Números da Igreja

Desde última visita Ad limina, dados estatísticos da Igreja Católica em Portugal mostram um cenário de transformação cada vez maior A viagem que os Bispos de Portugal começam hoje a realizar ao Vaticano será a primeira do novo milénio. Dos 49 Bispos em Portugal (21 residenciais, 8 auxiliares e 20 eméritos), marcarão presença no Vaticano 37, sendo de notar a ausência do Bispo de Vila Real, por complicações no seu estado de saúde. Desde 1999, data da última visita Ad limina, muita coisa mudou na vida das várias Diocese do país, na Igreja e no mundo. Desde logo, o Papa que vai receber os Bispos do nosso país é Bento XVI, que será informado da realidade das 21 Dioceses portuguesas. Os relatórios entregues pelos prelados deverão abranger um período ligeiramente superior aos 5 anos requeridos pelo Vaticano, procurando mostrar o rosto da Igreja nestes novos tempos. A frieza dos números ajuda, desde logo, a perceber este clima de mudança: o “guia” da Igreja Católica de Portugal confirma, na sua edição de 2007, a quebra progressiva do número de Baptismos e de ordenações sacerdotais, entre outros. De 2000 a Dezembro de 2005, o número de sacerdotes diocesanos baixou de 3159 para 2934 (menos 225), enquanto que o clero religioso manteve praticamente o mesmo número. A situação de 2005 mostra que por cada dois padres que morrem (nesse ano foram 80), apenas um é ordenado (41 novos sacerdotes). A isto se somam, em média, 5 defecções por ano. Apesar desta quebra no número de padres, a esmagadora maioria das mais de 4 mil paróquias continuam confiadas à administração sacerdotal (99,54%) e apenas 20 paróquias são administradas pastoralmente por diáconos, religiosas e leigos, número aliás que tem vindo a decrescer de forma consistente. Os seminaristas de filosofia e teologia também são menos, segundo os últimos dados disponíveis: de 547, entre diocesanos e religiosos, em 2000 passou-se para 475 em 2005. O número de Baptismo mostra uma redução significativa, mas esse dado deve ser lido à luz da variação do número de nascimentos em cada ano. Em 2000 foram baptizadas mais de 92 mil crianças com menos de 7 anos, e em 2005 esse número ficou-se pelos 79 236. Comparativamente a 2001 (100 256) a quebra é de mais de 20%. Os Baptismos depois dos 7 anos representam, actualmente, cerca de 6% do total e chegou, em 2005, aos 5301 (5938 em 2000). Em Portugal, a percentagem de católicos é agora de 89,9% – 9,35 milhões de católicos para uma população de 10,4 milhões de pessoas. O Recenseamento da Prática Dominical, datado de 2001, mostrava que o número total de praticantes não chegava, contudo, aos 2 milhões de fiéis. O nosso país tinha no final de 2005, segundo os dados da CEP, 50 Bispos, 2934 padres diocesanos, 1050 padres de Institutos Religiosos, 174 diáconos permanentes, 321 religiosos professos e 5890 religiosas professas. Um dado curioso diz respeito aos Bispos titulares das Dioceses: desde o ano 2000, foram 12 as Dioceses (mais de metade) que passaram a contar com um novo Bispo (a que se somam outros quatro Bispos Auxiliares actualmente em Braga, Évora e Lisboa). Apenas três Dioceses têm um Bispo há mais de 10 anos, sendo que o “decano” nesta matéria é D. Maurílio de Gouveia, à frente da Arquidiocese de Évora desde 1981. No quadro temporal em análise ganham ainda relevo a assinatura da Concordata entre Portugal e a Santa Sé, no ano de 2004. O documento consagrava o princípio da “cooperação”, mas tem gerado algumas dificuldades por causa dos atrasos na regulamentação de pontos delicados. Entre as várias alterações promovidas pela Concordata de 2004, destacam-se as que se referem às matérias fiscais e ao reconhecimento da personalidade jurídica da Conferência Episcopal Portuguesa. Outras mudanças foram também introduzidas na nomeação dos Bispos, no estatuto da Universidade Católica Portuguesa e na assistência religiosa que a Igreja Católica presta nas Forças Armadas, nas prisões e nos hospitais. Também deste período data a Lei da Liberdade Religiosa e a criação da Comissão da Liberdade Religiosa, onde a Conferência Episcopal Portuguesa se faz representar por dois elementos. O quadro legal criado não impede, contudo, o crescimento de uma onda secularizante e laicista na sociedade, que tende a remeter a presença da religião para a esfera privada. Um capítulo que não deverá faltar nesta visita, apesar de não directamente relacionado com a Igreja, é o do último referendo ao aborto, onde se assistiu a uma mobilização de leigos que só encontra paralelo nos tempos da Acção Católica. A liberalização do aborto levou a CEP a falar numa “mutação cultural”, expressão que, em larga medida, resumirá perante o Papa o essencial da vida da Igreja e da sociedade do nosso país, nestes últimos anos. Balanço Em entrevista à Agência ECCLESIA, o Secretário da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), D. Carlos Azevedo admite que, apesar da quebra, há “um crescimento de alguns movimentos, sobretudo dos Neo-Catecumenais”em várias dioceses em que “têm uma implantação forte e têm formado muitos cristãos”. O Secretário da CEP diz também que a quebra no número de ordenações ainda não mereceu resposta cabal por parte das dioceses que “não têm tido uma preocupação de lançar uma pastoral vocacional”. “Parece uma questão que aflige apenas verbalmente, porque não há um envolvimento de equipas e um estabelecer de prioridades”, aponta. Confrontado com os números da Igreja em Portugal, o Bispo Auxiliar de Lisboa lembra que “houve uma preocupação imediata com a situação e convidou-se algumas personalidades a ajudar os bispos a reflectir sobre esta temática”. A situação, contudo, é comparada à da época de incêndios: “Toda a gente está preocupada na altura – mas, passada essa fase, espera-se pelo ano seguinte. No ano 2010 ou 2011, quando se fizer outro censo, ficaremos preocupados. Até lá ficaremos descansados”. D. Carlos Azevedo considera, por outro lado, que “as celebrações continuam a ter pouca beleza. Muitas vezes, as homilias são mal preparadas. A música litúrgica não aumenta de qualidade. As propostas de oferta de celebração não são as mais adequadas. Por outro lado, a formação de cristãos com sentido de vida comunitária também é escassa”. Num olhare sobre o futuro, indica que “a Nova Evangelização passa muito pelos sectores da Família e da Juventude”. “Os dez anos de catequese não estão a formar cristãos. Os milhares de crismados feitos todos os anos nas dioceses não são cristãos de corpo inteiro nas comunidades cristãs. Não rejuvenescem as comunidades cristãs. Estas situações obrigam-nos a parar para pensar. É fundamental a vitalidade cristã. Temos que reconsiderar a forma de fazer pastoral”, afirma. O Secretário da CEP defende, ainda, que “os padres devem dedicar-se mais à sua missão específica” de “evangelizar e formar cristãos” e “libertarem-se de tarefas que foram acumulando, como a de gestão de centros sociais ou a administração de bens das paróquias ou dioceses”. Este responsável admite ainda que “há uma grande dificuldade de operacionalidade na Igreja em Portugal. Fazem-se análises objectivas e interessantes, mas não há quem dê corpo às soluções apontadas”. “Se víssemos as conclusões de todas as semanas nacionais teríamos que fazer um exame de consciência. Muitas coisas foram meramente desejadas e não concretizadas”, alerta. Em relação às mudanças nas Dioceses portuguesas, D. Carlos Azevedo lembra que “quando um bispo vai para uma diocese acolhe os dinamismos desse território eclesial, mas também deve construir um projecto com essa diocese”. “Nos últimos tempos, muitas delas realizaram sínodos diocesanos. Os sínodos levam uma diocese a repensar-se, só que as mudanças culturais têm sido muito rápidas e o contexto político e social também tem sido adverso”, indica. Nesta entrevista, o Secretário da CEP admite que “quando se fazem actos relacionados com a religião individual – caso das procissões ou grandes festas – as pessoas aderem. Todavia, isto não significa nada do ponto de vista comunitário porque muitas vezes não passa de uma mera religião natural que tem pouco fundamento cristão e evangélico”. “Perante a leitura dos dados é fundamental «arregaçar as mangas» para formar cristãos”, aponta. Entrevista na íntegra • Catolicismo em mudança apresentado no Vaticano

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