O aborto não é um direito da mulher

São de direito aqueles bens que são devidos à pessoa, com vista à sua realização, dignidade e plenitude… Quando dizemos que o aborto não é um “direito da mulher”, afirmamos, em primeiro lugar, que o aborto voluntário não é um direito, em absoluto. São de direito aqueles bens que são devidos à pessoa, com vista à sua realização, dignidade e plenitude, e cuja provisão o Estado, na esfera jurídica, está obrigado a garantir. Ao contrário, o aborto (legal ou clandestino) é um mal. Porque impõe a destruição do feto ou embrião. E porque tem um efeito devastador na própria mulher e mãe, a quem fere no mais íntimo da sua feminilidade e da sua dignidade pessoal. E por isso, por constituir um mal, o aborto não deve ser encorajado, abonado ou subsidiado e, muito menos, garantido. Por outro lado, o aborto não é um direito da mulher precisamente porque afecta os direitos de terceiros. Note-se, mais uma vez, que o que está em causa não é apenas uma “questão de consciência”. Trata-se afinal do direito à vida, que é o primeiro e fundamental dos direitos, pressuposto necessário da existência de todos os outros e sem o qual perde significado e suporte qualquer princípio de dignidade da pessoa. Isto é, afecta os próprios fundamentos da convivência humana e da comunidade política. Assim, tocamos aqui o princípio da inviolabilidade da vida humana (uterina e, ou pós-uterina). A atribuição à mulher de um poder arbitrário sobre a vida do seu filho nascituro, configura um direito absoluto de disposição sobre um ser humano que é inaceitável. Por isso, o chamado direito ao livre desenvolvimento da personalidade da mulher – por sua “opção” – independentemente de qualquer consideração ou motivo e sem necessidade de invocação de razões, não pode exigir o sacrifício total do bem jurídico da vida do nascituro. A absoluta prevalência da liberdade de opção da mulher grávida corresponderia à desprotecção total da vida do feto, ignorando o valor intrínseco dessa vida humana, cujo estatuto e dignidade seriam remetidos para o de uma “coisa” inteiramente disponível, ao critério de outros, objecto de um direito de propriedade, passível de fruição (se tiver a sorte de ser desejado, oportuno e escorreito) ou de destruição. Ora, quanto mais sabemos sobre a vida intra-uterina, mais percebemos que aquele pequeno ser, velado e protegido pelo seio materno, não é apenas “algo” mas “alguém, tem valor autónomo. Aliás, todas as mulheres que alguma vez conceberam “conhecem” profundamente – com o seu corpo, com a sua inteligência e com o seu coração – essa realidade. E, sejamos justos, a esmagadora maioria das mulheres respeita e guarda abnegadamente os seus filhos não nascidos, a quem se entrega com um enorme heroísmo e generosidade. Isso não dispensa, obviamente, o amparo da lei, que deve sempre proteger o bem jurídico da vida contra quaisquer ameaças, prevenindo a fragilidade humana e o efeito dissolvente de uma cultura de morte e de irresponsabilidade. Todavia, admito perfeitamente que a maioria das mulheres que pratica o aborto o faz em condições dramáticas e sob grande pressão (pressão que, aliás, se tornaria insuportável se o aborto fosse legalizado). Por isso, sou também de opinião que devemos aproveitar os recursos já existentes na nossa lei penal para, sem prejudicar os seus efeitos de prevenção – quer negativa, (o seu valor dissuasor), quer positiva (o seu valor pedagógico) – nem enfraquecer a protecção legal da vida do nascido, evitar condenar ou mesmo julgar as mulheres nessas circunstâncias (em que é razoável uma presunção de culpa diminuta). Trata-se talvez do caminho mais indicado para a reabilitação e reinserção social dessas pessoas e para evitar a reincidência. Alexandra Tété Associação Mulheres em Acção

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