com indivíduos do sexo masculino. O artigo 30 da lei sobre a imprensa proíbe a publicação de artigos difamatórios do islão e este texto é frequentemente usado para perseguir os mais moderados, as mulheres e as crianças. Sikh e hindus são as minorias religiosas não-muçulmanas mais significativas. Alguns sikh e hindus tentam regressar às suas casas – onde viveram durante séculos e que tiveram de abandonar por causa do regime talibã – mas o repatriamento é dificultado pela escassez de alojamento e pela falta de escolas que respeitem a sua presença. A perseguição dos hindus – considerados “pagãos e idólatras” – remonta a 1922 quando em Ayodha, na Índia, alguns extremistas incendiaram a mesquita Babri, construída no século XVI. ARÁBIA SAUDITA Em 2003 algo mudou no reino wahabita, tido como o último da classificação no que diz respeito à liberdade religiosa no mundo. Embora incompleta, nota-se uma maior liberdade de reunião para os xiitas concentrados na parte oriental do reino, em particular na cidade de al-Qatif. O mesmo não acontece noutras partes do país, al-Hasa e Dammam, que compreendem vastas comunidades xiitas. Além disso, mantêm-se as restrições relativas à imprensa, à importação do estrangeiro e à distribuição de material religioso xiita, bem como a proibição de emitir programas religiosos xiitas. A 30 de Abril, 450 xiitas (entre os quais 50 religiosos, 42 académicos, 31 escritores e jornalistas, 151 homens de negócios e 24 mulheres) apresentaram uma petição ao herdeiro do trono, o príncipe Abdullah bin Abdul-Aziz, reivindicando várias reformas entre as quais a da liberdade de expressão. Concretamente, “os xiitas aspiram à igualdade aos outros cidadãos” e à possibilidade de poderem aceder aos postos e aos cargos “de que têm sido excluídos, nomeadamente o corpo militar, de segurança e diplomático”; a formação de uma comissão nacional encarregada de apurar os casos de discriminação confessional e de incrementar a sua representação nas instituições estatais (há apenas dois xiitas no Conselho Superior Consultivo formado por 120 membros, nenhum no Conselho de Ministros e nenhum no Conselho Superior dos Ulemá, ndr); pôr fim às detenções, aos interrogatórios, ao impedimento de viajar e a outros vexames a que são submetidos os xiitas; pôr fim à campanha difamatória contra o xiismo que incita ao ultraje contra os seus membros; reformar o programa da educação religiosa que apresenta os outros ritos islâmicos como heréticos; acabar com o monopólio confessional dos meios de comunicação social oficiais bem como dos tribunais ‘sharaíticos’ e dos centros de propagação da fé islâmica”. Embora com menor frequência, continuam a ser frequentes as invocações feitas nas mesquitas contra os cristãos e os judeus. Esta prática envolve mesmo um grande número de destacados imãs entre os quais os da grande mesquita de Meca e do mausoléu do profeta em Medina. O atentado terrorista de Riade, a 12 de Maio, reavivou o debate interno sobre as causas profundas do fenómeno do fundamentalismo e os seus desvios suicidas. Vários órgãos da imprensa dirigiram inúmeras críticas contra as instituições religiosas. O diário “al-Watan”, por exemplo, publicou um editorial em que punha em discussão a escola teológica hanbalita (em que se filia a doutrina oficial wahabita) que, segundo o autor, seria responsável pela propagação das doutrinas extremistas islâmicas; o chefe de redacção do jornal foi imediatamente afastado do cargo. Afirma-se também que um professor universitário foi despedido por ter criticado a política praticada pelo Governo em relação à minoria xiita. Outras críticas apontavam para a polícia religiosa, conhecida pela designação de mutawwa’in, acusada de praticar uma série de abusos contra cidadãos sauditas e estrangeiros por não respeitarem as normas islâmicas sobre o vestuário ou os horários de oração. A Comissão para a Prevenção do Vício – a que a polícia está ligada – anunciou durante o ano um programa de reabilitação da mutawwa’in. Dois egípcios cristãos presos em Riade a 25 de Outubro foram libertados a 13 de Novembro na sequência da intervenção de um príncipe saudita. Sabry Awad Gayed e Eskander Ghirghis Eskander eram acusados de evangelizar os não-cristãos e de terem aberto um local de culto não-islâmico. Mesmo assim, a agência “AsiaNews” refere que a imprensa saudita atribuiu ao príncipe Sultan – que influenciou a libertação – a seguinte declaração: “Nós dizemos aos cristãos: dentro de vossa casa, vocês e as vossas famílias adoram quem quiserem. Mas aqui na Arábia Saudita nunca houve nem haverá uma igreja”. ARMÉNIA Após alguns anos de espera e de debates, em Dezembro o Parlamento aprovou uma proposta de lei sobre o serviço civil alternativo ao serviço militar que passou a lei em Janeiro de 2004 com a assinatura do presidente Robert Kocharyan. Esta lei dá a possibilidade de escolher ou um serviço militar de 24 meses, ou um serviço de âmbito militar – com uma duração de 36 meses e que não prevê o uso de armas – ou um serviço civil com duração de 42 meses. As disposições normativas entrarão em vigor em Julho de 2004. Na expectativa de que a lei entrasse definitivamente em vigor, foram entretanto aplicadas mais condenações àqueles que se recusaram a cumprir o serviço militar por motivos de consciência. As sentenças contrastam com o compromisso assumido pela Arménia perante o Conselho da Europa, isto é, libertar, até 26 de Janeiro de 2004, todos os objectores de consciência presos. Entre Dezembro e Janeiro, foram condenados mais sete testemunhas de Jeová por se terem recusado a cumprir as obrigações militares. AZERBAIJÃO A análise da situação revela a hostilidade do Governo perante a própria ideia de liberdade religiosa, que parece resultar do receio dos funcionários estatais relativamente ao pluralismo. As principais vítimas desta situação – além das comunidades islâmicas sobre as quais o Governo exerce intenso controlo por serem consideradas um perigo potencial – são os grupos religiosos minoritários, sobretudo cristãos evangélicos, Testemunhas de Jeová e Hare Krishna. Em 2003 a situação geral parece ter melhorado e, em relação a 2002, diminuíram os abusos das autoridades contra os grupos religiosos não registados. O primeiro instrumento de controlo por parte do Governo é o registo, necessário às organizações religiosas para poderem adquirir ou alugar propriedades e para poderem ser titulares de contas bancárias. Há casos de censura e apreensão de material religioso, bem como de pressões sobre grupos religiosos – católicos, baptistas, adventistas, protestantes, muçulmanos – relatados em pormenor no Relatório. BANGLADESH Desde 1988 o Islão é oficialmente religião de Estado. Embora a lei proíba qualquer forma de discriminação baseada na religião e os cargos governamentais sejam abertos a pessoas de qualquer confissão, frequentemente os extremistas islâmicos chegam a impedir o acesso dos cristãos aos poços de água pública e destroem os seus riquexós, retirando-lhes assim a sua única fonte de rendimento. As comunidades religiosas podem abrir escolas, mas ninguém pode – em nenhum tipo de escola, nomeadamente religiosa – ser obrigado a frequentar cursos de religião. Os cidadãos podem fazer apostolado, mas os muçulmanos convertidos são frequentemente marginalizados ou sujeitos a violências físicas. Para poderem actuar no País, os missionários necessitam de um visto anual que não é lhes renovado se forem apanhados a praticar proselitismo. As relações entre as várias comunidades religiosas foram durante muito tempo bastante boas, mas nos últimos anos o activismo militante de alguns sectores muçulmanos fundamentalistas está a criar grande tensão. Registaram-se numerosos casos de violência contra minorias religiosas ou étnicas, bem como de activistas de direitos humanos. A situação mais grave é nas zonas rurais do sul onde numerosas áreas foram “limpas etnicamente” com a expulsão dos não-muçulmanos, em particular dos hindus, tradicionais proprietários dessas terras. CHINA O ano de 2003 ficou marcado acima de tudo pela mudança de liderança confirmada na Assembleia Nacional do Povo. O novo grupo do governo é dominado por Hu Jintao (presidente e secretário geral do Partido Comunista Chinês) e por Wen Jiabao, Primeiro Ministro. Houve “contactos e discussões informais” entre expoentes chineses e do Vaticano, depois das duas tentativas falhadas nos últimos quatro anos. Isto no entanto não impediu que Pequim prendesse numerosos sacerdotes e leigos da Igreja clandestina. A aparente melhoria das relações com o Dalai Lama não conseguiu refrear a política de colonização cultural e as detenções de leigos e monges tibetanos. Em 2003 continuaram também os esforços para eliminar o movimento popular Falun Gong, e manteve-se a campanha para erradicar os 14 “cultos malvados”, vistos pelos documentos oficiais como grupos que destroem a ordem social. Um bispo patriótico de Pequim, Michele Fu Tieshan, foi eleito vice-presidente da Assembleia Nacional do Povo. Para alguns católicos da Igreja oficial isso marca o reconhecimento da importância dos católicos na sociedade chinesa, mas Monsenhor Fu é amigo de Jiang Zemin e está sempre pronto a seguir a política religiosa do Partido: condenação internacional da Falun Gong, críticas ao Dalai Lama, “não intromissão” da Santa Sé nos assuntos internos da China – ou seja, nas nomeações dos bispos – e ruptura das relações diplomáticas com Taiwan. Houve medidas restritivas e detenções de bispos, sacerdotes e seminaristas da Igreja não oficial (clandestina – não “subterrânea”, como se lê no Relatório). As detenções acontecem periodicamente, às vezes durante alguns meses. Os meses de detenção são cheios de sessões de doutrina e tentativas de os convencer a inscreverem-se na Associação Patriótica dos Católicos Chineses (APCC). Também há notícia de prisões de padres e seminaristas da Igreja clandestina. A metódica minúcia com que as autoridades detêm sacerdotes e bispos clandestinos tem como correspondente o zelo com que prossegue a fiscalização da Igreja oficial, que se deverá ao facto de, nos últimos anos, pelo menos 85% dos bispos da Igreja oficial se terem reconciliado com a Santa Sé, professando obediência ao Papa. Outro aspecto que preocupa o PCC é a crescente unidade entre Igreja clandestina e Igreja oficial. As comunidades protestantes, que compreendem cerca de 50 milhões de adesões clandestinas, estão entre as mais atingidas porque, mais do que os católicos, não aceitam ser encaixadas nas comunidades oficiais. A maior parte delas, subdivididas em muitíssimas denominações, reúne-se em casas privadas, conhecidas como “igrejas domésticas”. Dão menos nas vistas e por isso são vítimas de uma perseguição mais evidente. Frequentemente os fiéis das comunidades, depois de serem multados, são libertados. Os seus chefes, no entanto, sofrem prisões e penas severas – o Relatório conta vários casos exemplares. Desde 1999, a Falun Gong, movimento vagamente religioso, é fortemente perseguido. De acordo com dados da própria Falun Gong (www.faluninfo.net), só nos últimos três meses do ano registaram-se pelo menos 64 mortos por tortura e abusos registados em 17 províncias, de Heilongjiang a Guangxi, passando por Sichuan e Pequim. De 1999 até hoje a Falun Gong conta pelo menos 884 mortes confirmadas e pelo menos 100 mil prisioneiros. Em Xinjiang – região devastada por um terramoto em Fevereiro de 2003 – continuou a obra de colonização dos han sobre os uiguri, a população originária, de religião islâmica e, por conseguinte, a discriminação destes no mundo do trabalho e da escola. A ambiguidade da política religiosa é visível nomeadamente no que se passou no Tibete em 2003. Por um lado são libertados prisioneiros e abrem-se contactos inesperados com o Governo tibetano no exílio, por outro continua a violência e a condenação à morte de todos aqueles que ousam festejar o aniversário do Dalai Lama ou procuram salvar a cultura tibetana da sua extinção. Pequim limita inclusive o número das vocações monásticas estabelecendo um limite máximo de entradas nos mosteiros e obrigando os noviços a estudar marxismo. A epidemia de Sars e a difícil situação económica de Hong Kong fizeram perder os últimos resíduos de estima deste território em relação à “mãe-pátria”. A isto acresce a viva polémica sobre a lei anti-motim através da qual Pequim visa eliminar do território comunidades da Falun Gong, sindicalistas, dissidentes, mas também a própria Igreja Católica do território. Desde o início de Julho, o “site” internet da diocese de Hong Kong, muito visitado pelos católicos chineses, deixou de estar acessível na China. COREIA DO NORTE A situação dos grupos religiosos está envolvida em mistério porque o País é completamente impenetrável e continua isolado do resto do mundo. As notícias que conseguem passar falam de perseguições brutais e de controlo rigoroso do Governo. As fontes dessas notícias são as dos cristãos e dissidentes políticos que fugiram para o estrangeiro, turistas, funcionários, jornalistas estrangeiros, delegações cristãs, organizações religiosas ou humanitárias, cuja mobilidade é muito restrita e se limita sobretudo à capital Pyongyang e às suas proximidades. A Constituição garante a liberdade religiosa que na realidade não existe porque o Governo persegue e reprime todas as actividades religiosas não autorizadas e obriga-as a registarem-se em organizações controladas pelo Partido. O Governo sempre tentou impedir a presença religiosa, em particular dos budistas e dos cristãos. Quem pertence a grupos religiosos é automaticamente relegado para o último lugar, tem menos oportunidades e privilégios – na instrução e no trabalho por exemplo –, não tem direito a ajudas alimentares e é vítima de perseguições violentas devido à sua fé. Calcula-se que – desde que foi instaurado o regime comunista em 1953 – terão desaparecido cerca de 300 mil cristãos. Já não existem sacerdotes nem freiras, talvez assassinados durante as perseguições. Actualmente há cerca de 100 mil pessoas nos campos de trabalho a passar fome e vítimas de torturas que frequentemente levam à morte. Pelo simples facto de serem crentes, de lerem a Bíblia ou falarem de Deus, os cristãos “subterrâneos” são agredidos, torturados, presos, mortos. Alguns contaram que por vezes estes são usados como cobaias em experiências para guerras biológicas. International Christian Concern (ICC) recolheu testemunhos da brutalidade a que são submetidos os prisioneiros cristãos: uma mulher contou que viu matar pessoas deitando-lhes aço fundido por cima, que frequentemente são deixadas nuas e são tratadas como animais. Notícias da imprensa falam de cerca de 6 mil cristãos detidos na prisão N. 15 no norte do País. Mais minuciosa e perigosa ainda é a repressão dos refugiados norte-coreanos na China – sobretudo se descobertos e extraditados depois de se terem convertido ao cristianismo – e dos activistas cristãos que na fronteira entre a China e a Coreia do Norte os ajudam a fugir do seu país para escapar à fome. Human Rights Without Frontiers denunciou ainda os casos de alguns sul-coreanos detidos na China por actividades humanitárias a favor dos refugiados norte-coreanos. Chun Ki-won é um deles: cristão, nos últimos cinco anos ajudou a sair clandestinamente da China cerca de 320 refugiados norte-coreanos. Em 2002, passou 220 dias numa prisão chinesa por ter sido apanhado pela polícia enquanto conduzia um grupo de 20 norte-coreanos até à fronteira com a Mongólia. FILIPINAS A Constituição garante a liberdade religiosa, o Governo respeita os direitos de culto e os cidadãos são livres de professar o seu próprio credo sem qualquer tipo de restrição e sem interferência do Estado. Contudo a disparidade sócio-económica existente entre a maioria cristã e a minoria muçulmana da população contribuiu para criar uma persistente situação de conflito em algumas províncias do País. Os muçulmanos são maioritariamente sunitas, mas existem também xiitas que vivem principalmente nas províncias de Lano del Sur e em Zamboanga del Sur, Mindanao. O Governo permite o ensino religioso nas escolas públicas as quais, de acordo com a lei, devem assegurar a protecção dos direitos religiosos dos estudantes. As alunas muçulmanas podem cobrir a cabeça com o véu tradicional islâmico, o hijab, e estão dispensadas de usar saias curtas nas aulas de educação física. Desde 2001 existem mesquitas até nas próprias casernas onde há recrutas de religião islâmica. Muitos estudantes da região de Mindanao, habitada sobretudo pela minoria muçulmana, frequentam as escolas católicas e podem não frequentar as aulas de religião cristã. Apesar do cessar-fogo que o Governo assinou em 2001 com a Frente de Libertação Islâmica Moro (MILF), registaram-se actos de violência contra os cristãos na ilha de Mindanao, província de maioria islâmica no sul das Filipinas. Os rebeldes assassinaram 14 cristãos na aldeia de Calauit, diocese de Dipolog, na península de Zamboanga. Persiste a situação de violência generalizada na região de Jolo – que compreende 24 mil católicos para um milhão de habitantes de religião muçulmana –, na ilha de Tawi-Tawi e no arquipélago das Sulu. A comunidade católica de Jolo vive num clima de medo devido à forte presença do grupo de Abu Sayyaf, a “filial filipina” da Al-Qaeda que frequentemente, ao longo dos últimos dois anos, raptou e matou cristãos. O grupo Abu Sayyaf na realidade é composto por delinquentes que recorrem ao terror e ao rapto de cidadãos para se financiarem com os resgates. Muitos líderes religiosos islâmicos distanciaram-se do grupo, considerado da mesma escola ideológica de Osama bin Laden. O corpo sem vida de Dakila Lopez – pastor protestante filipino raptado a 22 de Maio de 2001 por um grupo de guerrilheiros comunistas pertencente ao Novo Exército Popular – foi encontrado no dia 21 de Janeiro pelas Forças de Segurança no monte Williams, no norte do País. O NEP, com mais de mil homens, luta há 32 anos pela criação de um estado marxista nas Filipinas e controla um milhar de aldeias no norte do arquipélago. Estas actividades irregulares justificam o papel desproporcionado do exército na vida pública e as contínuas exigências de aumento das despesas para a defesa em detrimento da saúde, da educação e da agricultura. Militares e polícias corruptos que matam prisioneiros, eliminam sem julgamento verdadeiros ou presumíveis criminosos, estão frequentemente em conluio com os bandos de raptores e contribuem para aumentar o descontentamento popular e empurrar outros jovens para a insurreição de tipo comunista ou de matriz islâmica separatista. O Relatório dá conta pormenorizada de casos de abusos dos militares e discriminações contra os muçulmanos. GEÓRGIA Em 2003 verificou-se uma diminuição da violência dos extremistas ortodoxos contra os outros grupos religiosos. Apesar disso continua a ser precária a situação das confissões minoritárias. Depois de o Patriarcado da Geórgia ter assinado com o Governo uma concordata, o termo “missão” tornou-se sinónimo de “crime” e tanto os católicos como os protestantes vêem os seus próprios direitos violados. A inexistência de uma lei sobre a liberdade religiosa não permite que os grupos religiosos não ortodoxos obtenham o reconhecimento legal e agrava a sua situação porque os expõe a agressões exteriores e limita a sua capacidade de acção. Numa reviravolta inesperada, a 19 de Setembro, as autoridades retiraram a proposta de Concordata que iria permitir à Igreja Católica obter o estatuto legal até agora reconhecido apenas à Igreja Ortodoxa. O acordo – que consistia em 15 pontos e reconhecia à Igreja Católica os mesmos direitos da Igreja Ortodoxa – deveria ter sido assinado a 20 de Setembro. Vários grupos religiosos – baptistas, pentecostais, luteranos, muçulmanos e testemunhas de Jeová – queixaram-se da dificuldade, do custo excessivo ou, em certos casos, da impossibilidade de importar literatura religiosa. Na ausência de uma lei que preveja o reconhecimento estatal, nenhum grupo religioso, excepto a Igreja Ortodoxa, tem direitos legais propriamente ditos. ÍNDIA O País está cada vez mais nas mãos do fundamentalismo hindu, que atropela constantemente os direitos das minorias étnicas e religiosas, lhes nega os direitos constitucionais e ameaça a sua existência. Os valores de tolerância e respeito que permitiram aos sikh do Punjab dar vida a uma religião surgida da fusão entre Hinduísmo e Islão e que animaram a espiritualidade e a vida do Buda e de Mahatma Gandhi, são hoje gravemente violados. Sobretudo os cristãos, mas também os muçulmanos, são vistos pelos extremistas hindus como uma ameaça ao sistema das castas que, apesar de proibido pela lei, sobrevive e prospera. Em 13 dos 26 Estados controlados pelo Bharatiya Janata Party (BJP) e pelos seus aliados verifica-se uma significativa mobilização do extremismo hinduísta. Sobretudo em Madhya Pradesh, Rajasthan, Gujarat, Uttar Pradesh e Tamil Nadu – onde o BJP é condicionado pelos aliados mais extremistas – a tensão religiosa é muito forte e manifesta-se em contínuos ataques e vexames contra as minorias religiosas. Além disso esta tensão começa a alastrar também por territórios onde o BJP está em minoria. Os fundamentalistas hindus do partido ultranacionalista Hindu Rashtriya Swayamsevak Sangh (RSS) obrigaram numerosos cristãos das zonas rurais à volta de Bangalore, no Estado meridional de Karnataka – onde se registou o maior número de confrontos inter-religiosos e onde governa a Congress Alliance – a converterem-se ao hinduísmo. Neste contexto político-social é emblemática a declaração com que Dilip Singh Judev, extremista hindu do BJP e membro do Parlamento do Estado de Chhattisgarh, exprimiu a sua vontade de “reconverter ao hinduísmo, por todos os meios, 300 mil cristãos”. Foram precisamente as reconversões o compromisso primário do grupo extremista Jude’v Tribal Welfare que actua sobretudo nas áreas tribais onde os dalit – os chamados “intocáveis”, a casta inferior da hierarquia castal – estariam inclinados a uma mudança de religião: de acordo com informações da agência “religioscope.com” serão 30 mil os dalit do Gujarat e vários milhares os do Bihar que se terão convertido ao budismo. O BJP e os outros partidos nacionalistas – além de aprovarem leis anticonversão já em cinco dos 12 Estados em que governam – pediram ao Governo Federal que promulgue uma lei nacional que reproduza as já existentes nos Estados de Orissa, Gujarat, Tamil Nadu, Madhya Pradesh e Andhra Pradesh. A lei anticonversão deixa espaço a interpretações arbitrárias. As sanções previstas não são leves: quem desrespeitar as normas pode ser condenado a três anos de prisão e a pagar uma multa de 50 mil rupias (cerca de mil euros). A pena pecuniária duplica e os anos de prisão sobem para cinco se o convertido for um menor, uma mulher ou um dalit. Não são só as leis anticonversão que preocupam a comunidade cristã. Em muitos Estados controlados pelos aliados fundamentalistas do BJP, mas sobretudo nos de Gujarat e Tamil Nadu, sucederam-se recenseamentos levados a cabo pelas secções locais do Criminal Investigation Department (CID) que, segundo os líderes do AICC, se destinam a “caçar” os católicos residentes nas várias regiões. Um dos grupos mais extremistas que apoia e condiciona o BJP é o Shiv Sena que se encontra no poder em Maharashtra e é chefiado por Bal Thackeray, declarado admirador de Hitler. Enquanto prosseguem as tentativas para limitar o ensino nas escolas cristãs quer através do não pagamento dos fundos por parte das autoridades do estado quer por meio de tentativas, por vezes conseguidas, de destruição das estruturas escolares, a violência física contra missionários, freiras e leigos católicos continuou a um ritmo incessante. Esta violência está frequentemente associada a restrições como a que está em vigor em Mysore onde um decreto governamental que proíbe as reuniões religiosas de qualquer tipo é “cientificamente” aplicado apenas contra a comunidade cristã. O Relatório dá conta de diversos episódios de violência contra cristãos – incluindo igrejas incendiadas e freiras violadas. Em 2003 continuou também o mais que secular conflito entre hindus e muçulmanos – cuja origem o Relatório explica em pormenor. Os violentos confrontos religiosos ocorridos por esta razão na Índia – e referidos no Relatório em pormenor – custaram a vida já a muitas pessoas. No Tamil Nadu os seguidores da antiga religião indiana do jainismo viram-se obrigados a assistir à destruição de muitos dos seus ermitérios, substituídos por templos consagrados a Perumal (Vishnu) ou a Adinatheswara (Shiva). Dos livros de história hindu foi completamente apagada a existência do jainismo cujas inscrições rupestres têm três mil anos. INDONÉSIA A Constituição estabelece que “todas as pessoas têm o direito de praticar o culto com base na sua religião ou no próprio credo” e que “a nação se baseia na fé num Deus supremo”. O Governo geralmente respeita a liberdade religiosa – embora impondo restrições às actividades de algumas organizações religiosas e das religiões não registadas – e reconhece oficialmente cinco grandes religiões: islão, catolicismo, protestantismo, budismo, hinduísmo. As outras não estão proibidas, mas aqueles que as praticam acabam por sofrer discriminações e pressões. Embora a maior parte da população seja muçulmana, o Islão não é religião de Estado. Nos últimos 50 anos muitos grupos fundamentalistas tentaram introduzir a lei islâmica, mas depararam com a forte oposição dos indonésios, incluindo os muçulmanos moderados. A liberdade religiosa corre o risco de ficar comprometida após a aprovação, a 11 de Junho, da controversa lei sobre o Sistema de Educação Nacional que substituiu a anterior versão de 1989. A lei suscitou um debate aceso que dividiu a opinião pública: cristãos e muçulmanos moderados (entre os quais Nahdlatul Ulama) contra a lei e muitos muçulmanos a favor. O artigo 13 desta lei estabelece que todas as escolas com 10 ou mais estudantes, públicas ou particulares, assegurem educação religiosa duas horas por semana a todos os inscritos, com base na sua pertença religiosa, contratando professores qualificados de todas as religiões e adoptando as estruturas necessárias à prática do culto. Isto implica, por exemplo, que uma escola católica possua nos seus quadros professores muçulmanos e uma mesquita. Em Janeiro o Governo acusou de traição Abu Bakar Ba’asyir, considerado o líder da Jemaah Islamiah, um grupo militante islâmico suspeito de ter participado nos atentados de Bali a 12 de Outubro de 2002. O chefe religioso, detido em seguida, terá sido também o autor moral dos atentados que, no Natal de 2000, atingiram 38 igrejas e religiosos por todo o arquipélago e provocaram a morte de 19 pessoas. Em Abril começou o julgamento do líder muçulmano, que nega as acusações e a existência da Jemaah Islamiah, para o qual a acusação pediu uma pena de 15 anos de prisão. Rinaldy Damanik, pastor protestante de 45 anos, continua na prisão de Palu. Mediador no processo de reconciliação entre cristãos e muçulmanos em Poso (Sulawesi central), onde tem lugar um conflito que em quatro anos provocou centenas de mortos e feridos além de dezenas de milhares de refugiados, Damanik foi condenado, no dia 16 de Junho, a três anos de prisão. No Aceh, depois da entrada em vigor da lei islâmica no início de 2002, a 3 de Março um decreto presidencial introduziu os tribunais da “sharia”. Abdullah Puteh, governador da província, declarou que o Tribunal implantará a lei islâmica “de forma moderada e gradual”, assegurando que não se pretendem violar os direitos humanos. Nas Molucas, o conflito entre cristãos e muçulmanos já provocou, desde 19 de Janeiro de 1999, mais de três mil mortos e cerca de 700 mil refugiados neste arquipélago de cerca de 100 ilhas. No final de Janeiro de 2004, teve lugar em Londres um encontro que visa impulsionar o processo de reconstrução e reconciliação na região. IRÃO As tensões entre os muçulmanos xiitas tiveram repercussões nas eleições, nas quais foram impedidos de participar numerosos candidatos muçulmanos reformistas que assim partilharam parcialmente a sorte dos “infiéis” – cristãos, judeus, zoroastrianos e baha’i – aos quais a Constituição assegura uma participação política limitada ao voto activo e passivo para os lugares reservados às minorias. Embora a sua situação tenha melhorado nos últimos anos, os baha’i queixam-se da prisão, por motivos religiosos, de quatro fiéis seus, um dos quais foi condenado a prisão perpétua, dois a 15 anos e um a quatro anos de prisão. No mês de Abril foram libertados os últimos cinco judeus presos desde 2000 por conspiração. IRAQUE O regime de Saddam Hussein, frequentemente criticado pelas múltiplas interferências na liberdade religiosa dos cidadãos, foi derrotado a 9 de Abril de 2003 por uma aliança militar chefiada pelos Estados Unidos. O quadro deste País terá pois necessariamente de ser dividido em duas partes relativas aos períodos antes e depois da guerra. Durante os preparativos da guerra, o regime do partido Baas procurou mobilizar as comunidades do País apostando no factor religioso. Da mesquita mãe das batalhas, por exemplo, o xeque al-Haiti fez apelo à “jihad contra os invasores infiéis”, ao passo que mais 13 xeques e ulemas sunitas (entre os quais Kobeissi e Zaidan) convidaram a “não colaborar com os inimigos do Islão” e a considerar a guerra contra os americanos “uma obrigação religiosa de todos os muçulmanos”. Neste contexto era previsível a intolerância em relação à comunidade cristã, frequentemente associada aos inimigos ocidentais. A retórica dos pregadores da sexta-feira nas mesquitas concentra-se na “luta contra os seguidores de Satanás” e os “infiéis”. O pós-Saddam A composição do Conselho de Governo Transitório (25 membros) nomeado a 13 de Julho pelo americano Paul Bremer ilustra a configuração do novo Iraque em que xiitas, sunitas árabes, sunitas curdos, turquemenistaneses e cristãos participam conjuntamente no governo do País. Após a queda do regime assistiu-se a um crescimento inaudito do fenómeno religioso, frequentemente expresso de forma fundamentalista. Não foi em vão que se acenou com o espectro dos confrontos inter-religiosos antes da guerra. Vários exemplos de violência são referidos no Relatório. As tensões rebentaram também no seio das próprias comunidades. A 10 de Abril o líder xiita Abdul-Majid al-Khoei foi linchado pela multidão na cidade santa de Najaf, no sul do País. Khoei era descendente de uma das mais conhecidas famílias xiitas do Iraque, mas não era o único a arrogar-se a liderança da mais importante comunidade religiosa iraquiana. Os seus rivais são o ayatollah Muhammad Baqer al-Hakim, líder do Sciri, e Moqtada al-Sadr, filho de um líder religioso assassinado em 1999 pelo regime de Saddam Hussein. A 29 de Agosto a mesma sorte coube a al-Hakim, morto, com mais 85 fiéis xiitas, num atentado com um carro-bomba na cidade santa de Najaf. Até ao fim do ano as simpatias dos xiitas iraquianos dividiam-se pelos vários ayatollah – sobretudo os residentes em Najaf – que reflectem posições divergentes, desde o papel político dos ayatollah à presença americana, passando pelas relações com o Irão. Entre os líderes tradicionais mais ouvidos conta-se Ali al-Sistani que insiste na passagem imediata de poder para os iraquianos através da organização de eleições legislativas. Um outro é Mohammed Hussein al-Hakim, tio do líder assassinado a 29 de Agosto, que adopta posições conciliadoras em relação às forças da coligação “embora esta não tenha cumprido as suas promessas”. Um terceiro polo é representado pelo jovem líder radical Moqtada al-Sadr acusado de estar por detrás dos ataques periódicos contra os líderes xiitas rivais. A Associação dos Sabei Mandei da Austrália (SMAA) diz que a pequena comunidade mandeísta, que venera a figura de João Baptista (100 mil fiéis em todo o mundo, principalmente no Iraque), está a ser vítima de uma autêntica perseguição. “Mais de 80 adeptos do mandeísmo foram mortos no Iraque desde a queda de Bagdade”, afirma a SMAA em Sydney, onde vivem cerca de 2 mil membros da comunidade. ISRAEL A solução dos dois casos que abalaram as relações entre Israel e o mundo cristão – Mesquita de Nazaré e cerco à Basílica da Natividade de Belém – não resolveu todos os problemas. A nova e menos restritiva política de vistos para o pessoal religioso tarda a concretizar-se. As Igrejas locais receiam que a recusa de vistos possa vir a ameaçar a sobrevivência das instituições cristãs na Terra Santa. As igrejas católicas locais tinham registado, durante o mês de Março, 86 casos de vistos recusados a 36 sacerdotes e a 50 religiosas da Igreja Católica, pertencentes a 13 nacionalidades diferentes. Territórios Administrados pela Autoridade Nacional Palestiniana Um esboço de Constituição do futuro Estado palestiniano antecipa um artigo segundo o qual “o Islão é a religião oficial do Estado”, mas o Estado assegurará a sacralidade dos lugares de culto e respeitará as outras religiões. A indicação de uma religião oficial já tinha provocado o protesto dos chefes religiosos cristãos que representam uma comunidade de 50 mil fiéis em cerca de três milhões de palestinianos da Cisjordânia e de Gaza. Provavelmente a escolha está relacionada com o desejo de obter o apoio dos grupos fundamentalistas, muito activos nestes territórios. As contínuas explosões de violência que abalam os territórios ocupados encontram uma explicação na cultura difundida pelo fundamentalismo islâmico. Entre os manuais escolares, “Cultura Islâmica”, publicado em 2003 pelo Ministério da Educação, aprovado pelo Ministério da Educação jordano (11º ano), diz sem ambiguidades: “Jihad é um termo islâmico que equivale ao termo guerra noutras nações”. Por isso “a Nação islâmica necessita de difundir o espírito da jihad e o amor pelo auto-sacrifício entre os seus filhos através das gerações”. O xeque Ibrahim Madhi, um dos pregadores mais populares, abençoa “quem educar os seus filhos para a jihad e o martírio e quem poupar uma bala para a enfiar na cabeça de um judeu”. MALÁSIA O artigo 11 da Constituição garante a liberdade religiosa, mas frequentemente o Governo impõe restrições às religiões que não sejam a islâmica – religião oficial – e, concretamente, o islamismo sunita, sobretudo controlando rigorosamente a construção de lugares de culto e a instalação de cemitérios não muçulmanos. Em 1998 foi aprovada uma emenda à Constituição mediante um novo artigo sobre as questões religiosas, o 121 (1A), nos termos do qual o tribunal da sharia tem precedência em relação ao tribunal do Estado. Em meados dos anos 90 alguns cristãos convertidos do Islão solicitaram que lhes fosse reconhecida a mudança de fé; o tribunal estatal recusou-se a julgar a questão por esta ser da competência do tribunal islâmico, segundo o qual porém a conversão do Islão é um pecado punível com a pena de morte. De acordo com o National Evangelical Christian Fellowship (NECF) da Malásia, o Governo desencoraja – e na prática proíbe – a divulgação de traduções da Bíblia, de cassetes e em geral de material cristão em língua malaia, sobretudo nos Estados orientais. A Bíblia em língua malaia foi proibida pela primeira vez em 1983 e – graças aos protestos da comunidade cristã – a proibição foi depois alterada acabando por permitir que os cristãos usassem a Bíblia nas igrejas e em habitações privadas. Apesar disso o Governo continuou a sequestrá-las, como aconteceu em 1996 e em 2001. MYANMAR Em 2003 não se registaram progressos relativos à liberdade religiosa e aos direitos humanos. Desde 1948, ano da independência, o País nunca teve paz nem democracia. Desde 1962 é governado por um regime militar comunista filobudista, apoiado pelo Partido para o Programa Socialista Birmanês (BSPP). A Constituição promulgada em 1974 estabelece restrições legislativas e administrativas à liberdade religiosa. Não existe uma religião de Estado, mas o Governo favorece o budismo theravada praticado pela maioria da população. A discriminação das minorias religiosas é realizada através de restrições às actividades de educação, de proselitismo e de construção de lugares de culto e, no sector laboral, aos mais altos níveis do sector público. A repressão e o controlo do Governo atingem frequentemente os monges budistas devido ao seu empenho em prole da democracia e dos direitos humanos. PAQUISTÃO O Paquistão é uma república islâmica e o Islão é a religião de Estado. Nos termos do artigo 41 da Constituição – suspensa após o golpe de 1998 – o Presidente da República tem de ser muçulmano. Embora o artigo 20 da Constituição de 1973 declare que todos os cidadãos têm liberdade de culto, profissão e divulgação e o artigo 36 afirme que o Estado salvaguarda os interesses e os direitos das minorias, a realidade é diferente. Os cristãos, embora não sejam perseguidos, são discriminados. Em 2003 verificaram-se numerosos episódios de intolerância religiosa. Grupos de fundamentalistas islâmicos foram responsáveis por homicídios, ameaças de morte, falsas acusações e ataques organizados contra lugares de culto e casas de fiéis de minorias. Os cristãos e os ahmadi – uma cisão muçulmana não reconhecida como tal – são os dois grupos religiosos mais vulneráveis. São frequentemente vítimas do aparelho judicial e são torturados e presos com o pretexto de terem violado o artigo 295 do Código Penal relativo ao famigerado crime de blasfémia (os outros artigos do Código Penal inerentes a este crime são os artigos 296, 297 e 298) aplicável contra quem vilipendiar o Islão ou insultar Maomé. Nos últimos anos os cristãos solicitaram várias vezes em vão a abolição deste crime mas não se confirmou a promessa do Presidente, o general Pervez Musharraf, de rever esta lei. A última guerra do Golfo radicalizou os sentimentos anti-cristãos dos fundamentalistas islâmicos apesar do intenso trabalho de sensibilização de organizações cristãs – como a Comissão Justiça e Paz da Conferência Episcopal – para dizer “Não à guerra no Iraque”. De facto, por causa da guerra muitos cristãos foram vítimas de represálias contra o “Ocidente cristão”. Os ahmadi (movimento surgido em 1889, como mensagem benévola do islão, não reconhecidos como muçulmanos) são ameaçados de morte, discriminados, os seus lugares de culto encerrados, convertidos ao Islão ortodoxo à força, muitas vezes mortos em circunstâncias misteriosas, os seus túmulos profanados e os mortos desenterrados. TURQUEMENISTÃO Não há sinais de melhoria em relação à liberdade religiosa num País em que vigora um dos mais duros sistemas de controlo e repressão da vida religiosa existentes nas repúblicas da antiga União Soviética. Governado pelo autoritário Presidente vitalício, Saparmurad Niyazovn – que costuma autodenominar-se “Pai dos turquemenistaneses” – o País vive privado de uma quase total liberdade política, social e religiosa. A situação tornou-se mais grave com a entrada em vigor