O fim do encantamento?

Dois anos depois da sua eleição, Bento XVI começa a ser criticado com mais frequência, mas não abdica do rumo traçado nem atraiçoa as suas convicções A eleição do Cardeal Joseph Ratzinger como sucessor de João Paulo II foi recebida, no dia 19 de Abril de 2005, com uma boa dose de cepticismo em vários sectores da Igreja e da sociedade. Os primeiros gestos do pontificado, em continuidade com os caminhos abertos pelo Papa polaco durante mais de 26 anos e meio, vieram descansar alguns espíritos mais inquietos e confirmar, em todos os que admiravam Bento XVI, as capacidades que lhe reconheciam num momento em que a Igreja precisava de uma liderança forte. Apesar disso, dois anos passados sobre a eleição de Joseph Ratzinger, poucos episódios polémicos serviram para que os críticos do Papa saíssem da atitude expectante a que se tinham remetido. Alguns atacam já o “Papa invisível”. Quando aos 80 anos de João Paulo II muitos exigiam a sua renúncia, a Bento XVI exige-se uma viragem no pontificado, promovendo mudanças de fundo. O Papa tem procurado, sobretudo, falar com clareza e de forma sistemática sobre as questões da fé (o Amor, na sua encíclica; Jesus, no seu livro). O actual Papa, de facto, é menos decifrável para o mundo mediático de hoje: para além do carisma ligado ao lugar que ocupa, ele destaca-se por oferecer orientação num mundo perdido na “ditadura do relativismo” que tanto condena, apresentando um programa coerente e uma capacidade intelectual acima de qualquer suspeita. Estes ingredientes não bastam, ainda assim, para fazer dele uma figura apetecível. Joseph Ratzinger não foi eleito pelos Cardeais da Igreja Católica para ser líder de audiências ou ganhar pontos em sondagens de popularidade. Mais do que procurar saber se é um “Papa europeu”, um “Papa invisível” ou um “Papa das surpresas”, os observadores começam a perceber que estamos na presença de um líder espiritual, que leva a sério a sua missão nesse âmbito, um mestre da fé. Bento XVI não é, nem pode ser confundido com um líder político, que muitos gostariam de ver visitar outros locais do mundo, mais longe do Vaticano. Por formação e convicção, tem centrado a sua reflexão nas questões que se apresentam ao Cristianismo na Europa, coração histórico da Igreja, numa atitude entendida como “regresso à tradição”, muitas vezes classificada de forma pejorativa. Os alertas que lança contra o esquecimento de Deus na consciência pública têm implicações nas legislações sobre a família e o matrimónio, por exemplo, e isso não garante um aumento dos seus “adeptos” no Velho Continente. O futuro apresenta vários desafios, a começar já na viagem ao Brasil. Regularizar relações com Moscovo e Pequim ou confirmar-se na liderança do diálogo ecuménico são alguns dos testes mais imediatos, que exigem toda a habilidade diplomática do Papa e da sua equipa, renovada ao nível da Secretaria de Estado e das Nunciaturas Apostólicas. É, contudo, o regresso aos origens, ao que é essencial no Cristianismo, que marca, por certo, estes primeiros dois anos de pontificado e não é possível vislumbrar, por enquanto, qualquer motivo que leve a acreditar que o Papa se afastará do rumo traçado até ao momento. Mas, como ele tanto gosta de dizer, ninguém sabe o que Deus lhe reserva. Pontificado em síntese 2005 19 de Abril – O Cardeal Joseph Ratzinger é eleito como o novo Papa da Igreja Católica, assumindo o nome de Bento XVI. 24 de Abril- Missa de inauguração do pontificado. 13 de Maio – Bento XVI anuncia o início imediato do processo de canonização de João Paulo II. 29 de Maio – Primeira viagem do pontificado: Visita Pastoral a Bari para a conclusão do XXIV Congresso Eucarístico Nacional italiano. 24 de Junho – Primeira visita de Estado fora do Vaticano: encontro com o presidente italiano, Carlo Azeglio Ciampi. 28 de Junho – Apresentação do Compêndio do Catecismo da Igreja Católica. 18 a 21 de Agosto – Primeira viagem do Papa fora da Itália. Bento XVI participa nas XX Jornadas Mundiais da Juventude, em Colónia (Alemanha). 29 de Agosto – Bento XVI recebe o bispo Bernard Fellay, sucessor do arcebispo francês Marcel Lefebvre. 24 de Setembro – Bento XVI recebe o teólogo Hans Küng (Tubingen). 2 de Outubro – Início da XI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, com 250 Bispos de todo o mundo. 23 de Outubro – Encerramento do Sínodo dos Bispos e do Ano da Eucaristia convocado por João Paulo II. 15 de Dezembro – Bento XVI recebe no Vaticano o Comité misto de coordenação do Diálogo Católico-Ortodoxo. 2006 1 de Janeiro – XXXIX Dia Mundial da Paz, dedicado ao tema “Na verdade, a paz”. 25 de Janeiro – Bento XVI publica a sua primeira encíclica, “Deus caritas est” (Deus é amor). 24 de Março – 24 – Consistório público para a criação de 15 novos Cardeais. 7 de Abril – Pela segunda vez em poucos meses, o Papa reuniu-se com os chefes de todos os Dicastérios da Cúria Romana. 19 de Abril – Primeiro aniversário de pontificado. 4 milhões de pessoas estiveram com Bento XVI nestes 12 meses. 25 a 28 de Maio – Viagem Apostólica à Polónia, com visita ao campo de concentração de Auschwitz. 3 de Junho – Encontro com 400 mil membros de movimentos eclesiais e novas comunidades, na Vigília do Pentecostes. 22 de Junho – Bento XVI nomeia o Cardeal Tarcisio Bertone como Secretário de Estado do Vaticano. 8 e 9 de Julho – Visita Pastoral a Valência (Espanha), para o encerramento do V Encontro Mundial das Famílias. 9 a 14 de Setembro -Viagem Apostólica à Baviera (Alemanha). 28 a 1 de Dezembro – Viagem Apostólica à Turquia, com visita à Mesquita Azul de Istambul. 2007 1 de Janeiro – XL Dia Mundial da Paz, dedicado ao tema “A pessoa humana, coração da paz”. 13 de Março – Exortação Apostólica pós-sinodal “Sacramentum Caritatis”, sobre a Eucaristia. 14 de Março – Notificação da Congregação para a Doutrina da Fé sobre a obra do teólogo Jon Sobrino. 2 de Abril – Homenagem a João Paulo II, 2 anos depois da sua morte. 13 de Abril – Apresentação do livro “Jesus de Nazaré”, de Joseph Ratzinger. 19 de Abril – Segundo aniversário de pontificado. 3,4 milhões de pessoas estiveram com Bento XVI nos últimos 12 meses. Octávio Carmo – AE

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Agência ECCLESIA

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