Não existe dimensão espiritual sem temporalidade e “não existe temporalidade que não gere graus de espiritualidade” – disse António Matos Ferreira no colóquio «Poder Espiritual/Poder Temporal – As relações Igreja-Estado no tempo da República (1910-2009) que decorre em Lisboa, Faculdade de Letras, nos dias 15 e 16 deste mês. O tempo e o espírito são duas marcas da condição humana. Nelas “confrontam-se as legitimidades” das instituições.
As reformas quinhentistas apontaram para uma “diversificação de soluções”, tanto Calvino como Lutero situam o seu debate no problema da valorização das mediações. “A interpretação dada aos instrumentos requeridos para o exercício do poder” – salienta o historiador na sua conferência subordinada ao tema «As relações Igreja/Estado na I República Portuguesa».
No início do século XX, Portugal assistiu a um debate – na linguagem do Papa Leão XIII – das “esferas do político às esferas do social”. Na sociedade contemporânea, a disputa não está entre o temporal e o espiritual, mas “política e religiosa”. “Há uma disputa no que se pretende que “o Estado seja e, também, no que se pretende que a Igreja seja” – sublinhou António Matos Ferreira. As elites católicas reflectem sobre “o que é a Igreja”. O tradicionalismo político versus liberalismo político debateu-se sobre a natureza do regime.
Há diferentes concepções de separação entre a Igreja e o Estado. “Há situações onde o pároco é protegido pela população e outras onde ele não é protegido pela população” – refere o conferencista. No meio católico existem percepções “distintas do que é ser católico” – acrescentou. Esta separação estava “presente no final da monarquia constitucional” – proferiu o historiador.
Perante estes debates, o episcopado português reagiu em conjunto. “É o aparecimento das pastorais colectivas” – afirma. Durante a 1ª República, a Santa Sé “não se impediu de nomear bispos” mesmo na ausência de relações diplomáticas.