Padre Hélder Fonseca, Diocese de Angra
Nos Açores não temos muitas divindades, temos apenas o Divino Espírito Santo «que é Deus», como Lhe rezamos no terço, que é o Espírito do Pai e do Filho. É por Ele que chamamos Pai a Deus. É por Ele que Jesus é gerado e movido e, expirando nos inspira do seu Espírito. É Ele que desce ao seio da Virgem Maria e permite a encarnação do Verbo. No mistério pascal desce sobre os apóstolos e faz deles homens novos, criativos, ousados e corajosos, de quem somos herdeiros.
Mas se é verdade que só temos uma divindade – a Santíssima Trindade que nos é revelada pelo Senhor Jesus Cristo e pelo Senhor Espírito Santo – também é verdade que temos muitas paisagens e molduras, tal como tantos verdes e azuis, que de uma só cor se exprimem em tantas tonalidades. Se na terra se deve à humidade, em nós deve-se à humildade.
Temos a paisagem da graça de Deus na alma de cada um de nós, sobretudo pelo batismo e crisma, pela eucaristia e pelo dom do perdão; a paisagem da casa de cada família, lugar de amor, de oração e de festa, sobretudo quando «arma» o altar e o quarto para o Senhor Espírito Santo. Temos a moldura do império, da irmandade, das esmolas, onde o «teatro» o «triatro» das operações se desenrola; o terreiro ou a praça com os seus carros de bois vermelhos ou os carros de toldo tais despensas e dispensas móveis.
Temos a paisagem da pomba, da bandeira, do mastro e da vara; a moldura do pão, da carne e do vinho, da massa cevada e sovada, da alcatra, do arroz doce e dos con-feitos; a paisagem das longas mesas e dos bancos corridos, em que todos iguais, frente a frente, cabemos e comemos. Temos a moldura dos coretos, dos foguetes e das filarmónicas, do bezerro e do pezinho e dos toiros dos bodos; a paisagem do branco florido da Páscoa na inocência das crianças. Temos sete semanas e domingos que desembocam no quinquagésimo dia que, por isso, se chama de Pentecostes.
Logo a seguir, como já conhecemos o Pai Natal), o Filho (Páscoa) e o Espírito (Pentecostes) estamos habilitados para celebrar o mistério da Santíssima Trindade com outro bodo (isto é de voto – devoto – ou de vontade própria), nas mesmas mediações do único Divino. Temos a moldura das canadas e ruas que, com verduras e colchas, ligam a casa ao império e estes à igreja paroquial.
É na igreja que todos ouvem a mesma Palavra de Deus, tomam dos mesmo pão e vinho, corpo e sangue do Senhor e, fortalecidos pela sagrada comunhão voltam a casa com a cabeça ampliada pela coroa (inteligência espiritual versus artificial) ou sabedoria, o braço prolongado pelo cetro (fortaleza e trabalho), a vara (do poder do serviço) e a bandeira vermelha a dizer que onde está o Espírito de Deus aí está a liberdade, pois já não somos escravos de ninguém nem sequer do pecado nem do seu autor.
O 25 de abril tem meio século, mas a revolução da liberdade, da igualdade e da fraternidade tem meio milénio nos impérios do Espírito Santo da Igreja que vive nos Açores. A não perder!
Padre Hélder Fonseca
Diocese de Angra